segunda-feira, 27 de abril de 2015

Adeus, Inês Etienne Romeu

Inês foi a única sobrevivente da Casa da Morte, um aparelho clandestino de tortura da ditadura que seviciou e executou adversários do regime militar.


Por Maria Inês Nassif




A ex-presa política Inês Etienne Romeu morreu hoje de manhã (segunda-feira, dia 27 de abril de 2015), dormindo. Foi a melhor maneira que a morte encontrou para compensá-la da dor que foi sua vida. Inês viveu 72 anos de idade porque teimou em viver. Foi a única sobrevivente da Casa da Morte, em Petrópolis, um aparelho clandestino de tortura da ditadura que seviciou e executou adversários do regime militar. Saiu de lá graças a denúncias de sua prisão ilegal, que repercutiram internacionalmente.


Sobreviveu porque a família e os advogados a entregaram para a Justiça. A prisão não clandestina, por uma condenação para o resto da vida, a salvou de torturadores clandestinos.

Inês integrava o comando da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), foi delatada por um camponês que tinha o codinome de Primo e presa em 5 de maio de 1971 pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury, na avenida Santo Amaro, em São Paulo, por suposta participação no sequestro do embaixador suíço Giovanni Bucher, uma operação feita pela sua organização meses antes sob o comando de Carlos Lamarca. Foi barbaramente torturada no DOI-CODI paulista, até que “entregou” um “ponto” que não existia, em Cascadura, no Rio, onde encontraria com um companheiro de organização. Levada para lá, dirigiu os torturadores até uma avenida – e lá, livre para se encontrar com o suposto guerrilheiro, atirou-se na frente de um ônibus. E sobreviveu.

Depois de uma passagem pelo Hospital da Vila Militar, pelo hospital Carlos Chagas e, por fim, pelo Hospital Geral do Exército, Inês conheceu o inferno dos infernos. Foi transferida para o lugar de onde nenhum prisioneiro conseguiu sair, a Casa de Petrópolis. Lá, enfrentou novo e intensivo período de torturas que durou até agosto e valeu a ela mais quatro tentativas fracassadas de suicídio. Todavia, quando em julho um Dr. Teixeira, seu torturador, sugeriu que suicidasse para escapar das sevícias, Inês resistiu. Na avenida escolhida pelos algozes, ajoelhou-se abraçada às pernas de um dos agentes e apenas gritou, para chamar a atenção dos transeuntes. Os torturadores a tiraram rapidamente do local e a levaram de novo para a Casa da Morte, onde enfrentaria mais duas semanas de torturas intensas.

Em agosto de 1971, foi jogada na casa de uma irmã pesando apenas 32 quilos, mas com a memória intacta e disposta a denunciar o que sofrera. Lá, fez um primeiro dossiê: lembrava dos codinomes dos torturadores, de presos que foram executados dentro da casa, ouvira em determinado momento que estava em Petrópolis, viu o dono da propriedade ser chamado de Mário e registrou o número do telefone que algum incauto deixou escapar perto dela. Até novembro, enquanto a família e os advogados definiam uma estratégia para mantê-la viva e a salvo dos torturadores, Inês registrou o que sabia – e de memória conseguiu mapear a casa dos horrores por dentro.

Para livrá-la das garras da tortura, os advogados decidiram-se pela prisão oficial de Inês, que foi entregue à Justiça e encaminhada ao Presídio Tavarela Bruce, condenada à prisão perpétua. Foi libertada oito anos depois, pela lei da anistia. Desde então, dedicou sua vida a denunciar a desumanidade das torturas e a esclarecer mortes de presos políticos que passaram pela Casa da Morte enquanto lá esteve.

Graças a Inês, vários torturadores foram identificados. Foi com seu testemunho também que se descobriu o papel que o médico Amílcar Lobo desempenhou na casa dos horrores de Petrópolis: ele era responsável por manter vivos os presos, para que eles fossem submetidos a mais torturas, pelo tempo que os torturadores considerassem necessário para arrancar deles as informações que queriam. Lobo, codinome “Dr. Carneiro”, teve o seu registro de médico posteriormente cassado pelo Conselho Regional de Medicina (CRM).  

Em 2003, aos 61 anos, Inês sofreu uma agressão dentro de sua casa, de um suposto marceneiro, e foi internada com traumatismo cranioencefálico. Foi um longo período de tratamento até que conseguisse novamente falar e andar. A polícia do 77o. Distrito de São Paulo registrou a agressão como “acidente doméstico”. Até hoje o agressor não foi identificado.

Foi-se embora hoje, enfim, a Inês, aquela que sobreviveu ao Fleury, à Casa da Morte, a cinco tentativas de suicídio, o atropelamento por um ônibus e à agressão de um desconhecido. Porque viveu, as famílias de vários desaparecidos puderam reconstituir os últimos momentos de seus entes queridos e chorar, enfim, suas perdas. Porque viveu, o Brasil ficou sabendo dos horrores a que foram submetidas as pessoas presas em aparelhos clandestinos da ditadura, e de como a vida humana valia tão pouco para eles. Porque viveu, lutou. E até o fim. Adeus, Inês Etienne Romeu. Sentiremos sua falta.

