Por Henrique Carneiro
Friedrich Engels (1820-1895) nasceu em
Barmen, Alemanha, filho de um bem sucedido industrial. Enviado pelo pai
para aprender a gerenciar sua fábrica de algodão em Manchester,
Inglaterra, o jovem Engels dedicou-se a investigar a situação dos
operários e publicou, aos vinte e três anos, A situação da classe trabalhadora na Inglaterra,
um dos primeiros estudos sobre as condições de exploração do
proletariado. Após conhecer Karl Marx (1818-1883), une-se a ele numa
fecunda amizade e parceria política e intelectual que perduraria até a
morte de Marx. Um ano depois, Engels, a partir de algumas notas esparsas
do seu recém falecido amigo sobre um livro do norte-americano Lewis
Henry Morgan, desenvolveu a mais ambiciosa aplicação do materialismo
histórico para a tentativa de compreensão do desenvolvimento das formas
da família, da propriedade e do Estado desde a pré-história e, até
mesmo, para esboçar as formas previstas de uma futura sociedade
socialista.
Escrito em dois meses e publicado em alemão, em outubro de 1884, em Zurich, na Suiça, A origem da família, da propriedade privada e do Estado,
é uma das mais importantes reflexões teóricas do marxismo. Ela se
destaca como um diálogo fecundo do materialismo histórico com a
antropologia, especialmente com a investigação de Morgan. Esse campo do
conhecimento estava em constituição ainda embrionária no século XIX,
tanto no seu aspecto teórico mais geral como no sentido de uma
etnografia extensa dos povos da terra. O pouco que se conhecia na época
vinha especialmente dos estudos realizados nos Estados Unidos entre as
populações indígenas, especialmente os iroqueses, que eram da região
nordeste do continente, próximo do que é hoje Nova Iorque. Lewis Morgan,
que viveu muitos anos entre essas comunidades e publicou importantes
livros[1], foi o principal inspirador de Engels na sua análise das formas históricas da “família” na humanidade.
As fases históricas da humanidade
A periodização dos estágios de evolução
das sociedades humanas em três fases: selvageria, barbárie e
civilização, conforme a capacidade produtiva das “invenções e
descobertas” e a localização histórica das formas correspondentes de
agrupamento familiar humano e dos momentos de surgimento da propriedade
privada e do Estado é uma das grandes contribuições de Morgan.
Para Engels, a obra de Morgan era tão
importante como a de Darwin, pois ambas teriam desenvolvido uma visão
análoga à do “materialismo histórico” dele e de Marx. Tal enfoque
teórico analisa cada período histórico da humanidade como um processo de
produção e reprodução da vida imediata, para a qual o desenvolvimento
da capacidade do trabalho humano em interagir e transformar a natureza
reflete-se nas técnicas de produção. Assim é o trabalho humano que
constitui a humanidade não só do ponto de vista cultural, mas até mesmo
anatomicamente, daí a famosa frase de Engels de que a mão humana é não
apenas o orgão do trabalho, mas também o produto do trabalho. A mão, com
a preensibilidade do polegar que permite a manipulação de instrumentos,
o cérebro com áreas estimuladas pela necessidade de desenvolver
habilidades como a linguagem e a traquéia capaz de emitir sons variados,
são órgãos históricos, produtos do desenvolvimento coletivo da
sociabilidade humana.
As fases de Morgan, denominadas,
contudo, com uma terminologia questionável e típica da era vitoriana
(“selvageria”, “barbárie” e “civilização”), representam os estágios
respectivos das formações sociais dos caçadores coletores, seguidos
pelos agricultores e domesticadores de animais e, finalmente, pelos
povos urbanos e de artesanato desenvolvido, inclusive dos metais. Sua
sequência, em geral, corresponde aos estudos posteriores, mas, à luz da
ciência contemporânea, há uma série de equívocos que Engels reproduz: o
uso do fogo não é da fase média da selvageria, mas muito anterior, e
não tem nenhuma relação direta ou “complementar” com o consumo de
peixes. A fundição de ferro não é um marco entre as fases média e
superior da barbárie. A domesticação dos animais no Oriente não antecede
ao cultivo de plantas, mas é contemporâneo a ele. Considerar a
civilização Inca como estando ainda na fase média da barbárie na época
da Conquista tampouco é aceitável (John Rees, 1994; Gordon Childe,
1966). O esquema geral, contudo, demonstrou-se capaz de descrever os
estágios fundamentais da evolução cultural humana, embora sua
linearidade expresse um evolucionismo que não leva em conta os processos
regressivos de sociedades que decaíram e desapareceram (p. ex., os
Maias, a cultura micênica em Creta ou o povo da Ilha da Páscoa). De
forma geral, os grandes períodos compreendidos nas “idades” respectivas
da pedra lascada, da pedra polida, do bronze e do ferro, referem-se à
“selvageria paleolítica”, à “barbárie inferior neolítica”, à “barbárie
superior calcolítica” e ao surgimento das grandes civilizações da época
final do bronze e inicial do ferro. V. Gordon Childe, o grande
arqueólogo pré-histórico, cunhou os termos “revolução neolítica” para
referir-se à passagem da selvageria à barbárie com o advento da
agricultura, há cerca de dez mil anos, e “revolução urbana” para situar o
surgimento da civilização (palavra que se origina do termo latino civitas
que significa justamente cidade), em torno de 3 mil anos antes de
Cristo, que foi, segundo ele, a época mais fértil de toda a história
humana, antes do século XVI, em invenções e descobertas úteis: fundição
de cobre, bronze, arado, tração animal, carros com rodas, canais de
irrigação, edifícios, barcos e, para contabilizar toda a nova riqueza, o
alfabeto.
