Do Greenpeace
Nos tempos coloniais, as florestas não passavam de grandes embaraços. Seu destino era certo: ser derrubadas em prol da agricultura e o desenvolvimento. Cinco séculos e muitas machadadas mais tarde, sobraram 7% de mata atlântica em território nacional. E o binômio que fez muita floresta cair naquela época agora avança sobre a Amazônia.
Se antes a ignorância justificava o desmatamento, hoje há estudos de sobra mostrando que as matas brasileiras são muito mais que uma bela paisagem. Apesar de os tempos serem outros, há quem ignore os avisos e prefira a ignorância. No Congresso, a bancada da motosserra move mundos e fundos para derrubar o Código Florestal brasileiro, lei criada em 1934 e reformulada em 1965.
Em entrevista ao Greenpeace, o professor da UFRJ e historiador ambiental José Augusto Pádua explica que a mentalidade de muita gente parou na história: "Não tem sentido, em pleno século 21, ver a Amazônia como um embaraço gigantesco."
Nos seus estudos sobre a história ambiental brasileira, você fala de um tempo em que terra com floresta era terra suja. Esse tempo acabou?
José Augusto Pádua: A sensação que os colonizadores tiveram, ao chegar aqui, foi de uma terra aberta, sem fronteiras. Um oceano sem fim por onde podiam avançar. Esse mito da natureza sem limites se associou à depreciação da vegetação nativa. O que valia era açúcar, café. A floresta não tinha valor. Hoje em dia, com tudo o que se conhece sobre ecologia, importância climática e da biodiversidade, essas ideias deveriam estar completamente superadas. Mas não estão. A mata atlântica parecia inesgotável e hoje está aí, reduzida a menos de 10%. E hoje as pessoas ainda dizem que vão limpar a terra para plantar. A natureza, então, é suja?
O modelo atual de produção no campo traz sequelas dessa época?
Nossa colonização deixou marcas muito profundas, claras na maneira destrutiva como nos relacionamos com a floresta. O modelo predatório e de expansão horizontal aplicado hoje se baseou na disponibilidade de terra, na possibilidade de se apropriar de área florestada para desmatar e conduzir uma atividade econômica. Os poderosos recebiam terras de sesmarias ou ocupavam. Com o uso predatório, essas propriedades ficavam imprestáveis em pouco tempo e eles requeriam ao Estado novas áreas para avançar, argumentando que a terra estava estragada. Muitas vezes nem pediam, iam avançando.
Avançando sobre terras como ainda hoje acontece.
Sim. Essa mentalidade arcaica permanece. Argumentos daquela época são usados até hoje, como o de que com conservação vai haver falta de alimentos. Esse tipo de argumento precisa ser desmistificado. Ainda vemos uma produção nômade, avançando para os lados, como se o espaço disponível para a agropecuária fosse pequeno. Não faz sentido abrir nem mais um hectare de floresta. É um absurdo essa choradeira de que não tem terra disponível para explorar. Setecentos mil quilômetros quadrados é tamanho mais que suficiente. Poderíamos ter a pecuária usando áreas muito menores e bem mais produtivas. Alguns setores mais modernos já estão nesse caminho. Mas, para isso, seria preciso cuidar do solo, educar as pessoas. É mais barato queimar e seguir em frente, e a área antes usada fica parada, aberta e degradada.
Há quem diga que o Código Florestal está atrasado.
Pelo contrário. A atual legislação é fundamental e aponta para o futuro. Não dá para continuar usando a floresta da maneira como ela era usada. Não podemos repetir na Amazônia o que foi feito na mata atlântica. Temos de acabar com essa mentalidade colonial de crescimento para os lados. A floresta não tem, necessariamente, de ser destruída passo a passo para dar lugar à agricultura e à pecuária. Não tem sentido, em pleno século 21, ver a Amazônia como um embaraço gigantesco.
A legislação brasileira demorou a olhar para as florestas?
Existe muito material do período colonial sobre natureza no Brasil, mas a grande maioria isola os elementos da floresta. Havia muita coisa sobre espécies de árvores, de animais, pois era algo mais voltado para o uso econômico delas. Desde essa época existiam legislações para maximizar o uso dos recursos naturais valiosos. Não era uma questão de preservar a floresta para a saúde do território. O Código Florestal de 1934 foi a primeira tentativa nesse sentido, apesar de também trazer, ainda, uma visão econômica para uma melhor gestão dos recursos. O código veio avançando de lá para cá. Hoje, ele tem uma concepção ecológica bem mais forte.
