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quarta-feira, 11 de outubro de 2023

Salário de professores pesa mais na qualidade do ensino do que formação profissional

Leia este esclarecedor artigo do professor Luciano Mendes de Faria Filho, na coluna Cidades das letras no Brasil de Fato MG, abordando a questão do mito da (má) formação docente

Artigo | Profissão docente: o mito da formação

Por Luciano Mendes de Faria Filho


O leitor já deve ter notado que, de um modo geral, quando se fala dos problemas da saúde no Brasil e da precariedade do transporte público nas grandes cidades, raramente ou nunca se imputa o problema à insuficiente formação da classe média ou das pessoas que trabalham na organização do trânsito.

O mesmo não ocorre, no entanto, em relação à educação escolar. Nesta, quase sempre quando se fala da suposta falta de qualidade da escola, imediatamente se argumenta que o principal problema é a falta de formação docente.

Nesta semana em que se comemora o Dia da Professora, é preciso combater o mito de que o principal problema da escola pública brasileira decorre da precária formação de seus profissionais. Essa é uma condição fundamental para que possamos, de fato, atacar os problemas estruturais para que a escola pública básica brasileira possa ter a qualidade socialmente referenciada que todas as nossas crianças, adolescentes e jovens têm direito e merecem.

Este verdadeiro mito sobre a “má formação docente como sendo a causa de todos os males da escola pública” vem de longe e é reiteradamente atualizado nos mais diversos discursos, inclusive daquelas pessoas que, bem-intencionadas, acabam por repeti-lo sem notar o desserviço que prestam à causa.

Há, inclusive, muitos programas atuais de melhoria da qualidade da escola pública que se baseiam, fundamentalmente, nessa premissa.

Problema não está na formação

A primeira razão da força do mito é sua fundação e sua reiteração. Ele vem de longe. Surge no século XIX, momento em que se percebia o “atraso” brasileiro no concerto das nações e buscava-se expandir a escola; porém, não havia dinheiro suficiente. Há quase 150 anos, Rui Barbosa, uma grande referência para políticos, juristas e educadores afirmava a necessidade de duas reformas: “a reforma dos métodos e a reforma do mestre: eis, numa expressão completa, a reforma escolar inteira”.

A segunda razão, possível de vislumbrar já no texto de Rui Barbosa, é que sistematicamente, se escolhe, em política pública para a educação no Brasil, o que é mais barato em detrimento ao que é mais fundamental ou estruturante. Reformar métodos e o mestre é a coisa mais barata em educação. O difícil mesmo é criar condições de salário, carreira e trabalho que garantam as boas condições do exercício da profissão.

Não por acaso, dizia o Secretário do Interior de Minas Gerais, pasta responsável pela instrução pública, em 1906: “O regulamento estabelece a preferência da professora para o ensino primário [por] que a professora com mais facilidade sujeita-se aos reduzidos vencimentos com que o Estado pode remunerar o seu professorado”.

Em terceiro lugar, a reiteração do mito é generificada, ou seja, a centralidade da formação advém do fato de que os discursos e as representações sobre a docência, como se pode ver acima, não representam vozes das mulheres que passaram a ocupar, a partir do final do século XIX, a sala de aula. Ele é sistematicamente atualizado na voz cada vez mais potente dos homens que, não estando na escola, dirigem os “negócios da educação”.

Não por acaso, como lembravam Zeila Demartine e Fátima Antunes em um estudo clássico sobre o tema:   o magistério é uma profissão feminina, mas uma carreira masculina. Talvez, neste sentido, não seja por acaso que a gente não tenha tido, até hoje, nenhuma Ministra da Educação durante o regime democrático.

Ainda relacionado à generificação das análises e das políticas defendidas para o magistério, em que se sobrelevam as vozes em defesa de uma maior e melhor formação das mestras, está o fato de que, até hoje, perdure a errônea representação de que o salário das mulheres professoras é para complementar o salário dos maridos.

Ainda que o movimento sindical das professoras tenha buscado desmascarar este mito, ele persiste na cabeça de boa parte do parlamento brasileiro – majoritariamente masculino – que legisla sobre as carreiras e salários docentes.

Uma quinta razão para a permanência no mito é que ele é realimentado, continuamente, pelas próprias instituições de formação de professores, as quais, como forma de justificar e sua permanência e centralidade, não poupam esforços para oferecer razões para que o mito permaneça.

Hoje, boa parte das pessoas “qualificadas” para participar do debate sobre o tema se encontrem nas universidades e não se sentem cúmplices fundamentais de suas colegas que atuam na educação básica. Um sintoma disso é que, por exemplo, são raras as instituições de formação que celebram a Semana da Professora ou que têm o dia 15 de outubro como feriado.

Sendo claramente um mito, este da falta de formação docente como o aspecto central da educação brasileira, por que ele permanece e é reiteradamente atualizado nas políticas públicas, inclusive de governos ditos de “esquerda”?

Formação x salário e condições de trabalho

E por que ganha tamanha centralidade no debate educacional, ocupando, por exemplo, o lugar que deveria ser do debate sobre salário, carreira e condições de trabalho?

Em um texto de 1985, o professor Miguel Arroyo perguntava: “Quem de-forma o profissional do ensino?”. Em resposta à sua própria pergunta Arroyo respondia: as próprias condições de trabalho em que estes profissionais atuam. E este tem sido a resposta também do movimento sindical das docentes da educação básica, que, felizmente, teimam em não cair no conto do vigário.

Mas, continuo perguntando, por que os políticos, jornalistas, profissionais das fundações privadas e até mesmo pesquisadores continuam repetindo o mantra da falta de formação? Por que não ouvem as professoras dizendo que o problema da educação brasileira não é a falta de formação do seu professorado e sim a precariedade de suas condições reais de existência?

Talvez possam ser trazidos aqui mais dois elementos importante para entendermos a questão: a primeira, o esquecimento; a segunda, a falta de cumplicidade com a luta das mulheres trabalhadoras da educação.

O esquecimento: quem conhece a história da universidade pública no Brasil sabe que, até final dos anos de 1960, elas eram quase exclusivamente instituições de ensino. O que as tornou uma potência na produção científica nas décadas seguintes, não foi o apelo à formação de seus quadros: foi a instituição de salários, carreiras, dedicação exclusiva... ou seja, a profissionalização.

A busca por uma maior formação foi uma consequência das exigências e dos benefícios da carreira, e não o contrário. Quem defende que a (boa) formação vem antes de salários e carreiras querem, na verdade, colocar o carro à frente dos bois (ou enganar a patuleia).

Falta de cumplicidade

Não é de hoje que se sabe que a profissão docente na escola básica brasileira vem sendo exercida nas últimas décadas por trabalhadoras pobres e, cada vez mais negras. Em contraste, as pessoas que dizem publicamente da profissão e legislam sobre a mesma são, majoritariamente, masculinas e brancas.