As origens da opressão da mulher e da exploração do trabalho
A tese central de Engels é que, na
passagem da selvageria para a barbárie, ao final do “comunismo
primitivo”, nascem conjuntamente a opressão de classe, com o surgimento
da propriedade privada, inclusive de outros homens na forma de escravos,
e a opressão feminina com a subordinação da mulher ao direito paterno
para garantir a transmissão de sua linhagem e propriedade. Nesse
sentido, ele afirma de forma lapidar, que “a derrota histórica do gênero
feminino” ocorreu com o advento da propriedade privada. O surgimento de
um excedente nas sociedades primitivas não só teria levado à sua
apropriação desigual, como à uma desigualdade na relação entre os
gêneros na partilha das tarefas da produção e reprodução da espécie, que
passam a ficar separadas, cabendo à mulher quase exclusivamente as
funções da criação dos filhos e da casa, cada vez mais afastadas da
“indústria social”. Enquanto entre os caçadores e coletores e mesmo no
início da horticultura com estaca ou enxada, as mulheres viviam em
condições igualitárias e eram as mais importantes fornecedoras de comida
e criadoras dos artesanatos, com a expansão da agricultura extensiva e o
surgimento de excedentes, sua condição social decaiu para um tipo de
servidão. Essa tese, afirmando que a origem da opressão é cultural e
pode vir a desaparecer no futuro, refuta as interpretações que buscam um
fundamento biológico “natural” para a opressão feminina, como ocorria,
por exemplo, no liberalismo preocupado com a questão da emancipação da
mulher de Stuart Mill, que identificava a origem da opressão feminina na
maior força física dos homens.
O livro de Engels representa um
posicionamento político diante de todas as formas de opressão, que, para
ele, possuem raízes comuns, chegando a dizer que “na família, o homem é
o burguês e a mulher o proletário”. Nesse sentido, dando continuidade a
uma tradição que tem antecedentes no utopista francês Charles Fourier,
ele participou da fundação das bases teóricas do feminismo político
contemporâneo. A defesa não só da igualdade política, mas da conversão
da economia doméstica num assunto público, com a reincorporação plena
das mulheres na “indústria social” definiu um programa necessário para a
emancipação feminina.
É preciso lembrar que, na época em que o
livro foi escrito, não só as mulheres não tinham direito de voto, de
divórcio, de autonomia de sua vontade diante do esposo, de uso de
contraceptivos, como nem sequer tinham direito de participação política,
mesmo no movimento operário, que majoritariamente se opunha ao trabalho
femino e à participação de mulheres em sindicatos e partidos,
defendendo que o lugar da mulher era no lar. Assim escrevia Proudhon e
dessa forma se manifestou o Congresso Sindical na Inglaterra em 1877, as
mulheres não deviam trabalhar não só porque isso aumentava o desemprego
e baixava os salários, mas porque era imoral: o lugar da mulher era na
vida doméstica. A proposta do socialista Auguste Bebel de direitos
iguais entre homens e mulheres no Congresso de Gotha, de unificação dos
socialistas alemães num só partido, em 1875, foi rejeitada, sob o
argumento de que as mulheres não estariam preparadas! Somente em 1891, o
partido socialista alemão admitiu esse princípio, mas mesmo assim ainda
demoraram anos e dependeu de intenso debate a filiação de mulheres no
partido em igualdade de direitos com os homens (inicialmente elas não
tinham direito à palavra e deviam se reunir separadas) (Andrea Nye,
1995). Mesmo o direito de voto feminino nunca foi muito popular entre o
movimento operário, pois se acreditava que as mulheres tenderiam a ser
mais conservadoras e votar nos candidatos apoiados pela Igreja. Nesse
sentido, a defesa por Engels, da plena emancipação feminina, da
igualdade dos gêneros e do direito (e necessidade para a sua libertação)
de trabalhar e decidir por conta própria era uma posição revolucionária
audaciosa mesmo entre os socialistas.
Outro posicionamento claro e desafiador
de Engels era diante do conceito burguês de “civilização”. Na época da
expansão do colonialismo europeu sob o manto da “civilização” que iria
levar a “modernização” para os “povos primitivos”, cujo pacto de divisão
da África acabava de ser selado no Congresso de Berlim, em 1881, Engels
faz um elogio das liberdades da “comunidade primitiva” dos povos do
estado selvagem e até mesmo do “caráter democrático original das
organizações gentílicas” dos povos do estado da barbárie, que é “uma
arma na mão dos oprimidos”, perante o caráter “dúbio, ambíguo, equívoco,
contraditório” de tudo que a civilização produz.
