Por Atilio A. Boron
Dias atrás, cometi um erro imperdoável: criticar veementemente a Secretária de Estado Hillary Clinton, quando diante do quinto assassinato de um cientista iraniano se limitou a encolher os ombros e dizer que aquilo era resultado das provocações de Teerã ao se negar a suspender seu programa nuclear. Um programa, diga-se de passagem, que começou na época do Xá, e que foi retomado em meados dos anos 80, sem que até agora, mais de 30 anos depois, aparecesse o tão temido arsenal nuclear iraniano.
Disse, então, e repito agora, que Clinton é o “elo perdido entre as aves de rapina e a espécie humana”, recordando sua repugnante gargalhada quando a comunicaram do linchamento de Kadafi. Porém, meu erro foi postar essa opinião no Facebook: poucas horas depois, tive o acesso a minha conta proibido e, dessa forma, também bloqueado o contato com mais de 7 mil seguidores. O que veio depois é uma história realmente kafkiana, ainda inconclusa, para tratar de recuperar o acesso a minha conta.
Toda sorte de trâmites e obstáculos foram postos em prática e ainda hoje, noite de 19 de janeiro, três dias depois do incidente, não pude voltar a utilizar minha conta. Como se não bastasse, não pude mais retomar contato com pessoa alguma no Facebook, e todas as perguntas que como vítima de tal arbitrariedade poderia fazer eram estereotipadas, devendo escolher um “menu” absurdo só para obter, de um robô informante, respostas igualmente estúpidas e estereotipadas. Em todo caso, algo era razoavelmente claro: nenhuma respondia a pergunta crucial, que era, e é, por que me bloquearam o acesso a minha conta no Facebook?
A conclusão disso tudo é algo que já sabia e venho dizendo há muitos anos, em contraposição a sociólogos e analistas “da moda” que afirmam besteiras tais como “a web é o universo da liberdade, não há centro, não existe controle, é democracia em grau superlativo”. Esses teóricos da resignação e do desalento, que com seus ditames fortalecem a crença na eternidade capitalista, ignoram que a web está super-controlada – não que estará em breve, mas já está, de fato – e que as infames iniciativas legislativas estadunidenses como o SOPA e o PIPA não são nada além de tentativas de legalizar o que já estão fazendo, e essa é uma das novas tarefas a cargo da CIA e do FBI, espiando próprios e estranhos, dentro e fora dos Estados Unidos.
Como também venho dizendo há anos, não há nada mais perigoso do que um império em decadência. A história ensina que se tornam mais brutais, imorais, inescrupulosos. Agora, diante do surgimento de uma perigosa onda mundial anticapitalista na Europa e até nos EUA (com o movimento Ocuppy Wall Street), que se agrega ao que vem agitando a América Latina há uma década, os drones (caças não tripulados) e assassinatos seletivos de líderes, práticas a que apelava o império, são insuficientes.
Para eles, é preciso cortar a comunicação “por baixo” e “entre os de baixo”, porque sabem muito bem que um pré-requisito para a organização e a resistência, e a ofensiva, contra a burguesia imperial e seus sequazes da periferia é exatamente essa possibilidade de estabelecer comunicações e intercambiar informações entre os oprimidos e as vítimas do sistema. Sabem muito bem que tal coisa é essencial para frustrar essa onda insurgente, muito mais grave e de maiores repercussões do que as que um dia teve o maio francês.
Por isso tudo, estão apertando os torniquetes. Por isso devemos redobrar a luta para democratizar não só o Estado e as empresas, mas também as comunicações, a imprensa e, mais que tudo, a web. Não é a troco de nada que um dos generais do exército estadunidense declarou em uma audiência no Congresso de seu país que “hoje a luta anti-subversiva se trava nos meios de comunicação”, um dos quais, talvez o mais importante, a internet. Daí que vêm tantos controles e tanto empenho em travar a luta contra os “terroristas” do ciberespaço.
Atilio Borón é doutor em Ciência Política pela Harvard University, professor titular de Filosofia Política da Universidade de Buenos Aires e ex-secretário-executivo do Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (CLACSO).
Tradução: Gabriel Brito, jornalista do Correio da Cidadania
FONTE: Correio da Cidadania
O texto em espanhol encontra-se em Atilio Boron
Nenhum comentário:
Postar um comentário