sexta-feira, 17 de abril de 2020

Maria Aragão, médica comunista completaria 110 anos.

Por  Sergio Caldieri*

Maria Aragão em 1960. Foto: livro Maria por Maria (gov. Maranhão)

A ativista Maria Aragão, médica comunista do Maranhão completaria 110 anos no último 10 de fevereiro. Nasceu em 1910, numa família de sete filhos, no Engenho Central, em Pindaré-Mirim, uma área de grandes conflitos por terras no Maranhão. Muito jovem mudou-se para ao Rio de Janeiro, para estudar Medicina na antiga Universidade do Brasil, em 1934. Durante o curso para elite branca e homens, ela sustentava-se dando aulas particulares de português aos motoristas e operários.

Tornou-se admiradora do líder comunista Luiz Carlos Prestes quando foi assistir o famoso comício do então “Cavaleiro da Esperança”, no estádio do Vasco da Gama, em 23 de maio de 1945. Assim como Prestes, ela se desiludiu com a linha político ideológica tomada pelo “Partidão”. Em 1981, Maria Aragão filiou-se ao PDT, criado por Leonel Brizola, que tinha, entre as lideranças negras, o jornalista, escritor e ex-senador Abdias do Nascimento, Edialeda Salgado, Caó de Oliveira, José Miguel, Joel Rufino dos Santos, Lélia Gonzalez e tantos outros. 

Maria Aragão poderia fazer carreira de medicina no Rio de Janeiro, mas preferiu dedicar seus conhecimentos à população abandonada de seu estado. Depois da sua formatura em 12 de novembro de 1942, voltou para São Luiz e, já filiada ao PCB – o “Partidão” –, dividia seu tempo entre o trabalho na pediatria de hospitais públicos e a militância política, enfrentando tanto o poder dos coronéis quanto pistoleiros a serviço das elites locais.

Maria Aragão aos 81 anos se mantinha fiel à própria ideologia e dedicada à saúde da população mais humilde de seu estado majoritariamente negro, onde predominavam as religiosidades de matriz africana como o Tambor de Mina, o Vodum, a Umbanda e manifestações populares como o Tambor de Crioula e o Bumba Meu Boi, entre outros. Maria manteve as portas abertas da sua casa com uma mesa farta de comidas para o povo faminto de São Luiz do Maranhão.

A classe dominante e o padre de uma Igreja espalharam a palavra “comunista”, que a médica, volta e meia, era chamada de prostituta e de besta-fera. Chegou a ser apedrejada na cidade de Codó. 

Iniciou como médica pediatra e mudou sua especialização para a ginecologia permitiu-lhe pôr em prática uma bandeira defendida por ela dentro do partido político: a valorização da saúde da mulher, principalmente as prostitutas. Ela atendia de graça, ia na casa dos pacientes e sem dinheiro para o bonde. Andava muito à pé nos bairros pobres de Sao Luiz.

Ela dirigiu o jornal Tribuna do Povo. Enfrentou as oligarquias, foi presa  uma dezena vezes, torturada com agressões físicas e morais, perseguida tanto pela ditadura de Vargas. Em 1951, quando foi presa deu uma 'joelhada' nos culhões do policial. Ficou presa por 80 dias e soltaram quando Luiz Carlos Prestes mandou um advogado.

 Depois do golpe militar de 1964, precisou sair do Brasil, e foi viver seu exílio na União Soviética, onde recebeu o Prêmio Lênin da Paz, pelo seu reconhecimento como a maior líder das lutas populares e causas sociais do Maranhão. Maria realizou estudos que a habilitaram à direção partidária do PCB. Fez parte da corrrente 'Prestista" ao lado de Gregório Bezerra.

Segundo Oswaldo Faustino, 'quem estivesse de passagem pela cidade de São Luís, na manhã de 24 de junho de 1991, e assistisse à multidão em cortejo, acompanhando o caixão levado por um caminhão do Corpo de Bombeiros, coberto com as bandeiras do PCB (Partido Comunista Brasileiro), da CUT (Central Única dos Trabalhadores), do PDT (Partido Democrático Trabalhista) e da agremiação carnavalesca Favela do Samba, jamais imaginaria que se tratava do funeral de uma médica negra. Uma passeata de trabalhadores rurais uniu-se ao cortejo que saiu da Assembleia Legislativa do Estado do Maranhão, onde ocorreu o velório. Quem seria, afinal, essa mulher cujo sepultamento no Cemitério do Gavião comoveu uma cidade inteira? Por que enquanto o caixão descia à sepultura se ouviram discursos de políticos, o hino nacional e também o hino da Internacional Socialista?'

Em parceria com a Escola Nacional Florestan Fernandes, a Editora Expressão Popular lançou o documentário “Maria Aragão e a organização popular” – DVD acompanhado de um livro – sobre essa mulher que venceu a fome, a miséria e os preconceitos raciais e políticos. 

No Centro Histórico da capital maranhense, em 2004, foi inaugurado o Memorial Praça Maria Aragão, projetado pelo seu querido amigo Oscar Niemeyer, com o acervo e um busto da maior revolucionária comunista do Maranhão, na Avenida Beira-Mar, às margens do Rio Anil.

Conheci Maria Aragão no aniversário de Luiz Carlos Prestes quando completou 83 anos, em 3 de janeiro de 1981, no Clube Sampaio, no subúrbio carioca. Os fascistas soltaram uma bomba e Maria Aragão fez um inflamado discurso no meio do salão e foi muito aplaudida.

*Sergio Caldieri - Jornalista, escritor e diretor do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Rio de Janeiro-SJPERJ.

FONTE: Gama Livre


Documentário - Maria Aragão e a organização popular

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