Apesar de emblemática, nova investida da PF contra desvios de
recursos públicos por médicos e empresários entrou na categoria das
operações “invisíveis” ao noticiário nacional, merecendo pouca atenção
Por Helena Sthephanowitz, no Blog da Helena
A Polícia Federal em conjunto com o Ministério Público Federal
realizou na semana passada(mais precisamente no dia 2, terça-feira) a
operação Desiderato contra fraudes praticadas por médicos e empresários
no SUS (Sistema Único de Saúde) em quatro estados: Minas Gerais, São
Paulo, Rio de Janeiro e Santa Catarina.
O centro da operação foi na cidade de Montes Claros (MG), onde três
médicos cardiologistas foram presos por evidência de três tipos de
crimes: receber propinas sobre equipamentos médicos comprados com verbas
do SUS, desvio destes equipamentos do patrimônio público para uso em
clínicas particulares, e cobrar “por fora” de pacientes atendidos pelo
SUS.
Empresários e suas empresas que teriam corrompidos os médicos também
foram alvos da operação. A Polícia Federal, como é de praxe no período
de investigações, manteve os nomes em sigilo.
Apesar de emblemática e de servir de referência para reprimir estes
crimes em unidades de saúde de todo o Brasil, esta operação da Polícia
Federal entrou na categoria das operações “invisíveis” ao noticiário
nacional, merecendo pouca atenção. O fato de os médicos presos terem se
limitado à cidade de Montes Claros não torna a notícia regional, pois o
delegado da PF Marcelo Freitas, que conduziu as investigações, afirma:
“Acreditamos que o mesmo tipo de fraude se estenda por todo o território
nacional, o que precisa ser investigado”.
A importância nacional foi reforçada pelo delegado ao dizer que
atualmente os desvios são facilitados pela falta de controle sobre as
próteses. A notas fiscais de venda investigadas informam apenas
quantidade e número do lote, mas omitem os números de série. O
Ministério Público encaminhará à Agência Nacional de Vigilância
Sanitária (ANVISA) recomendação para tornar obrigatória a discriminação
deste verificador.
O delegado informou que o mesmo crime será investigado em outras
especialidades, como próteses de ortopedia, de otorrinolaringologia e
oncologia. As diligências feitas na sede das empresas fornecedoras que
corrompiam médicos deixa claro que a investigação busca pegar delitos
semelhantes em outras cidades do Brasil.
As investigações iniciadas em julho de 2014. Segundo os
investigadores, stents (dispositivo para desobstruir artérias do
coração) eram comprados para pacientes que não precisavam. Os maus
médicos faziam um laudo realista para o paciente, sem referência ao
stent. Faziam outro laudo – fraudulento – com a indicação de uso do
aparelho para a coordenação do Sistema Único de Saúde. Assim, criavam um
estoque paralelo dos dispositivos. Tudo pago com recursos do SUS, mas
que eram desviados para uso em pacientes particulares e que pagava
diretamente aos médicos pelo uso de itens comprados com dinheiro
público.
Além dos desvios, os médicos recebiam propinas dos fornecedores. Os
aparelhos custam aos cofres públicos entre R$ 2 mil e R$ 11 mil,
conforme o modelo, e os médicos ganhavam propinas de R$ 500 a R$ 1.000
por unidade que pediam. Não precisa nem desenhar que, se não houvessem
as propinas, o preço cobrado ao SUS poderia ser menor.
O grupo de médicos envolvidos chegou a receber R$ 110 mil por mês e
criaram até uma empresa de fachada para receber a propina das
distribuidoras simulando “prestação de serviços” para lavar o dinheiro
sujo, segundo a PF.
Outra prática criminosa destes médicos foi, além de receber pelo
procedimento através do SUS, cobrar “por fora” de pacientes. A Santa
Casa de Montes Claros suspendeu um dos médicos da equipe de
hemodinâmica, depois de saber que cobrou R$ 40 mil para um tratamento
pelo SUS do paciente Vladiolano Moreira. Depois de receber a denúncia,
abriu sindicância e constatou que o médico já tinha recebido R$ 20 mil.
Com as investigações, a família recebeu o dinheiro de volta. Não foi o
único caso constatado. Outra paciente, Maria Ferreira teve de pagar R$ 3
mil. Nilza Fagundes Silva pagou R$ 10 mil.
Os investigados foram indiciados pelos crimes de estelionato contra
entidade pública, associação criminosa, falsidade ideológica, uso de
documento falso, corrupção passiva, corrupção ativa e organização
criminosa. A Santa Casa e o Hospital Dilson Godinho, onde a quadrilha
atuou, não participaram dos delitos e colaboraram com as investigações,
de acordo com a PF.
A operação mobilizou 200 policiais federais para cumprir 8 mandados
de prisão temporária, 7 conduções coercitivas, 21 mandados de busca e
apreensão e 36 mandados de sequestro de bens. O diretor Daniel Eugênio
dos Santos da empresa Biotronic, residente em São Paulo, escapuliu de
ser preso porque está em viagem de férias com a família nos Estados
Unidos.
Daniel dos Santos tem um antecedente semelhante. O Ministério Público
Federal já o denunciou junto com outros seis empresários e os médicos
Elias Ésber Kanaan e Petrônio Rangel Salvador Júnior do Hospital das
Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), por propinas para
cirurgias de implantes de marcapassos e desfibriladores, entre o período
de 2003 e 2008. Chamou atenção o número completamente desproporcional
ao do restante do país e a denúncia afirma que haviam casos
desnecessários. Apurou-se também a compra aparelhos em número maior do
que o efetivamente implantado, com efetivo prejuízo aos cofres públicos.
Este antecedente comprova que as investigações sobre estes crimes precisam ir muito além de Montes Claros.
Não é só a imprensa oligopólica quem dá pouca visibilidade a estes
delitos. O senador Ronaldo Caiado (DEM-GO), por exemplo, que é médico
(ortopedista) e empresário do setor, em vez de dedicar-se a perseguir
médicos cubanos com proselitismo arcaico do tempo da guerra fria,
deveria se dedicar a legislar e fiscalizar, nas comissões do Senado,
estes malfeitos de sua classe profissional que tanto mal faz ao povo
brasileiro.
FONTE: Portal Fórum
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