Sua verdadeira admiração pelos povos do
comunismo primitivo revela-se, sobretudo, na sua afirmação de uma
primitiva preponderância feminina na organização social. Tal época, é
chamada alternativamente de “matriarcado” ou de “direito materno”,
quando a matrilinearidade, ou seja, o reconhecimento da filiação apenas
da mãe, daria às mulheres um papel não apenas igualado mas superior ao
dos homens. Embora o termo “matriarcado” possa ser incorretamente
interpretado como o de uma época em que teriam existido sociedades
estatais com supremacia feminina, o seu significado, em Engels, é de um
tipo de sociedade que a pesquisa posterior comprovou existir onde
ocorrem matrilinearidade (descendência materna) e matrilocalidade
(residência do marido na casa da linhagem da esposa).
Nesse ponto, manifesta-se mais um
aspecto da audácia teórica de Engels, inspirado nas obras de Morgan e
Bachofen, ao negar a perpetuidade da “sagrada família” e do patriarcado.
As relações sexuais são vistas no período mais remoto como expressão de
um intercâmbio generalizado, que Bachofen tinha chamado de “heterismo”.
Um exemplo desse regime é registrado por um cronista jesuíta entre os
índios do Canadá, no século XVIII, que ao tentar convencer um indígena a
abdicar dessa “promiscuidade” em que sua esposa frequentava diversos
outros homens, argumentou-lhe que ele assim não poderia nem sequer ter a
certeza da paternidade sobre seus filhos, ao que o indígena respondeu
que isso não lhe importava, pois se entre os brancos um homem ama apenas
seus filhos, na sua tribo os homens amavam igualmente todas as crianças
(Sharon Smith, 1997). Tais características da sexualidade indígena, que
já haviam sido notadas pelos viajantes nos mares do sul e que, mais
tarde, Malinovski e Margaret Mead vão estudar entre os trobriandeses,
haviam seduzido a imaginação européia, mas, até as obras de Bachofen,
Morgan e Engels, ninguém havia sugerido que elas seriam a praxe entre a
humanidade pré-histórica. Essa idéia sofre, contudo, de um excessivo
caráter especulativo, dado que abrange milhões de anos que não podem ser
generalizados em uma única fórmula. Sabe-se por estudos zoológicos, que
mesmo entre os primatas superiores existem uma ampla variedade de
comportamentos e nenhuma regra estritamente definida.
Nessa época pré-histórica em que a vida
sexual teria se caracterizado por uma “promiscuidade” generalizada, com
famílias consanguíneas de grandes grupos, ocorreria, segundo Engels,
apenas uma divisão por gerações no intercâmbio sexual. O tema fascinante
da origem do tabu do incesto paterno ou materno praticamente não é
abordado por Engels, exceto para afirmar que seria instintiva (p.46),
opinião que depois será fortemente refutada por Freud, entre outros. O
próprio Engels é contraditório com essa opinião, pois em outra passagem
anterior, afirmou que o incesto é uma “invenção” (p.39). A tendência
histórica de uma restrição cada vez maior no círculo de intercurso
sexual até seu estreitamento na forma bipolar da monogamia é vista por
Engels de uma forma cronologicamente quase linear. A explicação para
esse fenômeno é esboçada numa passagem como sendo uma consequência da
seleção natural (p.54), mas também parece contraditória com a noção do
aprendizado cultural característico de cada época histórica, no interior
das quais Engels encaixa um pouco esquematicamente as formas de
família: “matrimônio por grupos” na “selvageria”; “família sindiásmica”
(de casais) na “barbárie”; e “monogamia” na “civilização”. Tal visão,
constitui-se com dados empíricos extremamente limitados, o que leva à
uma comparação problemática entre sociedades indígenas contemporâneas e
sociedades pré-históricas desaparecidas, baseada apenas na semelhança de
saberes e equipamentos culturais.
Da mesma forma, outras limitações levam
Engels a idealizar a sexualidade humana tanto entre o proletariado
contemporâneo de sua época (onde a prostituição e o adultério teriam um
papel “quase nulo”, em comparação com a burguesia), como entre a
humanidade do futuro e a de todas as épocas, ao considerar a
homossexualidade como “um vício antinatural”. Sobre este tema, há três
passagens do livro de Engels, na primeira ele considera que, entre os
gregos, as “repugnantes práticas da pederastia” levaram-nos a se
desonrarem a si próprios e aos seus deuses pelo mito de Ganimedes (que
foi o único amor homoerótico de Zeus com um jovem mortal). Curiosamente,
Engels não menciona Platão e seus diálogos sobre o amor homoerótico e o
mito do andrógino original. Na segunda passagem, ele atribui o
homossexualismo entre os germanos à sua “decadência moral” devido ao
contato com os nômades do Mar Negro que, além da arte da equitação,
ensinaram-lhes “feios vícios antinaturais”. E, finalmente, na terceira
menção, registra sem comentários, como se fosse algo natural, que a
assembléia do povo entre os germanos só decretava pena de morte para
“covardia, traição e vícios antinaturais”. O movimento socialista e
progressista teria ainda de esperar o século XX e figuras como o alemão
Magnus Hirschfeld para que os direitos dos homossexuais se tornassem uma
reivindicação política.
A monogamia e a família burguesa, ideais
morais solenes, hipócritas e praticamente consensuais em sua época são
criticadas veementemente por Engels, como uma “escravização de um sexo
pelo outro”. Seus complementos necessários seriam o adultério e a
prostituição. Diante da vigência de um puritanismo de fachada
extremamente severo na sociedade vitoriana do final do século XIX, foi
uma grande coragem de Engels expor de forma tão explícita o significado
dos chamados “valores familiares burgueses” [2].