Então, este dia 15 de outubro – Dia da Professora - é ocasião, mais uma vez, de nos perguntarmos: com quais discursos e razões nos identificamos? Por que nos toca mais saber que as professoras brasileiras são mal formadas do que saber que recebem o pior salário do mundo? Quais os mitos abraçamos?

A quem prestamos nossa solidariedade e emprestamos a nossa cumplicidade?


Luciano Mendes de Faria Filho é pedagogo e doutor em Educação e Professor Titular da UFMG. Publicou, dentre outros, “Uma brasiliana para a América Hispânica – a editora Fondo de Cultura Econômica e a intelectualidade brasileira” (Paco Editorial, 2021)


sexta-feira, 16 de setembro de 2022

Arguição de Anita Prestes na defesa de tese "Trabalho e Proteção Social na Rússia Soviética"




Este vídeo é um recorte da banca de defesa de doutorado de Giovanny Simon Machado, intitulada "Trabalho e Proteção Social na Rússia Soviética (1917-1922): os anos formativos" e submetida ao Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da UFSC. Ocorrida no dia 25 de agosto de 2022, a banca contou com a arguição da profa. Anita Leocadia Prestes, cuja fala constitui o elemento principal desse vídeo. Além da profa. Anita, as profas. Sara Granemann, Angela Amaral e os profs. Ricardo Lara (presidente) e Paulo Pinheiro Machado (suplente) também compuseram a comissão examinadora.

Como a banca foi realizada remotamente, a gravação foi feita pelo próprio software de conferências online da UFSC. A edição é de Michele de Mello.



sexta-feira, 30 de abril de 2021

DEBATE "Anarquistas e comunistas no movimento operário na Primeira República"

Com Anita Prestes, José Luiz Del Roio, Marco Aurélio Santana.

Quando: 05/05/2021

Horário: 19h

Transmissão ao vivo nas páginas do Facebook:

@amorjufrj

@noticiasdaterraredonda

@netsufrj

Transmissão ao vivo no canal do YouTube "Notícias da Terra Redonda": https://www.youtube.com/watch?v=vCdkqn7m0hE






quarta-feira, 9 de setembro de 2020

CLASSE TRABALHADORA E TRANSIÇÃO PARA A DEMOCRACIA NO BRASIL

DEBATE COM ANITA PRESTES (UFRJ), IRAM J. RODRIGUES (USP) E MEDIAÇÃO DE MARCOS SANTANA

14/09/2020, às 18h.

CLASSE TRABALHADORA E TRANSIÇÃO PARA A DEMOCRACIA NO BRASIL

Transmissão pelo facebook /amorjufrj

O debate faz parte do conjunto de atividades que o Arquivo de Memória Operária do Rio de Janeiro-AMORJ, da UFRJ, vem desenvolvendo neste período de pandemia da Covid-19.



quarta-feira, 19 de agosto de 2020

Para download: "Imprensa de esquerda e movimento operário (1964-1984)"

 A Editora Expressão Popular indica e está disponibilizando em pdf gratuito a obra "Imprensa de esquerda e movimento operário (1964-1984)", de Celso Frederico. Este livro traz, por meio da análise de jornais e periódicos de organizações de esquerda, a atuação do movimento operário durante ditadura empresarial militar brasileira. Recupera a memória da luta dos operários nessa "página infeliz de nossa história".

Você pode baixar de forma gratuita diretamente CLICANDO AQUI ou seguir com a compra do livro digital e contribuir com o projeto editorial popular da Expressão Popular, clicando no link:

https://www.expressaopopular.com.br/loja/produto/imprensa-de-esquerda-e-o-movimento-operario-livro-virtual/


quinta-feira, 30 de julho de 2020

Lançamento online do filme “1917, A Greve Geral”

Quinta-feira, 30 de julho de 2020, às 19h tem “1917, a Greve Geral”, filme que resgata o protagonismo da classe trabalhadora no Brasil.
Num Brasil que vive hoje uma tempestade de ataques contra a classe trabalhadora, com cortes de direitos antes considerados invioláveis, além da convivência com trabalho escravo, é imprescindível fazer um paralelo com o que aconteceu 103 anos atrás. É no universo do que se passou no começo do século passado, mais precisamente em São Paulo e com reflexos em todo o país, que o cineasta Carlos Pronzato se inspirou para rodar o filme “1917, a Greve Geral”.

O documentário terá lançamento online, com legendas em Inglês, nesta quinta (dia 30), no canal do YouTube de Carlos Pronzato, a partir das 19 horas. É só ir no endereço https://bit.ly/2YzNGMy. O diretor mergulhou nessa que foi uma das mais prolongadas e contundentes greves já realizadas no Brasil, em julho de 1917, e que sofreu brutal repressão do governo. Até hoje não se sabe exatamente quantas pessoas morreram nos confrontos, nos quais a polícia matava manifestantes nas ruas, no sabre e na bala, e promovia muito espancamento.

A greve teve forte influência de anarquistas italianos que vieram morar no Brasil e foi deflagrada após o assassinato de um sapateiro espanhol, José Martinez, de 21 anos. Apesar da violência e desaparecimentos nunca explicados, a greve é considerada vitoriosa por ter atingido conquistas como aumentos salariais, redução de jornadas de trabalho e limitação à exploração da força de trabalho de mulheres e crianças.

O filme se baseia num longo trabalho de pesquisa na imprensa da época, além de entrevistas a especialistas e estudiosos do tema e consulta a trabalhos acadêmicos sobre o tema. São 90 minutos do registro histórico feito para celebrar o centenário da primeira vitória da classe operária e que arrancou várias conquistas. Carlos Pronzato é um especialista em abordar a temática política e operária, tendo vários documentários, e traz agora um momento de coragem e de luta da classe trabalhadora para ser visto e analisado num período que ela sofre um intenso processo de retrocesso no Brasil. Portanto, quinta, dia 30, você tem essa opção.

Quem quiser colaborar com o cinema político e independente adquirindo o DVD de "1917, a Greve Geral", para conservar e ou colecionar a sua versão física, é só entrar em contato pelo e-mail carlospronzato@gmail.com. Nesse caso, o investimento é de R$ 30,00 + frete.


1917, A GREVE GERAL/ Doc./ 90 min./ 2017/ português/ Direção: Carlos Pronzato

A primeira greve geral do Brasil, ocorrida em julho de 1917, promovida por organizações operárias de origem anarquista, foi uma das mais abrangentes e longas da História do Brasil. O documentário, através de entrevistas a especialistas e estudiosos do tema, celebra o centenário da primeira vitória da classe operária, arrancando conquistas sócias do Estado e do Patronato da época.

Prêmio Destaque Liberdade de Imprensa outorgado pelo jornal Tribuna de Imprensa Sindical - 2017.


Lançado oficialmente em 07 de dezembro de 2017 na OAB/RJ e no dia 16 de dezembro de 2017 no CINE BIJOU em São Paulo-SP.