FONTE: Carta Maior

“Liberalismo y Socialismo”

Por Adolfo Sánchez Vázquez


Quisiera concentrar mi atención en la ya larga y vieja polémica entre liberalismo y socialismo. Siguiendo la sana distinción entre lo que una ideología dice ser y lo que efectivamente es, subrayemos de entrada que el liberalismo se tiene a sí mismo por la ideología de la libertad. Esta es la idea básica que mueve en sus orígenes a la burguesía revolucionaria del siglo XVIII contra el despotismo, así como a los movimientos de independencia en América Latina y a los liberales que, a lo largo del siglo XIX, persiguen en este continente un proyecto de progreso y modernización, o de desarrollo nacional independiente. Este valor supremo —el de la libertad— lo entiende el liberalismo como libertad del individuo, y lo hace descansar en dos supuestos: el primero es el de la naturaleza egoísta, competitiva y agresiva, común a todos los individuos del género humano. Y el segundo es el de la propiedad privada como condición, marco o institución indispensables para que se dé efectivamente la libertad del individuo. No hay, no puede haber, libertad del individuo sin propiedad privada. No se trata de un principio entre otros, sino del principio básico o piedra angular de la ideología liberal, ya sea en su forma clásica (de Locke a Adam Srnith), ya sea en la forma actual, neoliberal (de un Hayek). De esta asociación entre libertad y propiedad proceden otros rasgos esenciales del liberalismo, como son: 1) la exaltación de la competencia en la batalla por la ganancia y la utilidad; 2) la fetichización del mercado como la esfera propia y necesaria de esa competencia; 3) la reivindicación del trabajo por su aspecto positivo,’ya. que, gracias a él se adquiere e incrementa la propiedad privada; y 4) la exaltación del individuo como un absoluto que exige ser protegido del Estado y las instituciones públicas.

Texto completo: Liberalismo_y_Socialismo


Para download: “El capital Historia y Método -Una introducción-“

de Néstor Kohan


LINK PARA DOWNLOADEl_capital_H_y_Metodo

Indice del volumen
  • Presentación del libro (Texto de contratapa)
  • Prólogo a la edición cubana (en preparación): Melena blanca, bigote negro, traje oscuro
  • Prólogo a la segunda edición argentina: La teoría crítica junto al fuego de la rebelión
  • Prólogo a la primera edición argentina: Un texto maldito y embrujado
  • El marxismo: una teoría crítica, científica e ideológica
  • La teoría marxista de la ideología y la noción de “verdad” científica
  • Teoría de la historia e historia de la teoría
  • El método dialéctico
  • La lógica formal, la lógica trascendental y la génesis histórica del método dialéctico
  • La lógica dialéctica, ese infierno tan temido
  • La lógica dialéctica y la teoría del valor
  • Fetichismo y teoría del valor [I]
  • Fetichismo, alienación y teoría del valor [II]
  • Fetichismo, teoría del valor y relaciones de poder
  • La violencia como potencia económica
  • El espectro del valor y el fantasma de la revolución
  • Breve cronología de la obra de Carlos Marx
  • Guías de lectura (preguntas para trabajar en equipos y grupos de lectura)
  • Bibliografía
  • Biografías sobre Marx y Engels
  • John Holloway: El Capital como grito de dolor, grito de rabia, grito de poder
  • Fernando Martínez Heredia: Interrogar El Capital desde América Latina
  • Enrique Dussel: La ética en El Capital
  • Michael Löwy: Marx, Engels y el romanticismo
  • León Rozitchner: La tragedia del althusserianismo teórico
  • Referencias (de los compañeros invitados a exponer en el Seminario)
  • Entrevista a Orlando Borrego: “Che Guevara lector de El Capital”

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Presentación del libro (Texto de contratapa)

Luego de sufrir años de neoliberalismo y una monarquía absoluta, donde el Mercado y el Capital se habían autoproclamado reyes eternos del género humano, el viento social que mueve las ideas comienza a cambiar de dirección.

¿Dónde quedó Fukuyama y su supuesto “fin de la historia”? ¿Alguien se acuerda hoy del tristemente célebre “no hay alternativa” de Margaret Thatcher? Actualmente, se viven tiempos distintos. De esperanza y de búsqueda. En la política mundial, ha surgido un nuevo protagonista: el movimiento de resistencia global contra el capitalismo. Un movimiento que nace en 1996 en América Latina y se consolida en 1999 con las rebeliones en las metrópolis del mundo capitalista. La rebelión popular del 19 y 20 de diciembre de 2001, que sacudió la Argentina, se inscribe en ese nuevo horizonte.

El debate sobre qué formas futuras asumirá este “movimiento de movimientos” (que reclama “Otro mundo posible”) y qué función jugarán en su seno las ideas del socialismo, es parte de una historia abierta, cuyas mejores páginas todavía no se han escrito. Tratando de incidir e intervenir en ese debate, este volumen recoge las clases del «Seminario de Lectura Crítica y Metodológica de El Capital» coordinado por Néstor Kohan en la Universidad Popular Madres de Plaza de Mayo.