A visão histórica de Engels da
prostituição, entretanto, é muito questionável, pois ele a relaciona com
uma fase de transição entre o casamento por grupos e a restrição da
disponibilidade feminina, que conquistaria o “direito à castidade”, mas
para isso, teria passado por um ritual de expiação, de sacrifício, na
forma da “prostituição sagrada” nos templos da Babilônia ou de jus prima noctis
(direito à primeira noite) em inúmeras sociedades, ou seja, mistura
fenômenos muito diversos atribuindo-lhes um significado comum.
Historiadores contemporâneos mostraram como o termo “prostituta”, na
época moderna, foi usado pela medicina e pela Igreja para estigmatizar
as mulheres que buscassem prazer sexual, mesmo que no interior do
casamento ( Magali Engel, 1989; Jean-Louis Flandrin, 1988).
Outras passagens de Engels, como a idéia
que haveria uma tendência “instintiva” de se limitar o incesto (p.46),
de que a poliandria não existe entre os animais (p.49), de que a
poligamia e a poliandria são exceções, “artigos de luxo” como ele
escreve, entre as sociedades humanas (p.60), também são totalmente
questionáveis à luz da pesquisa histórica e antropológica posteriores.
Na idealização do futuro, Engels também
se mostra pouco imaginativo, pois curiosamente não vislumbra nada além
de uma “realização plena da monogamia”, pois considera que “o amor
sexual é, por sua própria natureza, exclusivista” e a igualdade influirá
mais em tornar os homens monógamos do que as mulheres poliândricas.
Essa passagem, como apontam teóricas feministas socialistas (Sharon
Smith, 1997), partilha da ideologia de que os homens são “naturalmente”
inclinados para desejar muitas parceiras enquanto a biologia das
mulheres tenderia a incliná-las para desejar apena um. Em outra
passagem, entretanto, o próprio Engels adverte de que não é possível
imaginar como será a vida sexual das gerações futuras quando não houver
mais a alienação social e as relações intermediadas pela mercadoria. A
incorporação das mulheres às fileiras do proletariado no século XX foi
mais intensa do que Engels podia prever. As alterações na sexualidade
contemporânea com a emergência de formas familiares “alternativas”, de
métodos de contracepção e aborto, assim como de fertilização in vitro,
“barrigas de aluguel” e até mesmo alteração de sexo por meio de
hormônios e cirurgia apontam uma complexidade muito maior no futuro das
transformações das relações amorosas e da reprodução humana.
O tema do “amor livre”, que Charles
Fourier havia chegado a propor, não se encontra em Engels, surgindo
apenas mais tarde em autoras socialistas e anarquistas como Alexandra
Kollontai e Emma Goldman. Lênin em polêmica com Clara Zetkin vai
condenar essas idéias e práticas como desviantes da energia
revolucionária, especialmente da juventude, dando margem para que um
autor como Eric Hobsbawm (2003) chegue a formular a tese de que as
revoluções sempre são intrinsecamente puritanas, confundindo as
determinações dos seus ideólogos ou dirigentes com as energias reais de
mudanças na vida cotidiana despertadas no comportamento das massas.
Na história posterior do movimento socialista internacional, a obra de Engels foi inspiração para diversos outros trabalhos[3]
e, mais recentemente, voltou a ser objeto de controvérsia, na época do
surgimento do movimento feminista de massas dos anos 60, quando três
temas em particular, foram foco de um debate ainda inconcluso: a
natureza econômica do trabalho doméstico, a existência de um modo de
“reprodução” ao lado do modo de produção e a existência de outros
fundamentos históricos ideológicos, não necessariamente econômicos, para
a dominação masculina[4].
As sociedades arcaicas e os diversos modos de produção
Afirmar que a família, as classes e o
Estado não eram eternos e que deveriam sofrer mudanças revolucionárias
foi o significado mais abrangente da obra de Engels, questionando a
perpetuidade das entidades abstratas do patriotismo burguês e da família
patriarcal como mera ideologia metafísica que a dialética materialista
permite situar em seu lugar histórico transitório. As tendências humanas
à competição e à desigualdade não existiram sempre nem seriam
características instintivas de uma pretensa “natureza humana” abstrata,
como afirma o pensamento liberal formulado por Hobbes e outros, mas,
pelo contrário, surgiram historicamente com a propriedade privada, as
classes e o Estado, e foram antecedidadas por milhões de anos de
desenvolvimento de sociedades de caçadores coletores marcadas pelo
igualitarismo, a partilha, a reciprocidade e a comunidade que, apesar de
sua carência relativa (o antropólogo Marshal Sahlins chamou-as de
“sociedades afluentes”), nos mostram um passado humano construído na
vida coletiva da colaboração mútua através do trabalho de todos em prol
da comunidade. Como escreve Hobsbawm (1975, p.51), “que o comunismo
seria uma recriação, em mais alto nível, das virtudes sociais do
comunalismo primitivo, é uma idéia que pertence à mais precoce herança
do socialismo”. Comentando que nenhuma sociedade antiga tinha na riqueza
em si o objetivo da produção, Marx afirmou (Formações econômicas pré-capitalistas,
p. 80) que: “a antiga concepção segundo a qual o homem sempre aparece
como o objetivo da produção parece muito mais elevada do que a do mundo
moderno, na qual a produção é o objetivo do homem, e a riqueza o
objetivo da produção” e, numa carta a Engels de 25 de março de 1868,
comenta que, ao olhar para a era primitiva de cada nação, encontram-se
correspondências com a tendência socialista, o que levaria, mesmo os
mais eruditos, a se surpreenderem ao “descobrir o que é o mais novo no
que é o mais velho” (idem, p.130).
