Feito por autores anônimos, provavelmente a mando de Maurício de Nassau, guia estava esquecido em arquivo
RICARDO BONALUME NETO
DE SÃO PAULO
Um raríssimo documento histórico, inédito por séculos, finalmente foi publicado: um detalhado atlas do litoral brasileiro, com ênfase no Nordeste, produzido durante a ocupação holandesa da região no século 17.
O manuscrito, conhecido pelo código "4. VEL. Y" e intitulado "A Breve Descrição da Costa do Brasil e mais Alguns Lugares" estava praticamente escondido no Arquivo Nacional holandês em Haia.
Ao pesquisarem material do período da ocupação holandesa, os editores Cristina Ferrão e José Paulo Monteiro Soares toparam com o códice ilustrado em 2007.
O manuscrito sai na íntegra, em edição bilíngue inglês-português. São 45 mapas manuscritos e aquarelados.
Sucesso filológico
Foi preciso um trabalho de detetive filológico para decifrar a toponímia (os nomes dos lugares). A palavra "sucesso", do nome da Vila do Bom Sucesso do Porto Calvo, é grafada no atlas de seis maneiras diferentes: Cucsesso, Sucsesse, Sucxese, Sucxses, Sukus e Suxsis.
Além de reproduções fac-similares das cartas originais, a edição inclui uma versão ao lado com os nomes traduzidos, o que vai facilitar muito a utilização do atlas por outros pesquisadores.
O trabalho de pesquisa envolvido na edição do atlas teve como resultado a provável identificação dos seus principais autores e a data de sua composição. A obra teve autoria coletiva, deve ter sido composta em torno de 1644 e coordenada por João Cornelisz Lichthart e Georg Marcgave, a mando do governador do Brasil Holandês, o nobre João Maurício de Nassau.
Lichthart era um importante almirante, que fez um raide desastroso para os luso-brasileiros na baía de Todos os Santos em 1641. Marcgrave era um cartógrafo e naturalista alemão, membro do grupo de artistas e cientistas que Nassau trouxe à colônia e autor de um clássico e pioneiro livro descrevendo a natureza brasileira, "Historia Naturalis Brasiliae".
NOS MARES
A pujança econômica da Holanda dependia do seu comércio, e este naturalmente exigia um forte poder naval. O poderio holandês era baseado em suas naus de comércio e de guerra, e elas precisavam de informações claras para serem eficazes.
"Sem esse conhecimento, um marinheiro não vai longe", diz um pesquisador holandês envolvido na edição do atlas, Henk den Heijer.
Além de detalhes de hidrografia, o atlas inclui textos descrevendo os habitantes, a fauna e flora, as povoações. Alguns são divertidos, como a descrição de uma paca, "animal quadrúpede com a cabeça gorda de uma lebre".
O autor continua: "O pênis ereto do macho tem duas sovelas na frente, de maneira que durante a cópula a fêmea produz estridentes gritos, como os gatos da Holanda no mês de março".
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ATLAS DA COSTA DO BRASIL
ORGANIZADORES Cristina Ferrão e José Paulo Monteiro Soares
EDITORA Kapa Editorial
QUANTO R$ 120
FONTE: Folha de São Paulo, 05 de janeiro de 2012.
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