Catálogo completo de filmes e livros de Carlos Pronzato: www.lamestizaaudiovisual.com.br

FONTE: Sergio Caldieri  (via e-mail)

sexta-feira, 10 de julho de 2020

Tempos de pandemia: “Novos-velhos” projetos de política pública para a educação da classe trabalhadora

Colóquio online da Escola Politécnica em Saúde Joaquim Venânio (EPSJV/Fiocruz)


Os debates propostos no Tempos de pandemia: “Novos-velhos” projetos de política pública para a educação da classe trabalhadora foram realizados nos dias 26 de junho, 1º e 8 de julho de 2020. 

As palestras foram transmitidas ao vivo no canal da Escola Politécnica em Saúde Joaquim Venânio (EPSJV/Fiocruz) no youtube. O evento faz parte das celebrações de 35 anos da Escola. 


24 de junho

Educação em tempos de pandemia: disputas na educação da classe trabalhadora no Brasil

Convidados:
Marcela Pronko (EPSJV/Fiocruz)
Sonia Maria Rummert (UFF)

Moderação:
Rafael de Lima Bilio (EPSJV/Fiocruz)



1º de julho

A intensificação e a desintelectualização do trabalho docente no contexto da pandemia de Covid-19

Convidados:
Roberto Leher (UFRJ)
Rodrigo Lamosa (UFRJ)

Moderação:
Ingrid D’avilla (EPSJV/Fiocruz)



8 de julho 

Políticas para a educação e a saúde no pós-pandemia: é possível pensar o amanhã?

Convidados:
Elaine Bhering (Uerj)
André Dantas (EPSJV/Fiocruz)

Moderação:
Letícia Batista (EPSJV/Fiocruz)


quinta-feira, 4 de junho de 2020

Para pensar historicamente a administração do tempo e a demarcação entre o "trabalho" e a "vida"

"Tempo, disciplina de trabalho e capitalismo industrial", texto do historiador E. P. Thompson


"O registro histórico não acusa simplesmente uma mudança tecnológica neutra e inevitável, mas também explorações e a resistência à exploração" (p.301)

 THOMPSON, E. P.  Tempo, disciplina de trabalho e capitalismo industrial. In.: ____.  Costumes em comum.  São Paulo: Companhia das 1998.p. 267-304. 

LINK PARA DOWNLOAD:


terça-feira, 2 de junho de 2020

Contra a politicagem do governo municipal, prevaleceu a força da mobilização dos professores de Rio das Ostras

Uma vitória parcial, mas importante

Por Marcos Cesar de Oliveira Pinheiro*

Na última sexta-feira, dia 29/05/2020, sem qualquer aviso prévio, os professores da Rede Municipal de Ensino Público de Rio das Ostras foram surpreendidos, ao receberem seus salários, com o corte da Gratificação de Regência de Classe (GRC), mesmo trabalhando em regime de home office, como determinado por decreto municipal, para que os alunos da rede continuem seu “aprendizado”. E como afirmou a Nota Oficial do núcleo Rio das Ostras do SEPE (Sindicato Estadual de Profissionais da Educação): “Esta opção do governo Marcelino de cortar novamente na carne do profissional da educação deve ser entendida pela categoria como um ataque frontal ao nosso direito à vida, às orientações da OMS de isolamento social, já que muitos terão que encontrar outras formas de equacionar as perdas e exige por parte dos professores uma ação contundente na defesa de seu salário integral.” (Nota Oficial SEPE Rio das Ostras: “Em meio àpandemia somam-se as covardias”, de 29/05/2020).



Diante da repercussão negativa do corte da GRC dos professores, as redes sociais pró-governo, tentando justificar o ato covarde, lançaram postagens em que colocavam a seguinte questão: “Marcelino pode escolher: ou segue a lei ou faz política. Lei de 2013 condiciona pagamento da gratificação por regência a efetiva atuação docente em sala de aula. Será que é certo ignorar a lei e pagar mesmo assim?”. Trata-se de uma argumentação falsa, uma fraseologia vazia para ludibriar a massa incauta. Na verdade, o prefeito Marcelino Carlos Dias Borba tinha duas opções: seguir a lei ou fazer politicagem. E ele escolheu fazer politicagem ao cortar a GRC dos professores. E por que politicagem? Ao tomar medidas de redução de despesas para enfrentar a perda de arrecadação, o prefeito escolheu cortar direitos dos servidores públicos e manter intocado o enorme número de apadrinhados políticos nos cargos comissionados, que tem um peso considerável nas despesas do município.

Os ataques aos profissionais da educação promovidos pelo prefeito Marcelino, com a anuência da Secretaria de Educação, Esporte e Lazer (SEMEDE), vinham se dando como bola de neve e o governo não esperava a mobilização dos professores de Rio das Ostras em reação ao corte da gratificação da regência. Ainda que incipientemente, nós professores, juntamente com o SEPE Rio das Ostras, conseguimos transformar a indignação numa atmosfera de combatividade crescente. A categoria em conjunto decidiu suspender as atividades que vinham executando em regime de home office, não entregando as atividades e apostilas online, fazendo mobilização nas redes sociais para denunciar o ataque aos nossos direitos e pressionar o governo e compartilhando as notas oficiais do SEPE e a importante live do sindicato sobrea retirada da regência e outros auxílios durante a pandemia, que possibilitou um encaminhamento de ações conjuntas da categoria. Ademais, o Departamento Jurídico do SEPE Rio das Ostras ingressou com ação judicial visando a reparação dos danos causados pela retirada, de forma abrupta e injustificada, da Gratificação de Regência de Classe ocorrida neste mês na rede pública local (Processo nº 0003655-67.2020.8.19.0068, de 31/05/2020).




Na Ação Cível Pública, solicita-se o pagamento em até 48h dos valores suprimidos no mês e que o município deixe de descontar nos próximos meses em virtude das medidas de contenção do COVID-19 (home-office). A ação popular fundamenta-se no fato dos profissionais de ensino estarem exercendo atividade regular, de acordo com o PCCV (Plano de Cargos, Carreiras e Vencimentos) e leis que regulamentam o GRC (como a Lei 1780/2013), preparando aula, lecionando e passando todo conteúdo imposto pela SEMEDE. Os professores estão notoriamente trabalhando mais nesse período de home-office, vista a dificuldade no acesso às plataformas digitais, ausência de treinamento adequado, demanda elevada de conteúdo, preparação de aula etc. Em outras palavras, os professores da rede estão em pleno curso de suas atividades, em efetiva atuação da docência e cumprindo a carga horária prevista no mês em atividade Home-Office (resolução SME – 29/2020, Circular SEMEDE/Sub.Ped.Ed. nº 431/2020 e orientação pedagógica da SME ), deixando claro a manutenção de todo dia-a-dia com seu colégio e sala de aula, contudo, em modalidade virtual.

O ato do prefeito de corte da regência, além de covarde e desumano, é também pautado na ilegalidade pelo fato da ausência de comunicação prévia aos profissionais. Imaginem os professores, com várias contas a pagar e manter o sustento próprio e de sua família, sendo literalmente surpreendidos com o corte salarial inesperado.