Además de las clases de Kohan, en él se incluyen también las conferencias de invitados internacionales: John Holloway, Fernando Martínez Heredia, Enrique Dussel y Michael Löwy. De muy diversos modos, todos ellos también forman parte del debate que hoy se entabla en América Latina y el mundo.

El volumen apunta a varios públicos. Por eso, para facilitar la lectura, contiene una cronología de la obra de Carlos Marx, numerosas guías de preguntas para grupos colectivos de lectura y bibliografía de consulta. Luego de haber agotado la primera edición, en la segunda se incorporan una nueva introducción de Néstor Kohan sobre la situación que se abre en Argentina a partir del 19 y 20 de diciembre («La teoría crítica junto al fuego de la rebelión»); un trabajo del filósofo argentino León Rozitchner sobre Louis Althusser y una entrevista al economista cubano Orlando Borrego, compañero del Che, en la que recuerda los grupos de estudio sobre El Capital en los que participó Guevara. Este libro abre una nueva discusión sobre El Capital. Un texto «maldito y embrujado», prohibido por los militares latinoamericanos y despreciado por el simulacro de democracia que reemplazó a las dictaduras en todo el continente. Un texto crítico, científico, ideológico y político al mismo tiempo. Un texto que interpela y reclama tomar partido.

Las ideas de Marx, sostiene el autor, resultan imprescindibles para desarrollar la lucha por ese “Otro mundo posible” que hoy se persigue a nivel mundial.


domingo, 26 de abril de 2015

Em busca de outras vidas

Somos os únicos humanos do Universo


Por MARCELO GLEISER


RESUMO Com mais de 1 trilhão de mundos apenas em nossa galáxia, é difícil imaginar que não exista vida fora da Terra. Mas, dado que não existem dois mundos com a mesma história e dado que a diversificação da vida depende de forma aleatória das mutações genéticas, pode-se considerar que não haverá humanos fora daqui.


Em 1686, mesmo ano em que Isaac Newton publicou o seu monumental "Princípios Matemáticos da Filosofia Natural", no qual elabora as leis de movimento e da gravitação, o francês Bernard Le Bovier de Fontenelle publicou "Conversa sobre a Pluralidade dos Mundos", em que especula sobre a possibilidade de existência de vida em outros planetas. O texto retrata uma conversa fictícia entre um filósofo e uma marquesa, ao longo de passeios noturnos pelos jardins de seu castelo.

Fora o fato de a marquesa ser uma rara protagonista feminina num livro do século 17, Fontenelle mostra sua modernidade ao atribuir a ela uma intuição apuradíssima, que muitas vezes inspira e mesmo confunde o filósofo, que logo acolhe a confusão como parte indispensável do conhecimento.

Num dado momento, o filósofo explica: "Toda a filosofia é fundada em duas coisas; curiosidade e miopia...o problema é que queremos ver mais do que podemos...Portanto, filósofos passam a vida duvidando do que veem e tecendo conjecturas sobre o que lhes escapa". Essa observação descreve perfeitamente a questão alienígena, que trata da existência ou não de vida extraterrestre.

Passados mais de três séculos desde a publicação do livro de Fontenelle, a questão alienígena continua em aberto. Não sabemos se existe ou não vida fora da Terra, se bem que aprendemos muito sobre a natureza dos sistemas planetários, sobre as propriedades muitas vezes espetaculares dos planetas e luas de nosso sistema solar, e sobre a existência de um número gigantesco de outros planetas e luas, girando em torno das centenas de bilhões de estrelas em nossa galáxia.

Nosso conhecimento do cosmo hoje é profundamente diferente daquele vigente no final do século 17. E, dado o que sabemos, podemos especular, como devem fazer os filósofos naturais, sobre o que pode existir noutros mundos.

VIDA 

Qualquer discussão sobre vida extraterrestre deve começar com uma definição de vida. O problema é que não temos uma única definição, aceita pela comunidade científica. Alguns argumentam que definir é limitar e que, no caso da vida, é melhor deixar a questão em aberto: formas de vida inteiramente diversas das que conhecemos aqui podem existir em outros cantos do Universo.[

Pode ser, mas essa posição não é muito útil. Precisamos ao menos de uma definição operacional, algo que possamos usar quando vasculhamos outros mundos em busca de criaturas vivas.

Cientistas da Nasa adotam a seguinte definição: vida é um processo químico no qual sistemas são capazes de metabolizar energia de seu ambiente e de se reproduzir de acordo com o processo darwiniano de seleção natural. Em outras palavras, criaturas vivas consomem energia e se reproduzem e se diversificam segundo descreve a Teoria da Evolução de Darwin.

É claro que essa definição é limitada. Bebês e vovôs não se reproduzem e estão vivos. Já os vírus ocupam uma área limítrofe, pois não têm células mas passam a viver (a se reproduzir) quando em contato com uma célula que os hospeda. Essa definição operacional diferencia seres vivos de outros sistemas que podem se reproduzir--fogo, cristais, estrelas--mas não segundo a teoria da evolução.

