Filha de Carlos Prestes e Olga Benário fala sobre a biografia do pai, feita durante 30 anos
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"É um trabalho de mais de 30 anos"
Por Roberto Arrais
Anita Leocádia Prestes nasceu em 27 de novembro de 1936, na prisão de mulheres de Barnimstrasse, em Berlim, na Alemanha nazista, filha dos revolucionários comunistas Luiz Carlos Prestes, brasileiro, e Olga Benário Prestes, alemã. Anita é graduada em Química Industrial pela UFRJ, doutora em Economia e Filosofia na URSS. Com doutorado também em História pela UFF, ela é professora do Programa de Pós-Graduação em História Comparada da instituição. Presidente do Instituto Luiz Carlos Prestes, ela passou mais de 30 anos pesquisando, entrevistando e escrevendo sobre a vida do líder comunista. No final do ano passado, o resultado desse empenho foi apresentado aos leitores, a biografia Luiz Carlos Prestes - Um comunista brasileiro (editora Boitempo). Nesta entrevista à Continente, ela destacou o cuidado com os fatos e suas referências, falou com admiração sobre o pai, que foi uma das mais destacadas figuras do mundo político brasileiro no século XX.
CONTINENTE: Como a senhora construiu este livro e como isso ocorreu?
ANITA PRESTES: Este livro é uma biografia política de Luiz Carlos Prestes, que visa exatamente retratar os fatos da forma mais comprometida possível com com a verdade, seguindo a orientação do grande historiador marxista inglês Eric Hobsbawm, que dizia que o historiador tem compromisso com a evidência; então, pontuei-me muito por essa visão.
É um trabalho que levou mais de 30 anos para ser realizado. Comecei a trabalhar na temática da participação política de Luiz Carlos Prestes na história do século XX, lá no início dos anos 1980, quando meu pai estava ainda presente, vivo. A vida dele foi muito longa, 92 anos, dos quais 70 de intensidade política no Brasil e no exterior. Então, como num trabalho de historiador era impossível abordar estes 70 anos de uma vez, fui por partes. No início, não tinha nem clareza, certeza de que seria possível elaborar uma biografia, porque realmente era uma tarefa de longo prazo, não sabia o tempo que ia levar, se eu teria vida que me permitisse chegar lá. Comecei pela Coluna Prestes, até porque meu pai tinha uma memória privilegiada, principalmente sobre os acontecimentos da Coluna. Gravamos depoimentos com ele, pesquisei vários anos em diversos arquivos no Brasil, nos depoimentos dele e dos participantes da Coluna, que ainda havia nos anos 1980.
Anos atrás, fui a Moscou para pesquisar nos arquivos da Internacional Comunista, reuni todo este material, refazendo muita coisa, fazendo a pesquisa. Pesquisei períodos em que havia lacunas e cheguei, afinal, a conseguir escrever e publicar esta biografia, para a qual a editora Boitempo fez uma revisão muito cuidadosa. Trabalhamos vários meses com revisores para chegar à publicação deste livro, enriquecido com uma grande quantidade de fotos, mais de 100, com reprodução de documentos inéditos, fotos inéditas, enfim, foi um trabalho cuidadoso, feito pela Ivana Jinkings, a presidente desta editora, e de toda equipe que trabalhou no projeto. Realmente, ficou uma edição primorosa, que todas as pessoas estão achando bonita, bem-feita. A minha preocupação foi deixar uma obra comprometida com a evidência, com a verdade sobre o que foi a vida de Luiz Carlos Prestes para as gerações atuais e futuras.
CONTINENTE: A Coluna Prestes termina sua trajetória invicta, não foi derrotada. Mas, depois desse período, Prestes foi chamado pelos defensores da Revolução de 30, inclusive por Getúlio Vargas, para aderir a esse movimento armado. Como se deu o posicionamento dele diante da solicitação desse apoio à adesão ao movimento de 30?
ANITA PRESTES: O ano de 1930 foi muito importante na vida de Prestes e na história do Brasil. Porque, depois da Coluna, que foi encerrada em 1927, como você disse, invicta - quer dizer, embora tenha enfrentado 53 combates com as forças governistas, nunca foi derrotada. E derrotou 18 generais do exército brasileiro, percorreu 25 mil quilômetros pelo Brasil, 13 estados; foi uma epopeia. Ele compreendeu que não havia forças sociais e políticas, que o Partido Comunista era clandestino, pequeno, sem condições de influir nos acontecimentos políticos. Se ele aceitasse ir para o poder, como os camaradas tenentes queriam, ele viraria uma marionete nas mãos daquelas oligarquias agrárias que fizeram o movimento de 30. Então, ele recusa. Este é um momento importante na vida dele e na história do Brasil, porque pela primeira vez uma liderança, a maior liderança política do Brasil na época, rompe com as classes dominantes, se recusa a ser uma liderança a serviço daquelas oligarquias agrárias que fizeram o movimento de 30, e passa por cima da trincheira da luta de classes e vai se colocar ao lado dos trabalhadores, dos explorados, dos oprimidos e vai sempre, a partir daí, de 1930 até morrer, em 1990. Ou seja, 70 anos lutando contra a burguesia, contra as classes dominantes, solidário e participando da luta dos trabalhadores, dos revolucionários brasileiros.
(Leia a matéria na íntegra na edição 186 da Revista Continente)
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