Por Marcos Cesar de Oliveira Pinheiro
Primeiramente, quero registrar meu total apoio e solidariedade com a professora envolvida no lamentável espetáculo patrocinado pela mídia, que ganhou repercussão nacional. Tenho a oportunidade de conviver com a referida professora ao longo dos oito anos em que exerço o magistério em Rio das Ostras. Posso afirmar que ela sempre procurou exercer o seu ofício com dignidade apesar das adversidades que nós professores estamos submetidos. Como, por exemplo, a baixa remuneração, que impõe a necessidade de jornadas de trabalho exaustivas e improdutivas, no intuito de se alcançar uma renda minimamente digna e, consequentemente, conduz a uma queda significativa na qualidade do trabalho educativo destes profissionais. Sem contar a perda de prestígio social da carreira de educador - talvez, por isso, muitos professores em cargos comissionados achem humilhante retornar para a sala de aula, que consideram um castigo, estar no próprio inferno. Dessa forma, fora de sala de aula fica muitíssimo fácil julgar o trabalho de quem está vivendo no "inferno".
Hoje, 31/08/2012, estive com a referida professora para transmitir o apoio e a solidariedade de diversos colegas de trabalho da rede municipal de ensino desta cidade, em especial os professores do Colégio Municipal Professora América Abdalla e da Escola Municipal Padre José Dilson Dórea. Ouvindo a versão da professora e de outras pessoas que testemunharam os acontecimentos, segue um relato do que de fato ocorreu. Ao final da aula, enquanto a professora fazia a chamada, os dois alunos começaram a se agredir. Infelizmente o vídeo não mostra a professora pedindo o auxílio da agente escolar (inspetora do corretor), que ao separar a briga levou um soco no braço esquerdo. Os alunos foram encaminhados à direção. Aliás, os alunos sairam de sala como se nada tivesse acontecido. Porém a diretora não estava na escola (parece que foi fazer a revisão do carro), assim nenhuma providência pôde ser tomada por parte da direção da unidade escolar e o assunto morreu. Os alunos retornaram para a aula do professor seguinte. Quando a diretora retornou, foi comunicada pela agente escolar do ocorrido. A diretora perguntou se já estava tudo bem e o assunto morreu. Não se tinha conhecimento que um aluno da turma filmou a tal briga. Nesta última terça-feira (28/8), começou a repercussão do vídeo postado na internet, que ganhou visibilidade na mídia, em especial nos programas jornalísticos da Rede Globo de Televisão.
A partir daí, surgiram as versões apresentadas na reportagem: que a briga se deu por causa de um lápis (o que não é verdade); que a professora foi negligente; os depoimentos dos alunos sobre a conduta da professora (nenhum deles pertencem a turma em que ocorreu a briga); a diretora afirma ser um caso isolado, o que não é verdade (lecionei por oito anos seguidos no Colégio Municipal Professora América Abdalla, até o último dia 26 de abril); é explícita a tentativa da dirigente da unidade escolar em transferir para a professora a responsabilidade pelo ocorrido e assim tentando escamotear a constante violência presente nas escolas, em especial neste Colégio, pela falta de se garantir um mínimo de respaldo à autoridade dos professores.
Com o espetáculo promovido pela mídia, a direção do Colégio Abdalla apresentou uma série de medidas que seriam desenvolvidas, como consta em reportagem no jornal RJNEWS (31 de agosto a 06 de setembro). É impressionante como os alunos são bem assistidos - não pude evitar o sarcasmo.
O poder público propagandeia muito suas iniciativas e investimentos em educação, mas quase nada acontece efetivamente. É incapaz de se dirigir às causas que afligem a educação mas permanece aprisionado no círculo vicioso dos efeitos condenados. Os interesses pessoais daqueles "educadores" em cargos comissionados prevalecem sobre a demanda de se construir uma escola pública, gratuita, verdadeiramente democrática, laica, universal e de qualidade. Não surpreende, portanto, a recorrente tentativa de crucificar os professores para redimir a educação de seus pecados. É mais fácil culpá-los do que colocar o dedo na ferida dos reais problemas da educação.
Vejam a fala da secretária de Educação de Rio das Ostras, ao tentar encontrar uma explicação para a queda do Ideb do município:
"As aulas precisam ser motivadoras, depende muito da atuação do professor. Sabemos que as escolas estão equipadas para isso" (jornal RJNEWS, 24/8 a 30/8/2012)Mais uma vez a culpa é do professor. Não sei se é pra rir ou pra chorar. Nas duas escolas onde trabalho não tem caneta de quadro branco para o professor. Sabe de quem é a culpa??? Do professor. Por quê??? Ele não tem o compromisso suficiente para tirar do próprio bolso e adquirir uma caneta. Esta é a lógica da Secretaria de Educação: se não der para escamotear os problemas das escolas, jogue a culpa no professor.
Parabéns aos professores do Colégio Municipal Professora América Abdalla, que se posicionaram de maneira firme e enérgica em defesa da professora envolvida no lamentável espetáculo midiático. Tenho orgulho de ter pertencido a esse corpo docente. Como também estou orgulhoso de compor a equipe combativa de professores da Escola Municipal Padre José Dilson Dórea, que não vacilou em declarar imediatamente apoio à professora e aos companheiros do Abdalla nesta luta incessante em defesa da dignidade da categoria.
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