sexta-feira, 15 de maio de 2020

BIBLIOTECA SOCIALISTA: "Rumo à Internacional Americana" e "O Conceito Socialista da Reforma Universitária"

Dois textos de Julio Antonio Mella, traduzidos por Luiz Bernardo Pericás, que acabam de ser publicados na seção "Biblioteca Socialista" da revista Mouro, Ano 11, No. 14.



QUEM FOI JULIO ANTONIO MELLA?



BIBLIOTECA SOCIALISTA

Texto 1


Julio Antonio Mella

Já passou do plano literário e diplomático o ideal de unidade da América. Os homens de ação da atualidade sentem a necessidade de concretizar em uma fórmula precisa o anseio que, desde Bolívar até nossos dias, foi considerado como a aspiração redentora do Continente.

Antes de entrar em uma discussão sobre a melhor forma de organizar a unidade continental é necessário responder à seguinte questão: quem há de fazer a unidade da América?

Várias são as organizações que proclamam a fraternidade entre os povos do Continente. Deixemos de lado os brados hipócritas dos diplomatas nos grandes bacanais das cerimônias de posse de um novo governo ou em alguma ridícula comemoração oficial: nunca obterão um resultado prático. Certos congressos científicos latino-americanos poderiam servir de alguma maneira, ao ideal de união, se não fossem utilizados pelos governos de sainete como propaganda de seus sistemas despóticos.

Confessemos que até hoje a unidade da América foi, em alguns casos, uma afável utopia forjadora de um ideal, e em vários outros, uma aprazível forma de resolver o problema de acomodar-se bem na vida. Neste último caso, trata-se daqueles que falam, regularmente, de hispano-americanismos e que consideram Primo de Rivera ou dom Alfonso como pontífices máximos dessa religião da qual os sacerdotes são os escritores fracassados e famintos, junto com os comerciantes enriquecidos, egressos da “Península” para se evadir do serviço militar do rei e da pátria que adoram à distância.

Respondamos à pergunta: a unidade da América já foi efetuada pelo imperialismo ianque. A União Pan-Americana é a Internacional do futuro império político que terá como única capital Wall Street e como sua nobreza, os reis das distintas indústrias. A unidade da América sonhada por todos os espíritos elevados da atualidade, contudo, é aquela da nossa América, da América calcada na justiça social, da América livre e não da América explorada, da América colonial, da América feudo de umas quantas empresas capitalistas servidas por uns tantos governos, simples agentes do imperialismo invasor. Esta unidade da América só pode ser realizada pelas forças revolucionárias inimigas do capitalismo internacional: trabalhadores, camponeses, indígenas, estudantes e intelectuais de vanguarda. Nenhum revolucionário de hoje pode deixar de ser internacionalista. Deixaria de ser revolucionário. Nenhum programa de renovação, nem a destruição de qualquer tirania, poderiam ocorrer sem uma ação conjunta de todos os povos da América, sem exceção dos Estados Unidos. As duas tiranias que estão mais próximas de cair, as do Peru e da Venezuela, poderão ser substituídas por governos similares, mas nunca por um regime que trate de exterminar sua verdadeira causa: a exploração do povo por uma pequena minoria que o mantém na ignorância. Para que se possa criar uma nova sociedade nas repúblicas da América, se faz necessária a cooperação de todas as forças revolucionárias do Continente.

Convencidos da existência de um inimigo grande e forte, é preciso tomar as medidas táticas para combatê-lo. Todo homem novo acredita ser possível e conveniente a formação de uma frente única entre todas as forças anti-imperialistas da América Latina. Distintas organizações têm entre seus fins a luta contra o imperialismo.

Considerando que fora dos Estados Unidos o inimigo se chama imperialismo –e no interior dessa nação, capitalismo-, é preciso ampliar a frente única para além do Rio Grande e constituir um só exército entre todos os explorados por Wall Street.