Consideramos também que a química dos seres vivos baseia-se em compostos de carbono e é facilitada em meios aquosos: vida precisa de carbono e água. Alguns elementos químicos, como o silício, têm uma bioquímica mais limitada que a do carbono; já outros meios, como a amônia, são bem menos versáteis do que a água.

VIDA INTELIGENTE 

Na busca por vida extraterrestre, é essencial diferenciar vida de vida inteligente. No caso da Terra, nosso único ponto de referência, a vida existe há pelo menos 3,5 bilhões de anos; mas vida inteligente apenas há 200.000 anos, ao menos na forma da nossa espécie, Homo sapiens.

Mais dramaticamente, durante a maior parte desse tempo, 3 bilhões de anos, as únicas criaturas na Terra eram seres unicelulares, principalmente cianobactérias. Foram elas, devido a uma série de mutações acidentais, que evoluíram a ponto de poder realizar a fotossíntese, essencialmente transformando luz solar em oxigênio. Esse processo transformou a composição química da atmosfera que, uma vez rica em oxigênio, possibilitou a existência de criaturas com metabolismos mais complexos, que necessitam de fontes de energia mais eficientes.

Estamos aqui, nós e todos os outros seres multicelulares, devido a esse trabalho de bilhões de anos das cianobactérias.

A explosão na complexidade da vida aqui ocorreu em torno de 540 milhões de anos atrás, a famosa explosão do Cambriano. Num salto desproporcional, criaturas as mais diversas surgiram num intervalo relativamente curto de tempo, 20 milhões de anos, redefinindo a variedade da vida na Terra.

Mesmo assim, vida complexa não equivale a vida inteligente: os dinossauros existiram por cerca de 150 milhões de anos (portanto bem mais do que nós) e não demonstraram qualquer forma de inteligência maior, como compor sinfonias ou construir radiotelescópios.

É comum confundir evolução com complexificação, visto que é isto que observamos aqui. A própria conotação da palavra "evolução" contribui para isso. No entanto, a evolução da vida não tem um plano--uma teleologia--determinado; ela não visa "gerar" criaturas cada vez mais complexas.

O que a Teoria da Evolução por seleção natural nos diz é que a vida quer estar bem adaptada; se a coisa está funcionando bem, como no caso dos dinossauros por 150 milhões de anos, mutações ocorrerão, mas não necessariamente levarão a uma maior complexidade em direção à inteligência.

Por outro lado, a inteligência obviamente oferece enorme vantagem evolucionária, como vemos aqui: nós dominamos o planeta a ponto de mudá-lo e de ter a vida das outras espécies sob nosso poder. De fato, é pouco provável que mais de uma forma de vida inteligente possa conviver num planeta.

VIDA EXTRATERRESTRE

 Nas últimas duas décadas, confirmamos o que já era há muito suspeitado: que a maioria das estrelas têm planetas girando à sua volta. Na Via Láctea, nossa galáxia, são em torno de 200 bilhões de estrelas. Imagine que cerca de 60% dessas estrelas tenham planetas à sua volta. Como sabemos, a maioria dos planetas também têm luas. Júpiter, por exemplo, tem mais de 60. Com isso, chegamos fácil a mais de 1 trilhão de mundos em nossa galáxia apenas, cada um deles único em suas propriedades, com sua própria história. E a Via Láctea é uma dentre centenas de bilhões de galáxias no Universo.

Os números são estonteantes. Dado que as mesmas leis físicas operam em todo o cosmo, podemos esperar que muitos desses mundos tenham condições semelhantes às da Terra: água líquida, uma atmosfera rica e diversificada, temperaturas relativamente estáveis, uma química capaz de gerar os compostos orgânicos de que a vida necessita. Difícil imaginar que, dada essa riqueza planetária, não exista vida fora da Terra. Mas que vida será essa?

Pelos argumentos acima, podemos concluir duas coisas: primeiro, que a existência de vida deve ser separada da existência de vida inteligente, um fenômeno certamente muito mais raro; segundo, que as formas de vida existentes num determinado mundo dependem fundamentalmente da história desse mundo, de suas propriedades e composição.

Aqui, deduzimos algo de muito importante: dado que não existem dois mundos com a mesma história --por exemplo, sequência de colisões com cometas e asteroides, posição dentre outros planetas, número e massa das luas-- e dado que a diversificação da vida depende de forma aleatória das mutações genéticas, não existem formas de vida idênticas em mundos diferentes: cada mundo tem suas próprias criaturas, mesmo que possa haver uma repetição de certas características, como simetria aproximada entre lado esquerdo e direito etc. Ou seja, somos os únicos humanos no Universo.

CADÊ ELES? 

