domingo, 13 de novembro de 2011

“Informar-se sem esforço é ilusão”


Obra de Ignacio Ramonet, escrita em 1999, sobre revolução midiática, torna-se cada vez mais atual e necessária


João Novaes/Redação do Opera Mundi


 
Não foram poucas as vezes em que o jornalista e ativista espanhol Ignacio Ramonet foi menosprezado e criticado por seus colegas na mídia. Enquanto dirigiu por décadas o Le Monde Diplomatique, encabeçou uma série de lutas – a mais famosa, pela criação da Taxa Tobin, imposto sobre as transações financeiras, que inspirou a criação do grupo anticapitalista ATTAC.



Hoje, esta é uma hipótese que tem sido cogitada pelos principais líderes mundiais. Ao contrário de seguir a corrente e exaltar a explosão do neoliberalismo nos anos 1990, alertava para a insustentabilidade dessa ideologia econômica. Sempre exaltou os pontos positivos da mundialização, mas também apontava para suas conseqüências danosas, especialmente as ocorridas na revolução da comunicação. No século passado, já teorizava sobre a crise do jornalismo, do excesso de informações com a chegada da internet ou da interferência da indústria do entretenimento na informação.


É em meio a um cenário de fechamento de jornais, de descrédito da mídia pelo público, e aos recentes escândalos de grampos envolvendo jornais britânicos pertencentes ao grupo News Corporation, de Rupert Murdoch, que uma obra de Ramonet nos leva a um pensamento extremamente crítico em relação à imprensa. A particularidade de A Tirania da Comunicação (Editora Vozes, 138 páginas), porém, é que esta obra foi escrita em 1999. Em outro século, outro mundo, pré-Onze de Setembro. E, salvo as referências temporais que o autor utiliza, suas reflexões permanecem atuais. Mais parece que foi escrito nesse ano.

Ramonet esteve no Brasil na semana passada,onde participou de encontros e seminários a respeito da nova era da comunicação. Era como se estivesse fazendo um resumo do livro, acrescentando capítulos novos, como a influência das novas mídias sociais, por exemplo.



É, no entanto, um livro apocalíptico para qualquer estudante que queira ingressar em um curso de jornalismo – tiraria imediatamente o encanto que faz com que a profissão de repórter ainda atraia tantos jovens. A crise existencial pela qual passava (e passa) o jornalista contemporâneo, é um dos principais temas mais abordados.



O jornalista, outrora personagem heroificado nas histórias de ficção (como Super-Homem, Homem-Aranha ou Tintin), está cada vez mais desprestigiado. Além de ter se tornado mão-de-obra barata para um mercado cada vez mais concorrido, essa nova fase da comunicação, on-line e ao vivo, não procura, como observa o autor, descrever e contextualizar um fato – apenas mostra a História em curso, faz assistir ao acontecimento, como um espetáculo descritivo. Com essa nova noção da informação, o jornalista sobra.


Hoje e na época, como mostra o autor, “o melhor modo para se informar seria auto-informar-se”. Pois o que também mudou foi a “sensação da informação”. As pessoas acreditam que, quanto mais informações recebem, mais bem informada ficarão – o que Ramonet adverte ser um erro fatal. Pois notícias em excesso produzem tanto o efeito da superinformação quanto da desinformação – não permite que o jornalista se aprofunde muito em uma matéria nem que o consumidor da notícia consiga dar muita atenção a um único fato. Para Ramonet, informar-se com esforço (refletindo uma matéria, a questionando, procurando compreender o outro lado) é de fato cansativo, mas esse é o preço a se pagar para participar de uma vida democrática inteligente.



O autor também não poupa críticas às grandes corporações que na época já começavam a monopolizar as mídias – e Murdoch recebeu um belo destaque. Elas fizeram com que a mídia deixasse de ser o “quarto poder”, na ordem de equilíbrio adaptada de Montesquieu – hoje, ela é o segundo poder, a frente do político e atrás apenas do econômico, este cada vez mais dominado pelo setor financeiro.



Esses grandes grupos exercem um novo regime sobre a comunicação, o qual o ativista classifica como tirânico, e viabilizam uma nova forma de censura. Diferente das ditaduras, ela é ainda mais perniciosa nos regimes ditos “democráticos”. Como hoje há informação em abundância, a mensagem pode ser mais bem disfarçada em meio à sociedade, certas partes podem ser ignoradas sem que necessariamente se note sua falta. Tudo em nome dos interesses dos grandes grupos.



Alguma semelhança com o presente?

 
 

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