A abertura de várias frentes para lutar pelos direitos de nossa categoria levou o governo municipal a recuar da decisão de cortar a gratificação de regência. Nesta segunda-feira, dia 1o de junho de 2020, às 19h50, foi publicado no site oficial da Prefeitura de Rio das Ostras a notícia de que o governo municipal “vai pagar as gratificações de regência e suporte pedagógico para professores que comprovarem a realização de atividades virtuais”. Segundo a notícia, “A Procuradoria Geral do Município avaliou novos dados apresentados nessa segunda-feira, dia 1º de junho, pela Secretaria de Educação, e deu parecer favorável ao pagamento da regência, desde que as atividades dos professores sejam comprovadas por meio de relatórios e apresentação das atividades, devidamente avaliadas e atestadas pela direção da Escola a qual o professor estiver lotado, e a anuência da Secretaria de Educação, Esporte e Lazer.” (https://www.riodasostras.rj.gov.br/prefeitura-vai-pagar-as-gratificacoes-de-regencia-e-suporte-pedagogico-para-professores-que-comprovarem-a-realizacao-de-atividades-virtuais/).

Sabemos bem o que motivou a avaliação dos “novos dados” por parte da Procuradoria Geral do Município. Política e juridicamente, o prefeito Marcelino Borba deu um tiro no pé. Mais uma vez, mostrou-se ser da mesma laia ou até pior do que os governos anteriores, fossem eles verde (de Alcebíades Sabino) ou laranja (de Carlos Augusto Balthazar), no fundo todos comprometidos com os contratos de empreiteiras, a distribuição de cargos comissionados e funções gratificadas, mais por indicações políticas do que por requisitos técnicos, e a prática de políticas assistencialistas e clientelísticas para manter a grande maioria das pessoas adormecida, narcotizada e manipulada, deixando intocadas as relações de poder entre a "elite" e o "povo".

Mas o que garantiu o recuo do governo municipal em relação ao corte da gratificação de regência foi a mobilização efetiva e consequente dos professores, pressionando em várias frentes. O que se esboçou, ainda que espontaneamente, no calor da hora, com o “Boicote às Apostilas” foi uma espécie de “greve não oficializada” da categoria, com a paralisação do regime de home office. Tivemos o protesto virtual que repercutiu junto à sociedade local. E a Ação Cível Pública da categoria, via Departamento Jurídico do SEPE Rio das Ostras.

Vencemos uma batalha, mas não vencemos a guerra. A vitória é muito importante no contexto atual, porém é uma vitória parcial. A situação da classe trabalhadora vem se agravando desde o governo de Michel Temer, quando da alteração da legislação trabalhista, isto é, a retirada de direitos dos trabalhadores. A pandemia agrava o que já estava ruim. Ademais, a evolução do atual regime de exceção que vem sendo implantado pelo governo de Jair Bolsonaro no país aponta para tendências que indicam a possibilidade de sua transformação em ditadura fascista. Ou seja, uma ditadura violenta do capital financeiro internacionalizado, assegurando no sentido político o êxito da ofensiva do capital, da exploração e do saque das massas populares pela minoria capitalista e garantir a unidade dessa minoria sobre a maioria popular. E o governo municipal de Rio das Ostras deixa bem clara sua posição de alinhamento às diretrizes do governo de Jair Bolsonaro, “o produto malparido do medo burguês”, principalmente, ao adotar medidas drásticas de contenção de despesas orçamentárias, penalizando mais ainda as massas trabalhadoras. Portanto, não estamos seguros nem no âmbito municipal.

Devemos e precisamos manter nossa capacidade de resistência e, principalmente, desenvolver o nível de organização, de mobilização e de consciência da nossa categoria e dos trabalhadores em geral. Pois, ninguém é ingênuo de achar que não vão tentar, me desculpem o termo, nos sacanear de alguma forma. Quem é da Rede Municipal de Ensino de Rio das Ostras sabe que não vão engolir, facilmente, a derrota sofrida. A própria notícia supracitada no site da Prefeitura e a Resolução SME n° 29/2020, publicada na edição 1182 do "Jornal Oficial" (p. 10), de 29/05/2020, sinalizam um arcabouço de assédio moral e de eventuais descontos salariais dos professores.

Ainda que parcial, é uma vitória importante. Importante porque nos mostra que as vitórias só são conquistadas com mobilização, com organização, com consciência. “Quanto mais a gente luta, mais a luta nos educa”, diz o poema do professor Jonathan Mendonça. Quando o professor está lutando, ele está ensinando, e, mais ainda, está aprendendo. Como afirma o grande sociólogo brasileiro Florestan Fernandes, “mudar requer luta e luta social entre classes” e, prossegue, “um professor deve aprender a pensar em termos de lutas de classes, mesmo que não seja marxista” (Florestan Fernandes, A formação política e o trabalho do professor. Marília, Lutas anticapital, 2019, p. 76).

Conforme salienta o jornalista português e militante comunista Miguel Urbano Rodrigues: “A história ensina que na vida dos povos vítimas de uma opressão intolerável, as grandes lutas fermentam por tempo variável até que eles se levantam em explosões sociais vitoriosas. Então exercem o direito de resistência e à rebelião - direito que é antiquíssimo e consta do artigo 2º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão promulgada pela Revolução Francesa de 1789. É o direito à resistência contra a opressão econômica e social, direito que, após os horrores da Segunda Guerra Mundial, foi incluído na Declaração Universal dos Direitos do Homem (artigos 22 a 25).”

Onde há luta tudo é conquistável e potencialmente perdível. Mas onde não há luta a derrota é certa. Que a nossa vitória parcial nos ajude e ajude aos demais companheiros trabalhadores a compreender essa lição.

NOSSA LUTA É MAIS DO QUE JUSTA. VAMOS LUTAR!!!

* Professor de História da Rede Municipal de Ensino Público de Rio das Ostras, desde 2004, lotado na Escola Municipal Padre José Dilson Dórea, e Professor Adjunto de História da Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), campus Duque de Caxias (Faculdade de Educação da Baixada Fluminense).

segunda-feira, 20 de abril de 2020

El rey desnudo

Todos los analistas juiciosos (excepto los voceros del imperio y de la ultraderecha) coinciden en que el coronavirus ha retirado bruscamente el velo de la supuesta bonanza neoliberal para descubrir la barbarie, sus abismos de injusticia y desigualdad

Por Abel Prieto

Cuenta Hans Christian Andersen de dos pícaros que se hicieron pasar por sastres para prometerle a un rey el más bello traje imaginable.

Todos admirarían su atuendo, le dijeron, excepto aquellos nacidos de un amorío extramatrimonial de sus madres. Cuando el rey fue a probárselo, junto a sus cortesanos, nadie, ni el propio rey, vio traje alguno; pero todos pensaron con angustia que eran hijos de relaciones pecaminosas y decidieron alabar con entusiasmo el ropaje imaginario y la genialidad de sus creadores.