Em 1950, o famoso físico italiano Enrico Fermi estava almoçando com colegas no refeitório do laboratório nuclear de Los Alamos, nos Estados Unidos, quando, após rascunhar alguns cálculos no guardanapo, perguntou: "Cadê todo mundo?". Seus amigos se entreolharam e responderam que estava todo mundo ali. "Não vocês", disse Fermi, "os extraterrestres". "Cadê eles?"

Fermi argumentou que, como a Via Láctea tem em torno de 10 bilhões de anos (a Terra tem 4,5 bilhões) e 100.000 anos-luz de diâmetro, uma civilização inteligente que houvesse evoluído antes de nós teria tido tempo de sobra para colonizar a galáxia por inteiro, ou ao menos boa parte dela. Por que não temos evidência desses vizinhos alienígenas?

Para compreender o que Fermi dizia, basta ver que, se pudéssemos viajar a apenas um décimo da velocidade da luz (equivalente a 30.000 km/segundo), demoraríamos 1 milhão de anos para atravessar a galáxia. Uma civilização antiga com, digamos, dez milhões de anos de vantagem sobre nós (o que não é nada em 10 bilhões de anos), teria já se espalhado pelas estrelas como nós pela Terra.

Este é o Paradoxo de Fermi, usado como argumento contra a existência de inteligências extraterrestres: se são comuns, deveriam já ter nos visitado.

Os que defendem a existência de ETs inteligentes oferecem vários argumentos para explicar a ausência de evidência: vieram já e não se interessaram muito; não têm interesse em viajar pelas estrelas; se destroem quando descobrem tecnologias nucleares; estão por aqui mas não podemos vê-los; somos sua criação, seu experimento genético ou sua simulação de computador, um game que jogam.

Infelizmente, nenhum dos depoimentos de visitas e sequestros por ETs tem validade científica. Mesmo que milhares de pessoas jurem de pés juntos que tiveram contato com extraterrestres, não oferecem nada mais do que depoimentos orais que não têm qualquer valor como prova.

O mesmo ocorre com fotos, que sempre podem ser forjadas ou representar fenômenos atmosféricos e objetos voadores menos exóticos do que naves extraterrestres.

A questão extraterrestre é séria demais para que nos deixemos levar por oportunismos ou devaneios, ainda que aparentemente honestos. Mesmo que haja outros seres inteligentes em nossa galáxia, a verdade é que estamos tão longe deles que, na prática, devemos nos considerar sós. Nas próximas décadas, deveremos obter evidência, indireta que seja, da existência de vida em outro mundo.

Por exemplo, é possível imaginar que futuras missões espaciais que recorram a telescópios bem mais poderosos do que o Hubble possam vir a determinar a composição aproximada da atmosfera de planetas girando em torno de outras estrelas.

Se tais observações acusarem a presença de oxigênio, água, gás carbônico ou ozônio em planetas na zona habitável de sua estrela (a zona onde água líquida e temperaturas temperadas são possíveis), teremos ao menos candidatos a lugares onde a vida será plausível; se, com sorte, acharmos clorofila na atmosfera, podemos ter certeza de que a vida existe por lá.

Missões em busca de evidência direta, isto é, que pousem em outros mundos, são ainda ficção. Com a tecnologia que temos hoje, mesmo uma missão até a estrela (grupo de estrelas) mais próxima do sol, a alfa centauro, a 4,5 anos-luz de distância, demoraria em torno de 100 mil anos.

Junte-se a isso o problema da radiação letal que existe no espaço e problemas fisiológicos que ocorrem em viagens longas, e estamos fadados a ficar no nosso Sistema Solar por muito tempo.

E SE? 

Como em ciência devemos manter a cabeça aberta e não podemos eliminar a possibilidade da existência de ETs inteligentes, temos que abordar também a questão da nossa segurança. Se a maioria dos filmes de ficção científica estiverem certos, os ETs só viriam aqui para nos destruir e se apossar da Terra e de suas fontes de energia e minérios.

Em 2010 o físico Stephen Hawking escreveu sobre o assunto, alegando que é melhor nos escondermos deles ou corremos o risco de sermos encontrados e eliminados. Afinal, se você está perdido numa floresta em meio a criaturas desconhecidas, a última coisa que deve fazer é gritar ou acusar sua presença. Seria o caso de temer os ETs?

Dada a lista de medos que cidadãos modernos devem enfrentar--apocalipse nuclear, epidemias de novas doenças, sejam as naturais ou as geneticamente criadas, terrorismo, aquecimento global e suas consequências, catástrofes naturais etc.--é lícito pôr a ameaça de ETs no final.

Conforme argumentamos, a possibilidade de que existam outras inteligências na nossa galáxia é remota (mesmo que não seja nula), e a possibilidade de que essas inteligências tenham tecnologias ou interesse de vir aqui também.

Mais relevante é o que a astronomia moderna nos leva a concluir, que nosso planeta é uma joia rara, um oásis de vida em meio a um Universo hostil e indiferente. Somos nós--restos animados de estrelas capazes de especular sobre a possibilidade de vida além daqui--a grande surpresa cósmica.

Enquanto não conhecermos nossos vizinhos estelares, somos somente nós a manifestação de inteligência cósmica, as mentes com que o Universo tenta compreender a si mesmo.