Se aceitamos estas verdades -e só os ignorantes ou os retrógrados podem negá-las-, há que convir que a luta está configurada em todo o mundo entre estes dois polos: o capitalismo explorador com múltiplas máscaras e o povo explorado que inicia variadas contendas, com distintos matizes. Na China, no Marrocos e na Inglaterra se combate os capitalistas nacionais, etc. Na América o enfrentamento deve ser contra cada uma das tiranias e contra a metrópole em comum, situada politicamente em Washington.

Os internacionalistas exploradores já criaram uma série de organizações capazes de formar a consciência continental de submissão: a União Pan-Americana, os sindicatos petroleiros, as agências de notícias, a propaganda cinematográfica e muitas outras.

É necessário também constituir uma Internacional americana capaz de aglutinar todas as forças anti-imperialistas e revolucionárias do Continente para forjar uma frente única e poder enfrentar a grandiosa influência do inimigo, da mesma forma como nos organismos humanos é preciso aparecer a célula inicial que irá crescer.

O caminho está muito adiantado. Existem na América Latina distintas forças que já aceitam a luta internacionalista e estão vinculadas a diferentes internacionais. Assim vemos o poderoso Working Party [sic] nos Estados Unidos e os partidos comunistas do México, Argentina, Uruguai, Chile, Brasil, Guatemala e Cuba, afiliados à Comintern. Vários sindicatos operários também estão associados às organizações internacionais. Na América Latina existem diversas entidades que aspiram a este fecundo internacionalismo por rumos diferentes e que possivelmente realizariam maior labor se fossem respaldadas por uma internacional americana anti-imperialista e revolucionária: a União Latino-Americana, a Liga Anti-Imperialista das Américas, quase todas as agremiações operárias do Continente, várias federações estudantis e grupos de propaganda e cultura poderiam, mantendo sua autonomia, formar uma frente única, em uma perfeita internacional que se constituísse e que tivesse por base de organização as fortes instituições com tendências internacionais anunciadas em parágrafos anteriores.

Ainda que esta entidade só servisse como agência central de notícias e de formação entre todas estas forças, já mereceria existir (uma das maiores dificuldades que tem o movimento revolucionário nas Américas é a falta de comunicação entre os diferentes núcleos de lutadores).

A Europa e a Ásia estão distantes. Ambas têm, nestes momentos, graves problemas a resolver. A América trairia os mártires que tombam nesses dois mundos se não se aprestasse a imitá-los e a socorrê-los em suas lutas. O ideal da humanidade é um só nesses instantes. Neste século, as mudanças não serão realizadas por nações isoladas. A civilização se universaliza. Um câmbio na Europa e na Ásia terá influência definitiva na América.

Aceitemos as experiências da Europa em suas lutas e lancemo-nos a conquistá-las adaptando seus procedimentos revolucionários a nossos ideais.

Cárcere de Havana, 2 de dezembro de 1925.

Julio Antonio Mella

* Publicado originalmente in Venezuela Libre, Havana, Ano IV, No. 15, setembro-dezembro de 1925, p. 7 a 15. Traduzido por Luiz Bernardo Pericás.

Texto 2


Julio Antonio Mella

Muito se fala de “Reforma Universitária”. Um burburinho com tons revolucionários chega aos ouvidos, trazido pelo mal-estar e inquietação entre os estudantes. Na revista Tren Blindado e em palestras públicas trataremos de discutir as bases sociais deste movimento, seus antecedentes históricos, seus princípios fundamentais e tudo aquilo que seja necessário para sua melhor compreensão pela massa estudantil.

O primeiro que precisamos definir é o verdadeiro conceito da reforma universitária. Há muito palavrório liberal e vazio sobre o tema, devido ao fato de que, em vários lugares, indivíduos que participaram deste movimento eram da burguesia liberal. Mas se a reforma for empreendida com seriedade e com espírito revolucionário, ela só poderá ser levada a cabo com um espírito socialista, o único espírito revolucionário do momento.