El día de la fiesta de la villa, el rey «se vistió» y, montado en su caballo, desfiló por las calles. Los pobladores callaban, avergonzados, creyéndose indignos de percibir el traje milagroso. Hasta que un niño inocente exclamó «¡el rey va desnudo!» y logró, sin proponérselo, que todos descubrieran la farsa.

Con el grito del niño de la fábula se hizo pedazos, como por encanto, la mentira generalizada.

Hoy la naturaleza inhumana del capitalismo y su versión más obscena, el neoliberalismo, ha sido desnudada por el coronavirus. Su rostro satánico quedó expuesto, sin máscaras ni afeites. Se han abierto grietas muy hondas en el espejismo fabricado por la maquinaria de dominación informativa y cultural.

Fidel repitió muchas veces que el capitalismo y el neoliberalismo conducen al mundo entero al genocidio. Y lo dijo con énfasis particular cuando se derrumbó el socialismo en Europa y el coro triunfal de la derecha celebró el advenimiento del Reino Absoluto del Mercado como sinónimo de «libertad» y «democracia», mientras buena parte de la izquierda mundial se replegaba, desmoralizada.

Todos los analistas juiciosos (excepto los voceros del imperio y de la ultraderecha) coinciden en que el coronavirus ha retirado bruscamente el velo de la supuesta bonanza neoliberal para descubrir la barbarie, sus abismos de injusticia y desigualdad.

La pandemia ha funcionado como un instrumento revelador que destapa, desenmascara, y nos enfrenta crudamente a la realidad.

Uno de los rasgos del sistema, que la pandemia ha sacado a la luz, tiene que ver con el dilema ético en que se han visto los médicos obligados a elegir (ante la escasez de respiradores y medicamentos indispensables, de camas en hospitales y unidades de cuidados intensivos) entre enfermos que pueden considerarse «salvables» y aquellos «insalvables», más viejos, más frágiles, con mayores complicaciones.

Esta división tan cruel nace de entender los servicios de salud y la industria farmacéutica como un lucrativo negocio, donde no hay pacientes, sino clientes.

En 2013, un ministro de Finanzas japonés solicitó a los ancianos de su país que se hicieran el harakiri para aliviar de cargas excesivas al presupuesto, y hace poco el vicegobernador de Texas, Dan Patrick, hizo un comentario parecido. Es monstruoso, pero habría que agradecerles su didáctica franqueza.

Según la doctrina neoliberal, el Estado reduce su papel al mínimo y queda como servidor de las corporaciones, mientras que el mercado, mediante la competencia, divide a la humanidad en una minoría de «ganadores», es decir, de «salvables», y la gran masa de «perdedores» o «insalvables».    

Ya en medio de la pandemia, la primera reacción de ciertos políticos neoliberales, como Trump y Bolsonaro, fue restarle importancia y mirar hacia otra parte, sobre todo para no afectar la economía. Evidentemente, dentro de su lógica, el coronavirus debía concentrarse en «los perdedores», en el populacho «descartable», en las razas «inferiores», migrantes o no, en aquellos cuya vida y dignidad no tienen ningún valor, en los que debieran hacerse de una vez el harakiri. Pero la epidemia, como sabemos, fue más lejos de lo previsto, y hubo que cambiar de manera oportunista el enfoque del tema. 

Es del mismo modo demagógico y falso el discurso de las élites que asegura que el coronavirus «nos iguala», ya que ataca a ricos y pobres de la misma manera.

La gente rica (subraya Ingar Solty) puede pagarse el servicio de médicos-conserje durante las 24 horas del día. Además: «…puede someterse a la prueba de detección del virus, aunque no tenga síntomas, recibe concentradores de oxígeno, máscaras respiratorias, etc., mientras que gente trabajadora con síntomas de la covid-19 ha de luchar para que le hagan la prueba y luego pagar la factura».

Las élites, según un reportaje de The New York Times, se construyeninstalaciones aisladas, con máximo confort y equipamiento y personal clínico especializados; viajan en yates o aviones privados a sitios adonde no ha llegado hasta ahora el virus, y se permiten curiosos caprichos y extravagancias. Hay «famosos» que compran gel antibacterial de marca y nasobucos muy caros (y se hacen selfis para lucirlos en las redes). Uno prefiere un elegante «tapabocas urbano» de la compañía sueca Airinum, provisto de cinco capas de filtración y un «acabado ultrasuave ideal para el contacto con la piel». Otro, de Cambridge Mask Co., empresa británica que usa «capas de filtrado departículas y carbono de grado militar».

En las antípodas de estos millonarios, están los grupos que, según Boaventura de Sousa Santos, «tienen en común una vulnerabilidad especial que precede a la cuarentena y se agrava con ella»: mujeres, trabajadores precarios e informales, vendedores ambulantes, moradores de las periferias pobres de las ciudades, ancianos, internados en campos de refugiados, inmigrantes, poblaciones desplazadas, discapacitados. En suma, la cuarentena refuerza «la injusticia, la discriminación, la exclusión social y el sufrimiento».

Sousa Santos se hace (y nos hace) preguntas que son dardos: «¿Cómo será la cuarentena para aquellos que no tienen hogar? Personas (…) que pasan las noches en viaductos, estaciones abandonadas de metro o tren, túneles de aguas pluviales o (…) de alcantarillado, en tantas ciudades del mundo. En ee. uu. los llaman tunnel people. ¿Cómo será la cuarentena en los túneles?».

Pero hay otra pregunta que recorre el planeta en medio de la incertidumbre, del miedo, de la avalancha creciente de cifras de muertos y contagiados, y de imágenes escalofriantes de cadáveres en las calles: ¿qué pasará después de la epidemia?

El propio António Guterres, secretario general de la onu, ha dicho: «…no podemos regresar adonde estábamos (…) con sociedades innecesariamente vulnerables a la crisis. La pandemia nos ha recordado, de la manera más dura posible, el precio que pagamos por las debilidades en los sistemas de salud, las protecciones sociales y los servicios públicos. La pandemia ha subrayado y exacerbado las desigualdades…».

Atilio Borón, en la más lúcida reflexión que se ha escrito en torno a esta crisis, afirma que «la primera víctima fatal» de la pandemia «fue la versión neoliberal del capitalismo»: «un cadáver aún insepulto pero imposible de resucitar».

El capitalismo, en cambio, como dijo Lenin, «no caerá si no existen las fuerzas sociales y políticas que lo hagan caer». Sobrevivió a la llamada «gripe española» y «al tremendo derrumbe global» de la Gran Depresión.  Ha demostrado «una inusual resiliencia (…) para procesar las crisis e inclusive salir fortalecido de ellas». Por otra parte, en el presente, ni en ee. uu. ni en Europa se perciben «aquellas fuerzas sociales y políticas» señaladas por Lenin, por lo que no es realista pensar en un desplome inminente del sistema capitalista.