Nos tempos coloniais, as florestas não passavam de grandes embaraços. Seu destino era certo: ser derrubadas em prol da agricultura e o desenvolvimento. Cinco séculos e muitas machadadas mais tarde, sobraram 7% de mata atlântica em território nacional. E o binômio que fez muita floresta cair naquela época agora avança sobre a Amazônia.
Se antes a ignorância justificava o desmatamento, hoje há estudos de sobra mostrando que as matas brasileiras são muito mais que uma bela paisagem. Apesar de os tempos serem outros, há quem ignore os avisos e prefira a ignorância. No Congresso, a bancada da motosserra move mundos e fundos para derrubar o Código Florestal brasileiro, lei criada em 1934 e reformulada em 1965.
Em entrevista ao Greenpeace, o professor da UFRJ e historiador ambiental José Augusto Pádua explica que a mentalidade de muita gente parou na história: "Não tem sentido, em pleno século 21, ver a Amazônia como um embaraço gigantesco."
Nos seus estudos sobre a história ambiental brasileira, você fala de um tempo em que terra com floresta era terra suja. Esse tempo acabou?
José Augusto Pádua: A sensação que os colonizadores tiveram, ao chegar aqui, foi de uma terra aberta, sem fronteiras. Um oceano sem fim por onde podiam avançar. Esse mito da natureza sem limites se associou à depreciação da vegetação nativa. O que valia era açúcar, café. A floresta não tinha valor. Hoje em dia, com tudo o que se conhece sobre ecologia, importância climática e da biodiversidade, essas ideias deveriam estar completamente superadas. Mas não estão. A mata atlântica parecia inesgotável e hoje está aí, reduzida a menos de 10%. E hoje as pessoas ainda dizem que vão limpar a terra para plantar. A natureza, então, é suja?
O modelo atual de produção no campo traz sequelas dessa época?
Nossa colonização deixou marcas muito profundas, claras na maneira destrutiva como nos relacionamos com a floresta. O modelo predatório e de expansão horizontal aplicado hoje se baseou na disponibilidade de terra, na possibilidade de se apropriar de área florestada para desmatar e conduzir uma atividade econômica. Os poderosos recebiam terras de sesmarias ou ocupavam. Com o uso predatório, essas propriedades ficavam imprestáveis em pouco tempo e eles requeriam ao Estado novas áreas para avançar, argumentando que a terra estava estragada. Muitas vezes nem pediam, iam avançando.
Avançando sobre terras como ainda hoje acontece.
Sim. Essa mentalidade arcaica permanece. Argumentos daquela época são usados até hoje, como o de que com conservação vai haver falta de alimentos. Esse tipo de argumento precisa ser desmistificado. Ainda vemos uma produção nômade, avançando para os lados, como se o espaço disponível para a agropecuária fosse pequeno. Não faz sentido abrir nem mais um hectare de floresta. É um absurdo essa choradeira de que não tem terra disponível para explorar. Setecentos mil quilômetros quadrados é tamanho mais que suficiente. Poderíamos ter a pecuária usando áreas muito menores e bem mais produtivas. Alguns setores mais modernos já estão nesse caminho. Mas, para isso, seria preciso cuidar do solo, educar as pessoas. É mais barato queimar e seguir em frente, e a área antes usada fica parada, aberta e degradada.
Há quem diga que o Código Florestal está atrasado.
Pelo contrário. A atual legislação é fundamental e aponta para o futuro. Não dá para continuar usando a floresta da maneira como ela era usada. Não podemos repetir na Amazônia o que foi feito na mata atlântica. Temos de acabar com essa mentalidade colonial de crescimento para os lados. A floresta não tem, necessariamente, de ser destruída passo a passo para dar lugar à agricultura e à pecuária. Não tem sentido, em pleno século 21, ver a Amazônia como um embaraço gigantesco.
A legislação brasileira demorou a olhar para as florestas?
Existe muito material do período colonial sobre natureza no Brasil, mas a grande maioria isola os elementos da floresta. Havia muita coisa sobre espécies de árvores, de animais, pois era algo mais voltado para o uso econômico delas. Desde essa época existiam legislações para maximizar o uso dos recursos naturais valiosos. Não era uma questão de preservar a floresta para a saúde do território. O Código Florestal de 1934 foi a primeira tentativa nesse sentido, apesar de também trazer, ainda, uma visão econômica para uma melhor gestão dos recursos. O código veio avançando de lá para cá. Hoje, ele tem uma concepção ecológica bem mais forte.
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