Os críticos do marxismo, e em geral de qualquer proposta de esquerda, não poupam esforços para assinalar que as deformações cristalizadas no "marxismo-leninismo" são apenas o produto inevitável das sementes fortemente dogmáticas e autoritárias contidas na obra de Marx e potencializadas pelo "despotismo aiático" supostamente alojado na personalidade de Lenin. Para eles, o stalinismo, com todos os seus horrores, é apenas o resultado natural do totalitarismo inerente ao pensamento de Marx e à teorização e à obra prática de Lenin. Nada mais distente da verdade. Na realidade, o "marxismo-leninismo" é um produto antimarxista e antileninista por natureza. (...)
Uma oportuna e necessária "volta a Lenin" não tem nada a ver, portanto, com um retorno ao leninismo codificado pelos acadêmicos soviéticos, e sim com uma nova releitura do brilhante político, intelectual e estadista que, com a Revolução Russa, inaugurou uma nova etapa na história universal. Voltar a Lenin não significa, pois, o retorno a um texto sagrado, mumificado e encarquilhado, mas o regresso a uma fonte inesgotável de que brotam perguntas e questões que conservam sua atualidade e importância ainda hoje. (...)
Se há algo que caracteriza a obra de Lenin é a inseparável unidade entre sua atividade teórica e sua prática política. Como bem demonstrou Georg Lukács, em seu livro sobre Lenin, o fundador do Estado soviético é o "grande teórico da prática e o grande prático da teoria". Suas contribuições teóricas fundamentais sobre o partido revolucionário, o imperialismo e a aliança operário-camponesa foram, por sua vez, verdadeiros "guias para a ação em três conjunturas políticas muito concretas: no início do século XX, para combater o revisionismo; no período próximo à primeira revolução russa, em 1905; e, é obvio, na crise revolucionária geral que estala em fevereiro de 1917 e culmina com o triunfo da insurreição soviética em outubro do mesmo ano. Essa íntima relação entre os imperativos da ação revolucionária e a reflexão teórica de grande fôlego, realizada em meio à vertigem revolucionária, é que nos dá uma das chaves de sua permanência como um clássico do pensamento não só marxista, mas também do pensamento político em seu sentido mais amplo.
Fonte: Boron, Atilio A. "Estudo introdutório - Atualidade de Que fazer?". In: LENIN, V.I. Que fazer?: a organização do sujeito político. São Paulo: Martins, 2006. pp. 20, 21 e 73.
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