Atilio nos propone como hipótesis de trabajo un mundo pospandémico con «mucho más Estado y mucho menos mercado», masas populares más conscientes y politizadas –gracias a las terribles lecciones del virus y del neoliberalismo– y «propensas a buscar soluciones solidarias, colectivas, inclusive socialistas». En medio, además, de una nueva geopolítica, con el imperialismo estadounidense desacreditado, carente de liderazgo y sin prestigio internacional de ningún tipo.

El escenario posterior a la pandemia representa, para Atilio, un «tremendo desafío» para «todas las fuerzas anticapitalistas del planeta», y «una oportunidad única, inesperada, que sería imperdonable desaprovechar». Hay que «concientizar, organizar y luchar, luchar hasta el fin».

Y evoca a Fidel en una reunión de la Red En defensa de la Humanidad de 2012: «…si a ustedes les dicen: tengan la seguridad de que se acaba el planeta y se acaba esta especie pensante, ¿qué van a hacer, ponerse a llorar? Creo que hay que luchar, es lo que hemos hecho siempre».

Hace muy bien Atilio en recordar a Fidel ante la crisis, la incertidumbre, el horror y el espectáculo del neoliberalismo, desnudo y en ridículo como el rey de la fábula. Y también ante las esperanzas que pudieran abrirse. Gracias a sus ideas y a su obra, Cuba pone su desarrollo científico, y el sector de la salud, y todas las potencialidades del Estado al servicio del ser humano, y en particular de los más vulnerables. Si vamos a pensar en serio en un mundo futuro más justo, hay que recordar, como Atilio, a Fidel y a Cuba.

Nuestros médicos y enfermeros internacionalistas anticipan, día a día,  esa utopía con la que muchos sueñan ahora.

FUENTE: Granma

quarta-feira, 1 de abril de 2020

Nudez

Por Wilson Ramos Filho*
Via Facebook, 28/03/2020

Desde ontem o capitalismo brasileiro ficou nu. Em muitas cidades houve carreatas repetindo a homicida exortação de que o Brasil não pode parar.

Os burgueses, protegidos dentro dos carrões, exigem que seus empregados voltem a trabalhar para gerar riqueza.

Bingo! Epifania! Revelação! O que gera riqueza não é o capital. É o trabalho!

A burguesia enfim percebeu que o capital imobilizado em máquinas, equipamentos, estoques e sistemas de computador não gera riqueza. Sem o trabalho dos empregados o capital é inútil. Tanto quanto os capitalistas, essa classe parasitária que - sem nada produzir - vive da exploração dos trabalhadores.

Só há riqueza porque houve exploração do trabalho de alguém. O que gera o acúmulo de capital é a parcela não paga sobre o trabalho humano. Essa parte não remunerada do trabalho dos empregados (mais-valia) é acumulada pelos empregadores sob a forma de capital.

Os que desfilaram buzinando fizeram verdadeiro “strip-tease” ideológico. Descortinaram para todos como funciona o capitalismo. Exigiram que os governos assegurem e garantam o que entendem ser seu direito, o direito a explorar, o direito a ficar com a mais-valia produzida por seus empregados.

Morrerão milhares de pessoas? Certamente sim. Mas isso está dentro das regras de um jogo chamado capitalismo. Existe um exército de reserva a ser mobilizado para ocupar as vagas dos que fenecerem. O que não admitem - vampiros - é que seus lucros e capital sejam comprometidos por decisões estatais que imponham o isolamento social. Entendem ter o direito de sugar até a última gota de sangue dos trabalhadores, antes que morram ou se tornem inúteis para a exploração.

Para a parcela da burguesia que nelas buzinou histericamente ou que apoiou as carreatas, os trabalhadores são descartáveis, substituíveis, como peças de uma diabólica máquina de moer pessoas, para gerar excedentes

financeiros a quem os explora. O Brasil não pode parar, assim, constitui-se em eufemismo para a exploração do trabalho humano, prestado sob subordinação, que não poderia ser interrompida.

O capitalismo brasileiro está nu. Uma feia, obscena, depravada, nudez. Necrófilos buzinaram, perversos, excitados - e não foram poucos - em defesa de seus privilégios, de seus interesses de classe. São classe exploradora em si e para si. Desnudaram-se, deixaram à mostra, impudicos, suas obesidades, reais e metafóricas, em defesa do direito a explorar o trabalho alheio. Pretendem que os trabalhadores se apinhem nos insalubres transportes coletivos, contaminando-se, para produzir os excedentes que engordarão ainda mais o capitalismo brasileiro. Os flácidos organizadores das carreatas orientaram os participantes a não saírem de seus veículos. Não são bestas. Temiam a contaminação. Mas não se importam se seus empregados se expuserem. O nome do jogo é capitalismo.

Ficou evidente, com as carreatas, o desejo dos proprietários dos meios de produção e da quase-classe, sem deles ser proprietária (a classe média), de apoiar o sistema de exploração vigente. Esperemos que a classe trabalhadora, estarrecida com a nua desfaçatez dos exploradores tome consciência do poder que por óbvio tem, durante e, principalmente, depois de controlada a pandemia.


* Wilson Ramos Filho (Xixo), doutor em direito, professor na UFPR, integra o Instituto Defesa da Classe Trabalhadora.


terça-feira, 29 de outubro de 2019

Ken Loach: uberização é o trabalho escravo moderno

''Todo filme é um ato político'', diz um dos maiores cineastas vivos, o britânico Ken Loach, em entrevista ao jornal The Guardian, após o sucesso do seu novo filme, 'Sorry We Missed You', considerado como uma continuação de 'Eu, Daniel Blake'

Por Redação Carta Maior



Pouco tempo depois do sucesso no recente Festival de Cinema de Cannes, o diretor britânico Kenneth Charles Loach, de 82 anos, concedeu a entrevista abaixo ao jornal de Londres The Guardian onde fala sobre seu cinema e sobre a política, dois temas que sempre estiveram entrelaçados na sua premiada e histórica filmografia.

Mestre do filme político e do realismo social do seu país, Sorry We Missed You começou a ser exibido na Europa inaugurando a estação cinematográfica nobre, do outono, com imenso sucesso de público e de crítica. Estimamos que até o fim deste ano ele esteja nas telas do Brasil.

O título Sorry We Missed You contém a ironia que se refere ao aviso deixado nas caixas do correio quando não é possível fazer a entrega da encomenda a um destinatário ausente.

É um libelo contra a uberização do trabalho e, assim como o seu festejado Eu, Daniel Blake, do qual é uma espécie de suíte, o filme relata a atual precariedade do trabalho, uma alternativa para aqueles que fogem, desesperados, do desemprego (o formal, que se torna arcaico) e mostra o empobrecimento da população das pequenas classes médias no Reino Unido.

O roteiro do seu filme, mais uma vez, é do escritor Paul Laverty, grande amigo de Loach. “Para pesquisar o assunto, ’’ diz o cineasta, ‘’ ele perambulava pelos estacionamentos conversando com motoristas de entregas a domicílio, fazia viagens em sua companhia e observava o quanto eles bebiam para manter a energia física e o seu apodrecimento.’’ O ator principal, Kris Hitchen, trabalhou nos últimos vinte anos como encanador autônomo. E muitos dos demais atores são motoristas de entrega domiciliar; trabalhadores uberizados.

