Por Guilherme Boulos*
Independente de quem sair vencedor das
urnas no próximo domingo –ou num segundo turno em 26 de outubro– a vitória já
tem dono. Ou melhor, donos. Os mesmos de sempre.
JBS Friboi, Andrade Gutierrez, Queiroz
Galvão, Bradesco, Odebrecht, OAS, Itaú, Camargo Correia e afins.
Levantamento da revista "Congresso
em Foco" a partir de dados do TSE mostrou que a eleição deste ano é a mais
cara da história do país. A estimativa de gastos das candidaturas em todos os
níveis supera R$71 bilhões.
São tantos zeros que pode até confundir.
O valor corresponde a mais de duas vezes o que foi gasto na Copa do Mundo. Ou a
seis anos de pagamento do Bolsa Família. Ou ainda a mais de 1 milhão de
moradias pelo programa Minha Casa Minha Vida.
E estamos falando apenas da previsão de
gastos oficiais e contabilizados. Não inclui o bom e velho caixa dois, cujo
papel nas campanhas eleitorais brasileiras é de conhecimento até mesmo da
velhinha de Taubaté.
Em nosso sistema político, que consagra
o financiamento privado de campanha, quem financia estes valores bilionários
são as grandes empresas. O destaque cabe sempre às empreiteiras, construtoras e
incorporadoras. O setor da construção sempre foi muito generoso com os partidos
e candidatos.
Na parcial do primeiro mês de campanha
neste ano, dos dez maiores financiadores, cinco são empreiteiras. São também as
maiores financiadoras dos partidos, mesmo fora dos anos eleitorais. De 2010 a
2013 foram transferidos R$374 milhões das empreiteiras ao caixa dos partidos
políticos.
É um investimento com retorno seguro.
Tanto do ponto de vista econômico quanto político. Se o fiel doador, com seu
dízimo, garante o paraíso no céu, o doador de campanhas eleitorais garante o
paraíso na Terra, aqui e agora.
Para medir a rentabilidade do
investimento, o exemplo da JBS Friboi é emblemático. Atualmente é a líder da
lista de doadores, com R$52 milhões investidos só no primeiro mês da campanha.
R$52 milhões parece muito dinheiro. Mas não é nada perto dos R$2,1 bilhões que
a Friboi recebeu de empréstimos do BNDES até 2013, menos ainda perto dos R$8,5
bilhões injetados em papéis da empresa por esse mesmo banco público.
O retorno das grandes empreiteiras
através de contratos com o poder público ou com empresas estatais é também
estrondoso. Neste caso, ainda que no âmbito municipal de São Paulo, vale a pena
consultar o estudo disponível na página
reporterbrasil.org.br/gentrificacao/a-bancada-empreiteira/, que relaciona o
financiamento de campanha das empreiteiras com a execução de obras públicas.
O ganho político das empresas
financiadoras também não fica atrás e perpetua a captura do Estado brasileiro
pelos interesses privados. Financiar candidatos ao Executivo significa acesso e
influência nas decisões de governo. Financiar candidatos ao Legislativo
significa formar bancadas de interesse que facilitarão a aprovação de leis que
estimulem seus negócios e inviabilizarão outras que os atrapalhem.
O tão falado conservadorismo do
Congresso não é tanto de ordem ideológica. Aliás ideologia ou projeto político
é algo que passa longe da maioria dos parlamentares brasileiros. O
conservadorismo expressa mais que tudo a defesa dos interesses de quem sempre
comandou o país e paga as campanhas.
As reformas populares não estão
bloqueadas há décadas na sociedade brasileira por acaso. Alguém acha que a
bancada ruralista permitirá uma reforma agrária? Ou que o lobby dos bancos no
Congresso e nos governos dará sinal verde para a reforma do sistema financeiro?
Ou ainda que o setor imobiliário e as empreiteiras permitirão que os governos
que eles financiaram faça reforma urbana?
O financiamento de campanha eleitoral é
um poderoso instrumento de poder. Quem paga a banda escolhe a música, diz o
velho dito. E assim é. Para não acharem que é papo de comunista, cito o juiz
eleitoral Marlon Reis: "Chegamos ao grau da insustentabilidade. As
eleições são um jogo comprado no Brasil".
Teremos neste ano as eleições mais caras
da história, com investimentos milionários de grupos de interesse de vários
setores da economia. Neste cenário, esperar que o próximo governo, seja Dilma,
Marina ou Aécio, tenha independência para fazer as mudanças em favor da maioria
do povo é de uma ingênua ilusão.
Ilusão produzida sob medida pelo
marketing eleitoral, que por sua vez, é pago com o dinheiro daqueles que
continuarão dando o tom na política brasileira.
Guilherme Boulos, 32, é formado em
filosofia pela USP, professor de psicanálise e membro da coordenação nacional
do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto). Também atua na Frente de
Resistência Urbana e é autor do livro "Por que Ocupamos: uma Introdução à
Luta dos Sem-Teto".
FONTE: Folha de São Paulo
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