A opressão feminina foi identificada por
Engels como concomitante ao surgimento das classes sociais e da
propriedade, encerrando uma longa e arcaica fase de propriedade comunal e
iniciando uma série de modos de produção baseados na divisão social e
apropriação desigual do produto social.
Sobre este tema, desenvolveu-se uma
imensa discussão a respeito dos diversos modos de produção. A própria
definição teórica do que é um modo de produção e como ele se articula
com as formações econômico-sociais concretas e todas as suas formas
políticas, ideológicas, religiosas, etc., é um tema controverso que não
possui uma formulação simples nem acabada na obra de Marx e Engels.
Modos de produção são um modelo teórico,
cuja concretude depende das especificidades particulares de cada região
e povo em questão. A visão mais comum, interpretada da obra de Marx e
Engels, identifica a existência depois do comunalismo primitivo de
outros quatro modos de produção posteriores: o asiático, o antigo, o
feudal e o capitalista, conforme são relacionados no Prefácio da Crítica da Economia Política.
Em outras passagens, Marx menciona o germânico e o eslavônico como
alternativas também possíveis da evolução da propriedade comunal.
Nenhum desses modos de produção é nem
absoluto nem homogêneo, é apenas o modo dominante em mistura com
diversos híbridos e resquícios vários. O asiático, com uma definição
pouco aprofundada[5],
foi definido por Marx como sendo aquele característico de sociedades em
que existia um Estado centralizado, encarregado de grandes obras
públicas, mas não existe propriedade privada da terra (como seria o caso
da Índia e, especialmente, da China antigas). O feudal seria uma
derivação da mistura do modo de produção antigo, caracterizado pelo uso
extenso de escravos, portanto também chamado de escravista, com o modo
germânico. Isso significa que não há, em Marx, qualquer unilinearidade
sucessiva entre um modo de produção e outro, eles não constituem etapas
necessárias de todas as sociedades mas formas concretas e singulares que
ocorreram especialmente na formação euroasiática.
Algo muito diferente ocorreu com a
interpretação unilinear, etapista e dogmática que prevaleceu após a
degeneração stalinista da URSS. A aplicação concreta dos modos de
produção à diversas sociedades históricas foi objeto de uma intensa
manipulação política da teoria. O modo de produção asiático passou a ser
combatido em meados dos anos de 1920, pois Trotsky e outros,
discordavam da caracterização da China como feudalismo, adotada pela III
Internacional para justificar sua proposta de aliança com a burguesia
nacional para a realização de uma revolução democrático-burguesa, etapa
vista como necessária naquele país, assim como em outros países
atrasados como, por exemplo, o Brasil.
Essa categoria teórica buscava explicar
sociedades agrárias sem propriedade privada do solo, mas com um estado
despótico e burocrático. Tais sociedades não teriam sido apenas da
região asiática (por isso o conceito não é geograficamente determinado),
mas incluiriam, por exemplo, e dependendo do autor, sociedades como o
Egito, o México e Peru pré-colombianos ou até mesmo a própria Rússia
czarista.
Foi exatamente essa última aplicação do
conceito que levou Stálin a condená-lo pois descrevia um tipo de
sociedade burocrática, sem propriedade privada mas com um Estado forte
que poderia ser identificada na sociedade soviética. O Origem da Família..., de Engels, assim como o Manifesto Comunista,
por não incluirem referência explícita ao modo de produção asiático
foram usados como argumento para negar a sua validade. Mais tarde, nos
anos 60, quando da ruptura soviética com a China, passou a se reestudar
essa categoria na academia soviética, para utilizá-la exatamente para a
descrição da China antiga (e para os que quisessem ler nas entrelinhas
também a China maoísta). Os próprios chineses nunca aceitaram essa
definição para o seu país adotando a caracterização oficial de
“feudalismo” para o que existia na China antes da chegada do capitalismo
ocidental (vide G. Sofri, 1969). Esse uso excessivamente abrangente de
feudalismo, um conceito impróprio desde a origem, pois remete a uma
forma política de vassalagem e não a uma relação econômica, tornou-o uma
espécie de generalização fácil para toda sociedade “atrasada” em que
existia uma propriedade senhorial da terra.
O livro de Engels não aprofunda a
relação dos modos de produção com a história das formas de propriedade,
tratando da organização gentílica antiga, especialmente da grega, romana
e germânica, mas não abordando as sociedades asiáticas. Este debate
prosseguiu tanto entre os próprio Marx e Engels como em toda discussão
teórica posterior[6].
A natureza e as formas do Estado
A influência maior do livro de Engels
sobre a história do movimento operário internacional e sobre a teoria
revolucionária talvez não tenha sido, entretanto, as partes que tratam
da origem da família e da propriedade, mas a que trata do Estado, não
tanto em sua origem, mas em suas características na época contemporânea.