O plot de Loach/Laverty levanta a vida de Ricky e sua mulher, Abby. Ela vende o seu carro e passa a usar transportes públicos para que o marido possa comprar uma camionete e fazer os turnos de 12/14 horas durante seis dias por semana, uma ocupação como solução possível para resolver os seus problemas financeiros. A equação familiar completa-se com os dois filhos.

Ambos os filmes, este e Eu, Daniel Blake, são ambientados na cidade de Newcastle, num cenário de economia quebrada e de empresas que tentam convencer os trabalhadores, desonestamente, das vantagens de serem seus próprios patrões.

Mas neste novo mergulho no realismo social britânico, embora com tom globalizante, Loach continua conferindo aos seus personagens um profundo humanismo.

Ken Loach (Getty Images)


A entrevista ao The Guardian:

The Guardian - Por que você escolheu situar a ação de Sorry, We Missed You em Newcastle, como a de Daniel Blake, ao invés de Irlanda ou mesmo na Escócia, onde você já filmou muito?

Ken Loach - Nós não queríamos arriscar ficarmos atolados no debate sobre a independência escocesa. O tema do filme não é um problema escocês, mas europeu. No entanto, a escolha de Newcastle não foi feita por acaso. É, antes de tudo, uma cidade pequena, não um grande centro como Manchester ou Birmingham. Tem uma forte identidade local, e nela se fala um dialeto ainda muito praticado. Ela está localizada em uma parte da Inglaterra relativamente separada do resto do país, onde as pessoas são orgulhosas da sua região e da sua cidade. A economia desenvolvida ali, a partir de indústrias antigas, incluindo a mineração e a construção naval, que agora foram deixadas para trás, resultaram num alto desemprego e uma profusão de empregos informais.

The Guardian – Como é a cultura local?

KL –
 É a conjunção entre uma cultura de classe trabalhadora rica e antiga, por um lado, e uma situação socioeconômica difícil, por outro, o que tornou a cidade um lugar ideal para situar a ação do filme.

The Guardian - Você poderia ter dado o título ao seu filme de ‘’ um mundo livre com trabalhadores temporários ,’’ por exemplo. Por que você escolheu o trabalho de motorista de entrega domiciliar entre várias possibilidades de outras profissões?

KL - A profissão de motorista de entregas é   particularmente vulnerável. E não queríamos filmar dentro de um centro de distribuição porque seria exigido um local enorme que excedia o orçamento que tínhamos. A vantagem de encenar um motorista de entrega é eu ele dirige através da cidade. Isto permite esboçar um retrato dela e apresentar toda uma gama de habitantes através dos destinatários das encomendas que Ricky, o entregador, distribui: o homem deficiente a quem ele ajuda a transportar as malas, o torcedor de futebol...

The Guardian – Com este filme, os espectadores podem se sentir culpados por encomendar produtos pela Internet?

KL – O tema não é a moral individual, mas a grande transformação do mundo do trabalho. Empregos fixos, com duração de oito horas por dia, com pagamento suficiente para atender às necessidades das famílias, possibilitando planejar o futuro e encontrar habitação, são transferidos para empregos instáveis e inseguros onde se é obrigado a trabalhar 12 ou 14 horas por dia para ganhar um salário mínimo, sem seguro desemprego, licença remunerada ou salário doença. Em suma, onde todos os riscos passam a ser do funcionário. Esta transferência de poder dos trabalhadores para os empregadores impede que os sindicatos funcionem; eles tentam, mas não conseguem se organizar entre esses trabalhadores.

The Guardian – No filme, a única vez em que os sindicatos são mencionados é através do perfil de Molly, um cliente de Abbyativista sindical antigo, idoso, que fala sobre as grandes greves de 1984...

KL - Sim, esta é uma das chaves do filme, ou seja, a inevitável implantação do capitalismo. O próprio funcionamento do capitalismo provoca cenas de violência. É muito simples: se houver uma competição para ganhar contratos, é o mais barato que ganha; mas para oferecer os preços mais baixos você tem que cortar o custo do trabalho.

The Guardian – E como proteger os empregos?

KL - Você não pode proteger os empregos se você não planejar a economia. E você não pode planejar o que você não tem. Os empregadores recrutam empregados somente quando precisam. Usam trabalhadores temporários ou os chamados contratados por conta própria sem assumir qualquer responsabilidade por eles. Imitam seus concorrentes, porque caso contrário eles são eliminados da corrida. Infelizmente, acredito que os políticos estão perdendo este fenômeno. Agora, eles começam a falar sobre a reabilitação dos sindicatos. Muito bem. Mas eles não têm uma compreensão do que está acontecendo e como corrigi-lo. São as próprias fundações do mercado livre que devem ser abordadas. Esse é o ponto que estamos tentando sublinhar no nosso filme.


The Guardian - Você diz que o tema do filme não é a moral individual. Os personagens de Ricky e Abby estão lutando para permanecer humanos apesar de tudo. Ainda assim, Ricky não vacila quando um de seus colegas é demitido e ele pode obter o turno de trabalho dele.
KL - Sim, é tudo contraditório. Ricky ajuda, por exemplo, um homem que tem problemas de saúde para transportar seus pacotes; mas por outro lado é levado a não fazê-lo. O sistema atual incentiva as pessoas a serem concorrentes - não camaradas. Maloney, o gerente de armazém, tenta o tempo todo jogar os motoristas uns contra os outros: "Trabalhe duro e você terá um turno mais rentável; você terá benefícios extras, mais dinheiro."

The Guardian - Os membros das classes trabalhadoras que você mostra, no entanto, continuam demonstrando o que George Orwell chama de "decência comum." Eles se comportam humanamente. Mas isso não os impediu de votar em políticos que defendem a concorrência distorcida...

KL - É uma profunda contradição. Por que as pessoas votam contra os seus próprios interesses? É um problema tão antigo quanto o sufrágio universal: a classe dominante consegue manipular o voto das classes trabalhadoras.

The Guardian – Manipulação?

KL -
 Por que se demorou tanto para sair do feudalismo? Porque havia a igreja em particular, que incentivou as pessoas a permanecer no seu lugar. Hoje, ela foi substituída nesta função pela mídia. Então, por que as pessoas votam no fascismo? Por que eles estão votando em Le Pen? É uma pergunta difícil. A resposta envolve analisar os mecanismos de construção de consciência de classe, na minha opinião.

The Guardian - No entanto, no filme não há qualquer referência à política ou aos meios de comunicação.