FONTE: Folha de São Paulo, 26 de abril de 2015, caderno Ilustríssima.

O Trotsky de Padura, Danton e a Revolução

Por Miguel Urbano Rodrigues

O mais recente livro do escritor cubano Leonardo Padura tem sido largamente promovido, com numerosas edições em castelhano, português e outras línguas. O jornal “Público” consagrou três páginas ao livro e ao autor. O livro tem valor literário. Mas o que obviamente justifica este entusiasmo é que o autor abomina – é a palavra - o socialismo e o comunismo. Embora não o afirme explicitamente nos seus livros, põe os seus personagens a falar por si.

Uma mensagem eletrónica de Alberto Dines empurrou-me para a leitura, muito lenta, de O HOMEM QUE GOSTAVA DE CÃES, de Leonardo Padura*.

Tinha lido algumas das suas novelas policiais. Admirava o escritor, mas o cidadão não me inspirava simpatia.

Interrogava-me. Que livro seria aquele recebido com entusiasmo pela crítica em França, em Portugal, em Espanha (10 edições), no Brasil?

O suplemento cultural do diário Publico, de Lisboa, dedicou há dias três páginas ao escritor.



Depois percebi. Creio não ter lido nos últimos anos um romance sobre o qual me é tão difícil transmitir aquilo que senti.

O livro tem na versão portuguesa mais de 600 páginas. A dificuldade resulta de a opinião ter mudado à medida que avançava na leitura. O romance é uma caixa de surpresas que semeia perguntas sem resposta.


Na primeira parte o talento literário do autor impressionou-me muito. Mas à medida que prosseguia, a admiração foi acompanhada por um grande mal-estar.

Como explicar a contradição aparente?

Duas personagens prendem o leitor: Trotsky e o catalão que o assassinou em 1940, Ramon Mercader, o «herói» do romance.

Padura recorre no seu livro a uma técnica nele inovadora. Um dos narradores, Ivan Cárdenas, é um cubano, escritor frustrado que, numa praia a leste de Havana, ouviu a estória do crime contada por um amigo de Mercader, que na realidade é o próprio Mercader .

Padura, numa arquitetura ficcional complexa, inspirou-se na história real e na estória escutada para construir um romance já traduzido em muitas línguas.

As narrativas são paralelas, mas duas surgem interligadas: a vida trágica de Trotsky desde a sua deportação em 1928 para o Cazaquistão ao assassínio no México em 1940; e a lenta metamorfose de Ramon Mercader, o catalão de origem aristocrática que, de combatente na batalha de Madrid sem formação ideológica evoluiu num processo traumático para o fanático operacional da NKVD (precursora do KGB) que matou Trotsky com uma picareta.



Ivan, o narrador cubano, não esconde, ao refletir sobre a vida, o seu distanciamento da Revolução. Não somente a desaprova, como anseia pelo fim do socialismo, de um regime que considera responsável pela pobreza, pelo atraso, pela corrupção que alastram pela Ilha. Destila aversão pelo comunismo.

A meditação é de Ivan, mas para o leitor é transparente que as suas ideias, criticas e aspirações são de Padura.


O escritor, como a grande maioria dos jovens da sua geração, apoiou a Revolução nos primeiros anos. Mas o funcionamento do Partido, o sectarismo e o voluntarismo dos dirigentes cansaram-no, desiludiram-no.

Conheci em Cuba intelectuais que percorreram a estrada que os conduziu da adesão à desilusão.

Não condeno todos aqueles que renunciaram à militância revolucionária. O homem é um ser em mudança permanente. Mas as transformações ideológicas não são uniformes; diferem muito.

O romance de Padura fez-me recordar Lisandro Otero, um grande escritor. De revolucionário inflamado, disciplinado, que exerceu funções diplomáticas na Europa e n a América Latina, deslizou lentamente para um ceticismo que se tornou transparente em artigos publicados no Monde Diplomatique.

Ao ler o seu romance El Arbol de la Vida procurei-o em sua casa para tentar compreender aquilo que o levara da apologia à crítica.

A resposta, confusa, titubeante, não me esclareceu.


A mensagem do seu romance, pessimista, é transparente: sucessivas gerações passaram em Cuba, desde a época colonial, da rebelião ao conformismo, à rutura com a moral e a ética. Porquê? Porque todas as revoluções, na sua opinião, acabam por devorar aqueles que desafiam a ordem preexistente.

Mas, nos últimos anos da sua vida, Lisandro Otero, naturalizado mexicano, inverteu surpreendentemente o rumo, retomou a defesa da Revolução e foi-lhe atribuído o Premio Nacional de Literatura.

Danton, ao contrário de Lisandro, não recuperou a esperança depois de a perder. Tinha sepultado a ideia de revolução. Surge na História como a antítese de Robespierre.

O percurso de Trotsky é sinuoso, em certos trechos, quase incompreensível, mas morreu acreditando na revolução mundial como meta ao alcance do homem.