Este último nasceria como expressão do surgimento do antagonismo social
com a acumulação de riqueza e propriedade privada, especialmente de
escravos. Como diz Engels, a propensão para a troca leva o próprio homem
a ser trocado como uma das principais mercadorias (a importância dos
escravos nas primeiras sociedades divididas em classes foi, no entanto
minimizada posteriormente, no que se refere aos estudos sobre a
Mesopotâmia).
A relação do Estado com as classes
dominantes e a caracterização dos Estados específicos em diferentes
épocas e regiões tornou-se um elemento central na análise das formações
sociais e econômicas. Os Estados garantem a repressão e a exploração, ou
seja, cumprem o papel de produzir e reproduzir as condições sociais
existentes para manter o domínio das classes dominantes. Em sua origem, o
Estado constitui-se a partir de um território sobre o qual exercerá sua
soberania através de uma força militar que se torna independente do
conjunto do povo armado, ocupando o lugar de uma força coercitiva
externa aos cidadãos (na Grécia antiga, por exemplo, a polícia foi
formada de escravos, pois nenhum cidadão se dispunha a cumprir um papel
tão odioso como o de ser uma tropa repressiva). E, finalmente, para
exercer tais funções o Estado necessita arrecadar tributo e formar uma
camada administrativa, a burocracia, que também irá assumir a
característica de uma camada externa e superior ao conjunto da população
de um território.
As formas do Estado têm relação com as
formas de produção e apropriação, ou seja, com os modos de produção, e
as classes dominantes e suas facções lutam pelo seu predomínio,
reagindo, sobretudo, à ameaça potencial ou presente da ação das classes
dominadas e exploradas.
Uma frase de Engels sobre o período de
transição do feudalismo ao capitalismo tornou-se, porém, objeto de
grande debate ao afirmar que: “há períodos em que as lutas de classes se
equilibram de tal modo que o Poder do Estado, como mediador aparente,
adquire certa independência momentânea em face das classes. Nesta
situação, achava-se a monarquia absoluta dos séculos XVII e XVIII” (p.
162). Naquele que ficou conhecido como “o debate da transição do
feudalismo ao capitalismo”, e que contou com diversos protagonistas
(desde a obra de Christopher Hill, A revolução inglesa,
publicada em 1940, no seu tricentenário, até as contribuições de Maurice
Dobb, Paul Sweezy e outros, nos anos de 1950), estas passagens de
Engels foram objeto de grande discussão. Perry Anderson (1989) considera
que esta, assim como outras passagens de Engels e Marx, revelam uma
noção incorreta da natureza do Estado Absolutista moderno que poderia
ser visto, nessa situação de “equilíbrio”, como já sendo um Estado
Burguês, o que para Anderson é um contrasenso, pois tais estados não
seriam mais do que uma “nova carapaça política de uma nobreza
atemorizada”, que só foi derrubada efetivamente do poder com as
revoluções burguesas na Inglaterra no século XVII e na França no XVIII.
Essa análise de Anderson foi parte do que ele próprio chamou de
“consenso de uma geração de historiadores marxistas” e foi resumida,
entre outros, também por Christopher Hill.
Outra passagem de Engels, na mesma página, refere-se ao fenômeno do bonapartismo ou bismarckismo
também como uma forma de composição de frações de classe no seio do
Estado: “de igual maneira, o bonapartismo do primeiro império francês, e
principalmente do segundo, que jogava com o proletariado contra a
burguesia e com esta contra aqueles. O mais recente caso dessa espécie,
em que opressores e oprimidos aparecem igualmente ridículos, é o do novo
imperio alemão da nação bismarckiana; aqui capitalistas e trabalhadores
são postos na balança uns contra os outros e são igualmente ludibriados
para proveito exlusivo dos junkers [nobreza latifundiária]
prussianos”, o que mostra que os Estados não são simples reflexos
mecânicos e automáticos das classes nem são “cascas vazias” a serem
preenchidas por diferentes classes e suas frações. O Estado estabelece
sua dominação por meios de pura coerção, mas também necessita do
consentimento, o que exige a construção do que Antonio Gramsci veio a
chamar de “hegemonia”, o que pressupõe que as classes oprimidas são
manipuladas e levadas a acreditarem que a fração hegemônica da classe
dominante representa um suposto interesse geral da sociedade.
Os regimes políticos na época de Engels
não apenas ainda reuniam monarquias autocráticas como, mesmo nas
“repúblicas democráticas”, ainda tinham inúmeros mecanismos de restrição
às liberdades e aos direitos políticos, concedidos ainda de forma
censitária (de acordo com a propriedade), além de, obviamente,
restringirem totalmente as mulheres (não havia sequer voto feminino,
conquista do século XX). Por outro lado, em muitos países nem sequer
havia eleições ou parlamentos (na Rússia, p. ex.), a terra ainda estava
sujeita a direitos de propriedade de origem feudal e as nacionalidades
oprimidas não tinham direitos de expressão. Por isso, Engels considera
que, dentro do capitalismo, a “república democrática” é a “mais elevada
das formas de Estado, e que, em nossas atuais condições sociais, vai
aparecendo como uma necessidade cada vez mais ineludível, e é a única
forma de Estado sob a qual pode ser travada a última e definitiva
batalha entre o proletariado e a burguesia” (p.162). É através do
sufrágio universal que a burguesia melhor pode dominar, realizando a
“aliança do governo com a Bolsa”, mas através dele se demonstra um
“índice de amadurecimento da classe operária”. E Engels, acrescenta que
“no Estado atual não pode, nem poderá jamais ir além disso; mas é
suficiente. No dia em que o termômetro do sufrágio universal registrar
para os trabalhadores o ponto de ebulição, eles saberão – tanto quanto
os capitalistas – o que lhes cabe fazer”.