As universidades, como outras tantas entidades do regime atual, estão estruturadas para apoiar o domínio da classe no poder. Acreditar que os intelectuais ou as instituições de ensino não têm vinculação com a divisão sociológica de classes é uma ingenuidade dos míopes políticos. Nunca uma classe sustentou uma instituição (muito menos as de educação), se não para seu benefício. É nas universidades (e em todas as instituições de ensino), onde se forja a cultura da classe dominante, de onde saem seus servidores no amplo campo da ciência que ela monopoliza. As universidades dos países capitalistas modernos produzem advogados, engenheiros, técnicos de todo tipo, para servir aos interesses econômicos da classe dominante: a burguesia capitalista. Achar que os médicos podem ser uma exceção seria um grave erro. A imensa maioria deles se forma para trabalhar em entidades de beneficência coletiva ou para compor os quadros da burguesia profissional individualista e exploradora? Que muitos doutores não tenham êxito pelas mesmas injustiças do regime atual não significa que a aspiração da corporação não seja esta.

Isto posto –discussão que, para qualquer pessoa que tenha um nível cultural e social médio, não precisa ser estendida aqui-, diremos que a reforma universitária deve ser realizada na mesma lógica de todas as outras dentro da organização econômica e política atual. Não há qualquer socialista honesto que acredite ser factível reformar toda esta velha sociedade paulatinamente, até fazer surgir dela uma nova e resplandecente, como nas antigas utopias. A primeira condição para reformar um regime –a história sempre o demonstrou- é a tomada do poder pela classe portadora dessa reforma que, nos dias de hoje, é o proletariado. Tudo deve se convergir a esta finalidade. Mas o fato de que a solução definitiva seja nisto, como em outras mil coisas, a revolução social proletária, não significa que se deva estar indiferente às reformas (no sentido revolucionário do termo), já que estas noções não são antagônicas.

Um conceito socialista da luta para aprimorar a Universidade é similar ao do proletariado em sua ação para melhorar as condições de sua vida e de seu meio. Cada avanço não é uma meta, mais sim um degrau para continuar ascendendo, ou uma arma a mais que se ganha ao inimigo para vencê-lo na “luta final”.

Lutamos por uma universidade mais vinculada às necessidades dos oprimidos, por uma universidade mais útil à ciência e não às castas plutocráticas, por uma universidade onde a moral e o caráter do estudante não se moldem nem no velho princípio do “magister dixit”, nem no individualismo das universidades republicanas da América Latina ou dos EUA. Queremos uma Universidade nova que faça no campo da cultura o que no da produção farão as fábricas do amanhã, sem acionistas parasitas nem capitalistas exploradores. Sabemos que não o vamos conseguir imediatamente. Mas na simples luta para alcançar esse ideal da universidade do futuro obteremos um duplo triunfo: estimular a consciência dos jovens (conquistando redutos na frente educacional contra os inimigos do povo trabalhador) e provar, ante todos os revolucionários sinceros, que a emancipação definitiva da cultura e de suas instituições não poderá ser realizada senão junto com a emancipação dos escravos da produção moderna que são, também, os títeres inconscientes do teatro cômico dos regimes políticos atuais.

* Publicado originalmente in Tren Blindado, Ano I, No. 1, México, setembro de 1928. Traduzido por Luiz Bernardo Pericás.




VEJA TAMBÉM:

Este fue un texto inédito hasta su publicación este 10 de enero de 2020 en el sitio web de la embajada de Cuba en Italia. Originalmente escrito en inglés por Tina Modotti, a inicios del año 1932, el documento se encuentra en el fondo del Socorro Rojo Internacional (SRI) en Moscú. Fue entregado al embajador de Cuba en Italia, José Carlos Rodríguez Ruiz, el 6 de enero de 2020, por la investigadora alemana Christiane Barckhausen-Canale, notable experta internacional sobre la vida de Tina y autora del libro “Verdad y leyenda de Tina Modotti”, Premio Ensayo de Casa de las Américas del 1988, La Habana, Cuba.


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