“No limiar da nova era, o Brasil marcha para o socialismo ou para a fragmentação interna. [...] O que a Constituição negou, o povo realizará. [...] E essa consciência, nascida do trabalho produtivo e da luta política dos trabalhadores e dos excluídos, não depende da ‘educação para um mundo em mudança’, mas sim da educação como meio de autoemancipação coletiva dos oprimidos e da conquista do poder pelos trabalhadores”Florestan Fernandes
Pelo Levante Popular da Juventude
A conquista dos 50% das cotas e a adoção do SISU (Sistema de Seleção Unificada) no lugar do vestibular na Universidade Federal de Santa Maria é, provavelmente, uma das mais importantes vitórias no que diz respeito ao direito ao acesso à Universidade no Brasil.
Há séculos, as elites e o pensamento conservador consideram o acesso à universidade e, consequentemente, a própria universidade, uma exclusividade, um verdadeiro feudo daqueles (as) que, por “seu mérito”, conseguem ter bons resultados nas provas do vestibular. As provas em nada refletem as condições do ensino atual e muito menos conseguem avaliar as capacidades de reflexão da maioria dos que tentam acessá-la. Na realidade, serve apenas como um mecanismo que perpetua a exclusão de grande parte da juventude brasileira do ensino superior e, dessa forma, garante a reprodução da formação da classe dominante que controla o país.
A partir da implantação do ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio) esse quadro esta se alterando. Apesar dos limites que um governo de coalisão de classes como o atual tem, e que não permitem uma verdadeira reforma do ensino que possibilite o total acesso de todos e todas aos vários níveis da educação, a implantação de políticas como o ENEM e o SISU mostram o quanto a juventude anseia por mais educação. Só esse ano foram mais de 9,5 milhões de inscritos no Enem disputando em torno de 800 mil vagas, ou seja, assim que a juventude brasileira percebeu que algumas brechas no muro que separa universidade e sociedade foram abertas não perdeu tempo em discussões e está cada vez mais a demandar seu direito ao ensino superior público. O que ocorreu em Santa Maria, através da luta dos estudantes, demonstra que mesmo medidas limitadas do governo podem servir de alavanca para conquistas muitos maiores.
Essa vitória atinge em cheio o coração da ideologia burguesa que garantia a exclusividade das vagas para a formação de seus quadros e líderes. Para se ter uma ideia do quanto uma vitória desse porte é “perigosa” para as elites basta ver o breve levantamento abaixo de onde se formaram os principais representantes da elite brasileira:
Marcell Hermann Telles: Com fortuna estimada em 19,50 bilhões, segundo a revista Forbes é quarto homem mais rico do Brasil, graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro;
José Roberto Marinho: Magnata das Telecomunicações, um dos donos da rede Globo, com fortuna estimada em 17,10 bilhões, segunda a revista Forbes é o sétimo homem mais rico do Brasil,graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro;
Maria Alice Setúbal: Uma das donas do Itaú, apoiadora da vice-candidata Marina Silva, graduada pela Universidade de São Paulo;
Roberto Egydio Setúbal: Um dos donos do Itaú, graduado pela Universidade de São Paulo;
Guilherme Peirão Leal: Um dos donos da Natura, filiado ao PV, graduado pela Universidade de São Paulo;
Nelson Sirotsky: Um dos donos da RBS, principal partido da direita gaúcha, graduado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul;
Willian Bonner: Âncora do Jornal Nacional, graduado pela Universidade de São Paulo;
Lasier Martins: Ex-comentarista e candidato da RBS, filiado ao PDT, graduado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul;
Roseana Sarney: Governadora do Maranhão, filiada ao PMDB, Universidade de Brasilia;
Ronaldo Ramos Caiado: Deputado Ruralista, filiado ao DEM, graduado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro;
Onyx Lorenzoni: Deputado Ruralista, filiado do DEM, graduado pela Universidade Federal de Santa Maria.
Alicerçados principalmente no ódio racial e de classe, a mídia e os conservadores se uniram em um pacto de desconstrução do Enem e do sistema de cotas para a juventude empobrecida do país. Sua tática é criar uma falsa ideia de que estes mais pobres estão na universidade não por terem capacidade e inteligência, mas porque são privilegiados pelo governo. Assim, cresce o rancor da classe média, de setores da pequena burguesia contra tais medidas. As justificativas vão desde as conservadoras ideias meritocráticas até uma suposta inferioridade intelectual dos que ingressam por esse sistema, algo que já caiu por terra com a comprovação das excelentes médias dos que entraram por cotas ou Enem.
O Enem mexeu com os interesses empresariais da indústria do vestibular, responsável por realizar a seleção de classe que acessa a universidade. O SISU possibilitou a ampliação das possibilidades de acesso as Universidades. Não estamos dizendo aqui que não há falhas e um enorme caminho a ser percorrido para que de fato tenhamos um ensino superior de qualidade, público e realmente acessível para todos e todas sem nenhum tipo de barreiras. O que estamos dizendo é que é possível avançar e ultrapassar os limites das políticas do governo com luta e organização, como foi em Santa Maria.
A universidade pública não deve servir para reproduzir a classe dominante, deve servir para auto emancipação da classe trabalhadora, como disse Florestan. O Enem, o SISU e o sistema de cotas esta mexendo com a estrutura de formação das elites, pois parcelas da juventude pobre esta entrando para as universidades. Ainda vai haver muita luta e choradeira por parte da elite e da classe média brasileira acostumada a manter seus privilégios, o caminho é longo para romper com o cerco do conservadorismo em nossas universidades, mas a juventude organizada está provando que com sua luta que a conquista de direitos é uma realidade.
FONTE: Brasil de Fato
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