domingo, 17 de março de 2013

Entrevista – Anita Prestes: “A esquerda está muito dividida e a direita é forte no Brasil”

Do Blog do Mário Flávio 


De passagem por Caruaru esse fim de semana, Anita Prestes, atendeu aos jornalistas. Ela veio a Capital do Agreste para lançar o livro “Luiz Carlos Prestes: o combate por um partido revolucionário (1958-1990)”. Numa polêmica entrevista concedida a este blogueiro, a filha de Luiz Carlos Prestes e Olga Benário, fez uma análise do cenário político do Brasil. Entre outras situações explicou detalhes do livro, do legado de Prestes, a decepção com os governos Lula e Dilma e os motivos do declínio do PCB no Brasil. Eis a entrevista:


Por qual motivo a senhora decidiu levar adiante o legado do seu pai para todo o Brasil?
Dentro das minhas possibilidades acredito que isso é uma missão importante, já que eu tive essa oportunidade de conviver com meu pai, mão só com ele, mas com outros comunistas, bem como estudar, lá se vão 30 anos que me dedico a estudar essa fase da história da vida de Prestes e do PCB, acho que tenho a obrigação de levar isso para o nosso povo, principalmente aos jovens e estudantes, para contribuir com o resgate do legado de Luiz Carlos Prestes. Enquanto as classes dominantes no Brasil sempre procuraram apagar a sua memória, silenciar e até mesmo caluniar a vida dele, difundindo versões caluniosas e mentirosas da vida dele ou sobre os comunistas, me senti na obrigação de me contrapor a isso e contribuir para que o nosso povo conheça a verdade, a realidade dos acontecimentos.

Tenho a obrigação de levar isso para o nosso povo, principalmente aos jovens e estudantes, para contribuir com o resgate do legado de Luiz Carlos Prestes”


Aqui em Caruaru e no Agreste o PCB teve uma atuação forte, com várias pessoas sendo perseguidas ou presas, como exemplo podemos citar Gregório Bezerra e Manoel Messias. A decisão de lançar o livro primeiro em Caruaru, no estado de Pernambuco, tem alguma relação com esses fatos?
Recebi o convite para vir aqui pelo CREA de Pernambuco, até por um aspecto muito pouco conhecido da vida do meu pai, que é a formação dele de engenheiro, já que ele foi engenheiro militar e trabalhou também na engenharia civil e a partir disso, surgiram outros convites no Nordeste e outras possibilidades de vir a Caruaru para também lançar o livro e ter contato com estudantes e com a população local.
Muito se discute hoje a questão de direita e esquerda no Brasil. Muita gente afirma que não existem mais essas separações. Qual a sua opinião sobre isso?
O mundo mudou, mas não deixou de existir esquerda e direita, claro que mudaram de caráter e as formas de atuação são bem diferentes. Aqueles que pretendem negar a existência dessa polaridade acabam contribuindo para a direita, como estamos vendo no panorama mundial.

Aqueles que pretendem negar a existência da direita e esquerda acabam contribuindo para a direita, como estamos vendo no panorama mundial”

Então quem é a direita no Brasil?
Olhe, hoje não temos ninguém querendo assumir que é de direita no Brasil, esse é um fenômeno em toda América Latina, temos isso na Venezuela, por exemplo, mas a direita está aí. Recentemente trouxeram a tona o debate sobre recriação da Arena, a diferença é que a maioria não tem a coragem de falar em público, como aquela estudante do Rio Grande do Sul.
O que houve com o PCB? As vezes ficamos com a impressão que o partido voltou a clandestinidade.
Houve muita coisa com o PCB, um dos problemas que abordo nesse livro é a Carta aos Comunistas, que foi lançada por Prestes em 1980, em que ele considera que o PCB enveredou pelo caminho do reformismo e do abandono do projeto revolucionário e por isso ele rompe naquele momento com a direção do PCB. A partir da década de 1990 houve uma reação com uma parte que criou o PPS, principalmente com o Roberto Freire, e esses é que enveredaram para o caminho de uma direita maior. A outra parte do PCB tenta fazer um trabalho de salvar uma herança revolucionário do partido, se vão ter êxito ou não, eu não sei. Não sou mais do PCB e de nenhum partido e desejo que tenham êxito, acho a situação no Brasil muito difícil, a esquerda no Brasil está muito dividida, a direita é forte.

A partir da década de 1990 houve uma reação com uma parte que criou o PPS, principalmente com o Roberto Freire, e esses é que enveredaram para o caminho de uma direita maior”

Mas já são três gestões com governos de esquerda no Brasil. Esse não seria o início de uma revolução?
Não. Acho que os governos de Lula e Dilma desempenham um papel muito negativo para o movimento popular revolucionário no Brasil, porque mascaram com uma capa de esquerda uma política que no fundo é favorável ao grande capital e aos monopólios nacionais e estrangeiros. Não é por acaso que todos os grandes banqueiros fazem os maiores elogios aos governos do PT, eles nunca tiveram lucros tão grandes, e a concentração de renda é cada vez maior, basta olhar os dados do IBGE. Lula foi um operário que chegou ao poder e o povo poderia ter tido muito mais participação, mas ele está rodeado de cientistas políticos que deram ao governo dele e ao de Dilma a continuação da política de neoliberalismo implantada por Fernando Henrique Cardoso, são governos iguais, os ricos ficam mais ricos e os trabalhadores com migalhas. A situação é complexa, mas a partir dessa complexidade é que vamos encontrar o caminho.

Lula foi um operário que chegou ao poder e o povo poderia ter tido muito mais participação, mas ele está rodeado de cientistas políticos que deram ao governo dele e ao de Dilma a continuação da política de neoliberalismo implantada por FHC”

Hoje a coqueluche da política é o governador de Pernambuco. Seria Eduardo Campos uma candidatura de esquerda a promover as grandes mudanças?
É um político que tem muito prestígio em Pernambuco, mas também me parece que faz qualquer tipo de acordo, lamentavelmente a maioria dos nossos políticos quando chega ao poder é assim, isso é um caminho muito perigoso. Se Lula fez acordos obscuros, acho que Eduardo também fará.
Se Prestes tivesse sido presidente, qual teria sido o maior legado dele?
Não houve ainda no Brasil condições para que uma pessoa como Luiz Carlos Prestes se tornasse presidente. Em 1930 ele poderia ter sido presidente, mas não aceitou justamente pelo fato de entender que sozinho não ia ter como fazer nada. Tenho um artigo no meu site, o do Instituto Luiz Carlos Prestes, que faço uma comparação entre Prestes em 1930, que poderia ter ascendido ao poder e Lula nos anos 2000 [clique aqui para ler o referido artigo]. Enquanto Prestes entendeu que não deveria ascender ao poder, que foi oferecido a ele na bandeja naquele momento, já que ele teria duas alternativas: fazer a política das oligarquias que iria defender o desenvolvimento do capitalismo no Brasil ou ser morto e simplesmente não fazer nada. E o Lula depois de perder a eleição por três vezes, entendeu que para ser eleito, teve que na quarta tentativa tinha que negociar e fazer um acordo com o imperialismo e foi isso que ele fez, se tornou um bom gestor que engana bem as amplas massas populares em prol do grande capital e a Dilma dá prosseguimento a este tipo de política.
Então a senhora está afirmando que vale tudo em nome da governabilidade?
Para algumas forças políticas no Brasil, sim. É isso que está acontecendo, vale tudo para chegar e se manter no poder e gerir o pais, mas gerir para quem? Do jeito que está hoje é gerir para o grande capital e interesses internacionais e não para as massas populares ou para acabar com a miséria no Brasil.
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