KL - Discutimos muito sobre isto entre nós. O problema é que quisemos apresentar uma história simples que não é inequívoca em qualquer sentido. Se tivéssemos colocado nela um representante sindical, teria sido como se eu fosse o único a me dirigir ao público diretamente para pregar a boa palavra para a platéia. E eu teria matado o filme. Os espectadores odeiam que lhes diga o que pensar. Mas ao mesmo tempo tentamos despertar neles certa raiva; fazê-los terem a vontade de se sindicalizar, por exemplo. Estamos procurando tentando fazer o público se questionar, perguntar o que podemos fazer sobre tudo isso. Mas se lhes fornecemos a resposta, isso prejudicaria toda a energia do filme.

The Guardian - A revolta, especialmente a revolta adolescente, atravessa a sua filmografia. Sebastian, o filho mais velho, é de alguma forma o único personagem no filme que realmente se rebela contra o absurdo do sistema capitalista em que todos lutam.

KL - A adolescência é a idade em que o caráter é formado e o futuro surge em aberto: é importante e interessante escutar os adolescentes. Ao mesmo tempo, a maioria dos pais entra em tensão com seus filhos em algum momento. Aqui, é porque Ricky e Abby estão exaustos pelo seu trabalho: eles não estão em casa quando as crianças chegam da escola, ou mesmo mais tarde à noite. Não é uma situação extraordinária que estamos mostrando. Cada família se reconhece nela até certo ponto.

The Guardian - Por que você escolheu uma família que não pertence à parcela mais baixa das classes sociais, mas uma que pode ser chamada de classe média mais baixa?

KL - Isso mesmo, não é a classe trabalhadora absoluta. Mas depende de como se define uma classe social. Existem diferentes níveis de pobreza dentro da classe trabalhadora. A família que mostramos faz parte, entretanto, da classe trabalhadora. São trabalhadores que não controlam sua ferramenta de produção.

The Guardian - Mas eles não têm dificuldades como alguns dos personagens de seus filmes anteriorescomo Daniel Blake ...

KL - Sim, isso é exatamente o que temos tentado mostrar: é uma boa família. Ricky e Abby estão animados. Eles querem trabalhar e são capazes disso. Eles cuidam de seus filhos, não usam drogas, não jogam dinheiro fora... Todos os ingredientes para uma vida familiar bem-sucedida estão reunidos. Exceto o fato de eles trabalharem tempo demais. Não têm segurança no trabalho nem todos os direitos conquistados pelos sindicatos como, por exemplo, um dia de oito horas, um salário decente. É por isso que o sistema os destrói de qualquer maneira.

The Guardian - Você mostra a ambivalência das novas tecnologias. Elas dizem aos funcionários o que fazer, dizem que eles podem enriquecer com a vida cotidiana. Qual é o papel do digital nesta transformação do capitalismo que você está tentando mostrar?

KL - Ricky é controlado permanentemente. Ele sabe que a qualquer hora do dia se sabe onde ele está e verifica-se, em tempo real, se cada entrega foi feita. Lembra aqueles que chicoteavam os escravos nas galeras. É a pior forma de agir do capataz nas linhas de produção. A tecnologia deve pertencer aos povos; não é para usá-los, para escravizá-los.

The Guardian - Você terá escolhido papéis muito estereotipados como a mãe assistente de enfermagem, o filho rebelde, a filha dócil? Você acha que o gênero é uma questão importante ou você vai atrás das relações de classe?

KL - Eu acho que é um problema quando as pessoas não são tratadas de forma justa e há desigualdades em termos de direitos e em termos de remuneração. Entre os motoristas de entrega a domicílio do filme há algumas mulheres; tentamos refletir o mundo social como ele é. Alguns dos cuidadores (personagem da mãe, por exemplo) são do sexo masculino, especialmente para cuidar de pessoas que precisam ser fìsicamente assistidas.

The Guardian - Você conhece o (diretor francês) Robert Guediguian? Na França, com frequ~encia, os seus filmes são comparados aos dele. Vocês dois, às vezes, são acusados de "compassivos" porque basicamente as pessoas, sem seus filmes, são "boas’’. O que você diz àqueles que o acusam de ser demasiado otimista em relação à natureza humana?

KL - Acho que as pessoas que dizem isso certamente tiveram más experiências. Em nossos filmes estamos simplesmente tentando refletir o mundo como o vemos. E acho que as pessoas costumam ser como as que mostramos. Sugiro àqueles que não estão convencidos disso de irem ao encontro de homens e mulheres em profissões comuns. Eles vão ver que essas pessoas se comportam principalmente de uma forma amigável e não hostil.

The Guardian - Você fez poucos documentários em sua carreira, e preferiu a forma da ficção. Por quê?

KL - Fizemos um documentário sobre o governo britânico de 1945, O espírito de 45, que tratou do período pós-guerra imediato, quando Churchill foi derrotado na eleição geral, e todos pensavam que ele seria reeleito. Era o grande líder da guerra. Mas as pessoas se lembraram, quando votaram, da década de 1930, do desemprego endêmico, da pobreza. Eles queriam um governo trabalhista que construiu o chamado Estado de Bem-Estar, que nacionalizou as grandes indústrias, a energia, a água... O documentário queria capturar esta respiração, mas também a maneira pela qual todo este edifício foi destruído - ou pelo menos tentou ser destruído – com o governo Thatcher. Além do mais, ficção permite mais complexidade.

The Guardian – Qual o valor do documentário e o da ficção?

KL - Documentários e ficções são apenas dois gêneros diferentes. Cada um tem o seu valor. Impossível dizer se um é melhor do que o outro. Fizemos um documentário sobre a grande greve dos mineiros de 1984, talvez o evento mais decisivo no Reino Unido desde a Segunda Guerra Mundial. Uma vez eleita, a estratégia de Margaret Thatcher foi lutar contra a classe trabalhadora de frente. E os canais de TV se recusaram a transmitir esse nosso documentário...

The Guardian – Mas e em termos de valor? Doc ou ficção?

KL - 
Com o documentário as mensagens podem ser transmitidas de forma muito direta enquanto a ficção nos permite explorar a complexidade das relações e as interações entre as pessoas, ao mesmo tempo em que ela lida com o contexto social mais geral. Podemos, assim, mostrar tanto os debates de idéias e os sentimentos, e a psicologia que anima cada um dos personagens. É a mesma diferença que existe entre ensaios e romances. De alguma forma a ficção permite mais complexidade.

The Guardian - Considera que o seu cinema é político?

KL – Meus dois filmes mais recentes coincidiram com a ascensão de Jeremy Corbyn. Ele é um líder. Na verdade, é um homem de esquerda. Eu apoio Jeremy Corbyn – a ele e ao seu programa. E acredito que cada um dos nossos atos pode refletir a nossa sensibilidade política, inclusive no cinema: o assunto que escolhemos para lidar, os personagens que colocamos na tela... e ilustrar o que é importante para o autor. Tudo isso tem implicações políticas porque se você não se sente preocupado com a desigualdade, a exploração, as consequências do imperialismo e o sofrimento dos outros, isto aparecerá no trabalho. Você se afastar de tudo isso, é uma escolha política! Todo filme é um ato político.

Sorry We Missed You - trailer legendado (direção de Ken Loach)