O ENIGMÁTICO PADURA

Padura (o governo de Rajoy atribuiu-lhe a nacionalidade espanhola) desconcerta o leitor.

Destoa do perfil do anticomunista tradicional. Para convencer, utiliza um processo que o distância dos historiadores anti-soviéticos como o americano Robert Conquest, ou de escritores como o russo Soljenitsin que para condenar o socialismo não hesita em atribuir à Revolução Francesa de l789 a origem de todos os males que culminaram, segundo ele, na Revolução bolchevique de Outubro de 17.

Padura esforçou- se por envolver o seu livro no manto de seriedade que conferiu prestigio ao romance histórico, de Walter Scott e Victor Hugo a Tolstoi.

Preparou-se durante muitos anos para escrever, de 2006 a 2009, a sua obra definitiva.


Estudou marxismo. Conhece a Historia das Revoluções Russas, leu muito sobre a geração de revolucionários profissionais que acompanharam Lenin na grande arrancada de 17. Quase todos (Kamenev, Zinoviev, Rikov, Smirnov, Preobrajensky, Piatakov, Radek, Rakovsky, entre outros) foram acusados nos processos de 36, 37 e 38 de trair a Revolução e - com a exceção de Radek - fuzilados.

Padura reuniu uma Documentação volumosa. Consultou os Arquivos Russos após a desagregação da URSS. Deixa transparecer intimidade com a cidade de Moscovo.

Registei que algumas citações reproduzem os originais.

Esse rigor aparente na montagem do livro contribui para incutir confiança ao leitor e persuadi-lo com habilidade de que este regresso a Trotsky recria numa obra de ficção o revolucionário e o homem.

Essa eventual conclusão desrespeita a História.

O Trotsky de Padura é uma personagem muito diferente do Trotsky real.

O escritor é fiel no relato ao itinerário do exilado, erigido por Stalin em inimigo número um. Acompanha-o no exilio, na Turquia, em França, na Noruega e, nos anos finais, em Coyoacan, no México.

Alberto Dines, ao manifestar-me o seu apreço pelo talento de Padura, salienta o «extraordinário trabalho de pesquisa e armação literária».

O comentário é pertinente. Mas Padura não é um historiador. Deforma Trotsky. Abusando da liberdade de ficcionista, atribui ao revolucionário exilado, nas suas meditações sobre o passado, arrependimentos e dúvidas incompatíveis com a sua personalidade e mundividência.


Padura transcreve passagens do documento, um testamento político, em que Trotsky transmitiu as suas últimas vontades. «Morrerei – afirmava - sendo um revolucionário proletário, um marxista, um materialista dialéctico».

Mas insinua que Trotsky estaria arrependido da sua responsabilidade na repressão dos marinheiros de Kronstadt em l921 e de falta de firmeza na defesa dos sindicatos durante o debate sobre o tema no Comité Central. Na realidade, Trotsky foi então um dos principais defensores da implacável repressão dos amotinados de Kronstadt e Lénine criticou-o por haver tomado a iniciativa da militarização dos sindicatos ferroviários durante a guerra civil.

Num dos capítulos do livro o escritor sugere que Trotsky, repensando o passado, era assaltado por dúvidas angustiantes sobre a própria validade do projeto comunista.

Padura atribui-lhe pensamentos como este: «seria o marxismo apenas mais uma “ideologia”, uma espécie de falsa consciência que levava as classes oprimidas e os seus partidos a acreditar que lutavam pelos seus próprios fins, quando na realidade estavam a beneficiar os interesses de uma nova classe governante?»(pág. 417).

AMBIÇÃO DESMESURADA

Padura dedicou mais de três anos à escrita do seu romance. Mas concebeu o projeto muito antes.

Terá corrido pelo mundo, de Barcelona ao México, passando por Moscovo e Paris, em busca de inspiração, para se impregnar da atmosfera dos cenários onde Mercader-Mornard se tinha preparado para a sua entrada na História.

Tinha uma ambição desmesurada. Acreditou que iria construir uma catedral da literatura. Esperava elevar-se ao nível de Tolstoi.

Não atingiu a meta. Escritor muito talentoso, não conseguiu criar uma grande obra.

O romance prende pela técnica, por um suspense que lembra o de John Le Carré. As personagens principais, de Ramon Mercader (mascarado de Mornard-Jacson), à sua mãe Caridad Mercader e ao russo Kotov, Tom, Grigoriev, Roberts, Eifingon (o responsável pela operação Canard, concebida para o crime de Coyoacan, mudava com frequência de nome) são muito trabalhadas. Mas Sylvia Ageloff, a trotsquista amante de Ramon Mercader, uma mulher inteligente, surge como figura caricatural.

As referências a Frida Kahlo, que era companheira de Ribera, e à breve relação amorosa-sexual que a grande pintora manteve com Trotsky têm algo de telenovela.

O Trotsky do romance não convence; os agentes secretos soviéticos que desfilam pelo livro também não .

Padura exagera tanto na diabolização da NKVD (sucessora da Tcheka) que não atinge o objetivo.

