Por Rodolfo Lucena
Não, este não é um blog de política, ainda que sejam políticos todos os atos da vida. Também não é um espaço mediúnico nem vinculado a qualquer outra crença que não a fé inabalável na capacidade humana. Apesar disso, no meu treino de hoje vi vivo alguém que está morto.
Luiz Carlos Prestes, o Cavaleiro da Esperança, está lépido e fagueiro no Butantã, um bairro da zona oeste de São Paulo que pouco visito, por onde hoje gastei a sola do tênis em um treininho de hora e meia cheio de surpresas gostosas.
A maior e mais importante é o tema desta mensagem. Prestes, é claro, não revive como figura humana, de carne e osso, mas dá o ar de sua graça na forma de um pequeno parque nomeado em sua homenagem –uma das tantas que esse grande brasileiro merece.
Só quando vi, enquanto corria pelas alamedas butantanescas, a placa anunciando o parque, é que tomei conhecimento de sua existência. Primeiro, fiquei feliz ao ver a celebração desse sujeito que, com Getúlio Vargas, forma talvez a dupla de mais importantes figuras da história brasileira e latino-americana. Depois ficou claro para mim que não poderia terminar minha peregrinação sem conhecer o tal parque.
Atravessei uma avenida e mais outra, entrei por uma ruela e lá cheguei.
De cara, o parque me lembrou Prestes, um gaúcho de quatro costados, porto-alegrense nascido em 1898, resistente para mais de metro, capaz de dirigir a maior peregrinação jamais feita na história do Brasil –a Coluna Prestes–, de enfrentar a tortura e a cadeia, de passar frio e abandono e voltar à luta política para só morrer aos 92 anos.
Na última vez em que conversei com ele –na verdade, foi a única, mas comecei a frase assim para dar a falsa impressão de que eu tinha, em algum momento, privado da intimidade do Cavaleiro da Esperança, como o denominou Jorge Amado na emocionada biografia que escreveu–, o que vi foi um velhinho atarracado, troncudo, lúcido, rápido no gatilho, mas ponderado nas respostas, que falava com voz calma, enrouquecida pelo tempo.
Não lembro bem a data. Foi no final de 1979 ou início de 1980, Prestes tinha voltado ao Brasil pouco depois de proclamada a Anistia, e ficou por uns dias em Porto Alegre. Na época, eu era chefe da sucursal gaúcha do jornal oposicionista “Hora do Povo” e recebi a gostosa incumbência de entrevistar Prestes. Fomos encontrá-lo, eu e mais dois colegas do jornal, em um casarão na zona sul da cidade, onde estava hospedado.
Levamos flores –rosas vermelhas– para dona Maria, companheira de Prestes, com quem vivia desde 1950.
Conversamos por meia hora, uma hora, já não sei, os registros estão no jornal. Sei que Prestes mandou sua mensagem de chamado à luta contra a ditadura, um apelo que estava empolgando uma parcela da juventude.
Isso foi naquela época.
Pois o Luiz Carlos Prestes de hoje, o parque, lembra muito o Prestes homem, dizia eu. Tal como ele, fui descobrindo enquanto trotava devagar pela única alameda do platô de entrada, é pequeno. Aliás, pequeno demais para servir como homenagem a Prestes, pensei enquanto circulava por ali.
Mas a aparência miúda se agiganta quando o parque mostra sua alma.
Escondida pelos verdes, há uma escadaria de madeira, degraus feitos de troncos, madeira de demolição encravados na terra para uma escalada rústica a um outro platô; depois, mais outra ainda. O parque é feito em pequenos andares de mata, pequeno e atarracada como o ser que homenageia.
Tem de um tudo: parquinho para a gurizada, área para descanso, para fazer um piquenique, uma estufa para plantas em que são preparadas mudas de árvores, duas quadras de futebol de salão (onde um pequeno grupo de garotos fazia quase um gol a gol, pois jogavam três contra três naquela pequena cancha que, por causa do número de jogadores, devia parecer enorme a eles.
Em um dos cantos do terceiro platô, há uma área com equipamentos para o pessoal da terceira idade fazer exercícios –eu já estou quase lá.
As alamedas para caminhada e eventual corrida são pequeninas. Mesmo assim, vi uma senhora dedicadíssima, que ia e voltava de um lado a outro do segundo platô. Eu também fiz isso como reconhecimento: o trajeto era de apenas 120 metros, menos até que um corredor que venho frequentando ultimamente e que me permite dar 166 passos de ponta a ponta, no que estimo seja um trajeto de uns 150 metros, já que meus passos são modestos…
No terceiro platô, a alameda é um pouco mais alentada, chega aos 200 metros e, como no anterior, o chão de terra batida é coberto com pedriscos (vários deles entraram no meu pé, e lembrei que Prestes foi uma pedra no sapato dos ditadores).
Apesar das alamedas curtas, se você juntar tudo dá um bom treino, rodando de um lado a outro subindo e descendo escadas e aproveitando o verde encravado numa região bem feiosa da cidade, entre uma avenidona e uma rodovia, como você pode ver no mapa abaixo.
O parque funciona de segunda a domingo, das 7h às 18h, e fica na Rua João Della Manna, 665 – Jardim Rolinópolis/ Butantã. Para saber mais, clique AQUI. E para conhecer mais sobre a vida e obra do homenageado, clique AQUI.
PS.: Pelas imagens, nota-se que a Prefeitura escreveu Luiz com s; eu preferi seguir a grafia do site oficial, que é dirigido pela filha do Cavaleiro da Esperança, Anita Leocádia.
FONTE: Rodolfo Lucena + corrida
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