Lênin, em 1917, em O Estado e a revolução,
desenvolveu as idéias de Engels sobre o Estado, afirmando que: “nós
somos pela república democrática enquanto melhor forma de Estado para o
proletariado no regime capitalista; mas não temos o direito de esquecer
que a escravidão assalariada é o quinhão do povo, mesmo na mais
democrática república burguesa. Portanto, todo Estado é um ´poder
especial de repressão´ dirigido contra a classe oprimida” (p.38). Mais à
frente, escreve que “desenvolver a democracia até o fim; procurar as
formas desse desenvolvimento, submetê-lo à prova da prática, etc., nisto
consiste uma das tarefas essenciais da luta pela revolução social”
(p.101). Esse desenvolvimento da democracia “até o fim” significa que,
na perspectiva do socialismo, após a fase transicional, todos os tipos
de Estado e todos os regimes de governo (inclusive os das repúblicas
democráticas burguesas) deixarão de existir, pois deixará de existir a
coerção social e, portanto, a necessidade de um aparelho militar e
burocrático externo à própria comunidade. Para se chegar ao comunismo,
será indispensável, portanto, a extinção do Estado. Como escreveu
Engels: “no dia em que for possível falar de liberdade, o Estado deixa
de existir como tal” e propõe, consequentemente, que, nestas
circunstâncias, se substitua a palavra Estado pela palavra “comunidade”
(Apud Lênin, p.87).
Como promover a realização de um
programa democrático radical, que inclua as questões sociais, políticas e
nacionais, tais como a reforma agrária, as liberdades públicas, a
autonomia das nacionalidades a Assembléia Constituinte, entre outras,
sem fazer delas um fim em si, mas buscando por meio delas o
aprofundamento da luta de classes e da consciência organizada do
proletariado enquanto classe, foi, talvez, o maior desafio teórico e da
tática revolucionária no século XX, em que os marxistas estiveram sempre
diante do duplo perigo da capitulação à democracia burguesa, como
ocorreu com a maioria da social-democracia, ou do ultra-esquerdismo, que
Lênin denominou de “cretinismo anti-parlamentar”, típico de anarquistas
ou de correntes sectárias como a do italiano Bordiga, na década de
1920, por exemplo.
Numa época de retrocesso do movimento
dos trabalhadores, como a que Engels vivia (após a derrota da Comuna de
Paris, em 1871, apenas em 1905 ocorreu uma nova revolução na Europa), os
processos eleitorais eram considerados por ele como importantes
trincheiras para o proletariado, mas nos momentos de aumento da luta de
classes, para a qual as eleições são um termômetro, os trabalhadores
precisariam estar preparados para conduzir um processo revolucionário,
pois as classes capitalistas saberão perfeitamente que chegou a hora de
conduzir a contra-revolução.
Essa passagem foi apropriada pela
social-democracia alemã, especialmente por Karl Kautsky, como um
argumento para a teoria do reformismo clássico, de que a inevitabilidade
histórica do socialismo era governada por uma causalidade objetiva, o
que levava ao abandono da noção de que a atividade auto-consciente e
voluntarista do proletariado assume o papel decisivo na transformação
revolucionária e à aceitação de uma ação insurreicional do proletariado
apenas na hipótese da defesa de uma maioria parlamentar socialista
ameaçada pela reação burguesa. Engels, ao contrário da visão
social-democrata determinista, nunca abandonou a defesa da ação
revolucionária como forma indispensável para a superação da ordem
capitalista, tendo inclusive participado pessoalmente, de revólver à
mão, nas barricadas da revolução de 1848, na Alemanha. O evolucionismo
que, posteriormente, marcou a evolução da corrente social-democrata no
seio da II Internacional, não pode ser atribuído à obra e à atividade
prática de Engels. Em sua concepção teórica do Estado e em sua prática
de militante revolucionário ele nunca transigiu com a denúncia integral
do caráter burguês das repúblicas democráticas de sua época e sempre
vislumbrou nos moldes da democracia comunitária direta em suas
manifestações históricas, uma inspiração para uma nova sociedade
socialista em que, após a revolução proletária, o Estado tenderia a
desaparecer. Sem partilhar das ilusões românticas dos populistas russos
com a propriedade comunal da terra viu nela, assim como Marx, um
magnífico ponto de partida para a construção do socialismo desde que
este estivesse enraizado na classe operária de um país desenvolvido.
A Origem da família, da propriedade privada e do Estado
é um livro rico de idéias teóricas e de consequências políticas
práticas. Não se trata de uma obra meramente acadêmica, em que a teoria
ocupa um lugar confortável de pretensa reflexão científica pura e
neutra, ao contrário, faz parte da concepção de que a ciência e a
filosofia devem servir à ação humana, pois a humanidade “se faz a si
mesma”[7] e, portanto, não há na história nenhum determinismo objetivo independente da ação dos homens e das classes em luta.