Desconheço a estória das viagens do escritor para se documentar e inspirar. Mas é tão minucioso nas referências a cidades como Barcelona, Madrid, Moscovo, Paris, Nova York e México que o leitor tende a acreditar que Padura conheceu intimamente os bairros, os parques, as ruas, os hotéis, os cafés, os restaurantes por onde andou o seu «herói», candidato a assassino.

Na cidade do México tive a oportunidade de visitar em Coyoacan a Casa Azul de Frida Kahlo e a casa fortaleza onde Trotsky foi abatido. Recordei pormenores de ambas ao ler as páginas em que Padura descreve com vagares a maneira como Mercader fendeu o crâneo de Trotsky com a picareta de alpinista que levava na gabardina. Fui invadido por um sentimento de repulsa, náusea e mal-estar.

UM FINAL FOLHETINESCO

O romance perde qualidade como obra literária na terceira e ultima parte, O APOCALIPSE.

Ramon Mercader afirmou à Policia secreta e ao tribunal que a iniciativa do crime fora exclusivamente sua. Não falou sob tortura. Nos três presídios por onde passou insistiu sempre em afirmar ser o belga Jacques Mornard, embora a justiça mexicana soubesse que era o catalão Ramon Mercader.

Cumpridos os 20 anos de prisão a que foi condenado, viajou para Moscovo onde lhe foi atribuída por Krutschov a Ordem de Lenine e guindado a Herói da União Soviética. Passou a chamar-se então Ramón Pavlovitch.


Quando lhe foi diagnosticado um cancro incurável, pediu a Fidel que lhe permitisse acabar os seus dias em Cuba e o pedido foi atendido (faleceu em Havana em l978). A sua larga permanência na Ilha terá contribuído para despertar o interesse de Padura.

Não há indícios de que tenha abdicado das suas convicções. Mas Padura submete Mercader a uma inesperada metamorfose politica após a sua instalação na União Soviética.

Quando em l968 reencontra em Moscovo Eifingon, seu antigo tutor, Mercader – que gozava então de privilégios excepcionais -, o agente secreto que dedicara a vida à URSS e a Stalin, mantem com o ex-quadro da NKVD - sempre segundo Padura - diálogos que desconcertam o leitor.

Eifingon conta que, após a queda de Beria, passou quinze anos na prisão. E confessa ao companheiro que lhe mentiu. Diz-lhe que Stalin desejava que ele fosse morto pela segurança de Trotsky após o crime, porque vivo seria muito incómodo. Temia que falasse.

Mercader e ele, na evocação de episódios históricos, não falam como desiludidos; expressam-se com o rancor de vítimas de uma engrenagem trituradora que os teria utlizado como meros instrumentos.

Transcrevo duas reflexões de Mercader: «a confissão de que não só tinha sido usado para efetuar uma vingança, como fora considerado uma peça mais do que prescindível, fez afundar-se a ultima tábua de salvação que tinha à passagem daqueles anos cheios de desenganos e de descobertas dolorosas (pág. 567).

«Sentia o desengano a corroê-lo por dentro e a deixá-lo vazio. Os vestígios do orgulho a que, apesar das dúvidas e da marginalização ,se tinha há muito agarrado com unhas e dentes, iam- se evaporando com o calor de verdades demasiado cínicas».

É a linguagem de alguém que já rompera com o comunismo.

Fica porem transparente para mim que quem fala por ambos é afinal Leonardo Padura, o escritor cubano que abomina – é a palavra - o socialismo e o comunismo, embora não o afirme nos seus livros.

De um amigo cubano, comentando os que emigram e os que ficam na ilha mas criticam o socialismo, recebi uma carta da qual transcrevo estas linhas:

«uma boa parte crítica porque isso é o caminho da fama, seja esta merecida ou não (…) por vezes é também a via para a melhora económica (…) Uma situação que dá muitos dividendos é caminhar pelo border line».


A qualidade literária do romance cai aliás muito no último capítulo, quando Padura regressa ao narrador Ivan.

***

Um esclarecimento pessoal:

Desaprovei desde a juventude a trajetória de Trotsky. Mais tarde li muitos dos seus livros e critiquei em artigos e conferências o seu pensamento político, o seu frenético anti-sovietismo e a criação da IV Internacional. Mas condenei sempre a feroz perseguição de que foi alvo, o apagamento do seu nome da Historia e as acusações absurdas de cumplicidade com o nazismo.


Os erros, a intolerância, a arrogância de Trotsky não me impedem, contudo, de reconhecer que foi um revolucionário que se assumiu ate ao fim como marxista e comunista.

Acrescentarei que os métodos, erros e crimes de Stalin não podem apagar que foi um revolucionário que viveu para a causa do comunismo e desempenhou um papel decisivo na derrota do Reich hitleriano, na vitória da guerra que salvou a humanidade do horror do fascismo.


*Leonardo Padura, O HOMEM QUE GOSTAVA DE CÃES, Porto Editora,2011


Vila Nova de Gaia,15 de Abril de 2015

FONTE: ODiario.Info