* Artigo originalmente publicado na Revista Marxismo Vivo, nº 15, ano 2007, pg. 97-108
Bibliografia:
ANDERSON, Perry, Linhagens do Estado Absolutista, 2ª ed., São Paulo, Brasiliense, 1989.
CHILDE, V. Gordon, A evolução cultural do homem, Rio de Janeiro, Zahar, 1966.
————– O que aconteceu na História, 2ª ed., Rio de Janeiro, Zahar, 1966.
DURAND, Pierre, La vida amorosa de Marx, Buenos Aires, Editorial Liner, 1970.
ENGEL, Magali, Meretrizes e doutores, Saber médico e prostituição no Rio de Janeiro (1840-1890), São Paulo, Brasiliense, 1989.
FLANDRIN, Jean-Louis, O sexo e o Ocidente, São Paulo, Brasiliense, 1988.
HARMAN, Chris, Engels and the origins of human society, International Socialism Journal, 65, Inverno de 1994.
HOBSBAWM, Eric J., Revolução e sexo, Revolucionários, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 2003.
LÊNIN, V. I., O Estado e a Revolução, Niterói, Diálogo Livraria e Editora, s/d/e.
MARX, Karl, Formações econômicas pré-capitalistas, com prefácio de Eric Hobsbawm, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1975.
MITCHELL, Juliet, La condición de la mujer, Barcelona, Editorial Anagrama, 1977.
NYE, Andrea, Teorias Feministas e as Filosofias do Homem, Rio de Janeiro, Record/Rosa dos Tempos, 1995.
PATEMAN, Carole, O contrato sexual, Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1993.
REES, Jonh, Engel´s marxism, International Socialism 2:65, Inverno 1994.
SAHLINS, Marshall, As sociedades tribais, Rio de Janeiro, Zahar, 1970.
SMITH, Sharon, Engels and the origin of women´s oppression, International Socialist Review, 2, 1997.
SOFRI, Gianni, Il modo di produzione asiatico. Storia di una controversia marxista, Turim, Einaudi, 1969.
WOLF, Eric R., Os moinhos da desigualdade: uma abordagem marxiana (1981),
in Antropologia e Poder, org. Bela Feldman-Bianco e Gustavo Lins
Ribeiro, Brasília/Campinas/São Paulo, Ed. UnB/Imprensa Oficial SP/Ed.
Unicamp, 2003.
[1] Lewis Henry Morgan (1818-1881) defendeu as terras indígenas e foi adotado numa gens iroquesa em 1847. Em 1851 publicou A Liga dos Iroqueses, o primeiro relatório científico da vida tribal a partir de uma vivência direta, em 1869, publicou Sistema de consanguinidade e afinidade na família humana e, em 1877, o mais importante de todos e fonte teórica de Engels: A Sociedade Primitiva (Ancient Society, or Researches in the Lives of Human Progress from Savagery through Barbarism, to Civilization). Também escreveu sobre arquitetura indígena e sobre a vida dos castores.
[2]
Ele próprio, na verdade, encarnou na sua vida privada suas idéias, pois
nunca se casou nem teve filhos e manteve relações amorosas “livres”
(fora do casamento). Sua amizade foi tão grande que Engels assumiu a
paternidade do filho ilegítimo que Marx teve com a empregada da família e
que foi entregue para adoção à uma família inglesa, La vida amorosa de Marx, Pierre Durand, p.60.
[3] Antes mesmo de Engels, Auguste Bebel foi o autor do clássico A mulher e o socialismo (1879); K. Kautsky publicou A reprodução e o desenvolvimento na natureza e na sociedade (1910) e Origem do matrimônio e da família
(…), em que afirmava que o matriarcado e o patriarcado não eram
consecutivos, mas de desenvolvimento paralelo; e Paul Lafargue, em 1895,
publicou Origem e desenvolvimento da propriedade, dedicado à Engels.
[4]
Juliet Mitchell (1977), por exemplo, vai investigar na obra de Freud
fundamentos psicológicos para a formação da personalidade masculina.
[5] A obra de Marx que mais trata dele são as Formações Econômicas Pré-Capitalistas, parte dos Gundrisse,
publicados a primeira apenas entre 1939-1941, na Rússia e, em 1953 na
Alemanha. A primeira tradução ao inglês, de 1964 foi acompanhada de um
importante prefácio de Eric Hobsbawm.
[6]
O debate sobre essa questão é muito amplo e não seria possível
mencionar aqui nem um resumo de sua abrangência e de suas tendências
principais, mas não podemos deixar de mencionar o livro de Kurt
Wittfogel, O Despotismo Oriental (1957), em que esse
ex-comunista alemão radicado nos EUA usou um erudito estudo do conceito
de modo de produção asiático para identificá-lo também com uma natureza
burocrática e totalitária da URSS e China. Sua obsessão anti-comunista
não impediu que sua tese tivesse uma grande influência devido à erudição
de sua investigação. Mais recentemente, o antropólogo Eric Wolf resumiu
os diversos modos de produção em três tipos básicos: o de organização
pelo parentesco (que seria o comunalismo primitivo); o “tributário” (com
diversas variantes que incluiriam o asiático, o feudal e o africano) e o
capitalista.
[7] Título de um dos mais conhecidos livros de Gordon Childe, Man makes himself, traduzido em português como A Evolução Cultural do Homem (1966).
FONTE: Blog Convergência