Por Carl Zimmer
The New York Times
Achado sugere que espécies de hominídeos deixaram a África muito antes do que se acreditava |
Segundo relatos científicos recentes, as ferramentas de pedra mais antigas fora da África foram descobertas no oeste da China. Feitas por antigos membros da linhagem humana, os chamados hominídeos, estima-se que tenham cerca de 2,1 milhões de anos.
O achado pode adicionar um novo capítulo à história da evolução hominídea, sugerindo que algumas dessas espécies deixaram a África muito antes do que se acreditava, conseguindo viajar quase 13 mil quilômetros a leste de seu local de origem.
A idade das ferramentas chinesas sugere que os hominídeos que as fizeram não eram altos e não tinham o cérebro grande. Em vez disso, podem ter sido pequenos macacos bípedes, com cérebro do tamanho do de um chimpanzé.
"As implicações disso são enormes. Temos que reavaliar nossa compreensão da pré-história humana na Eurásia", disse Michael Petraglia, paleoantropólogo do Instituto Max Planck de Ciência da História Humana, que não estava envolvido no novo estudo.
A linhagem humana surgiu na África; nossos ancestrais modernos se separaram dos chimpanzés há mais de 7 milhões de anos, mas há tempos os cientistas sabem que a Ásia tem uma longa história humana.
Em 1891, o explorador holandês Eugene Dubois descobriu um crânio humanoide na Indonésia, cuja idade foi avaliada em 500 mil anos. Mais tarde, os paleoantropólogos chamaram o crânio de Dubois de Homo erectus, uma espécie encontrada posteriormente em muitos outros locais em toda a Ásia; alguns espécimes chegavam a ter 1,6 milhão de anos.
Os fósseis asiáticos mostraram que esses hominídeos tinham a altura de seres humanos vivos e cérebros razoavelmente grandes. O cérebro dos chimpanzés tem um terço do tamanho do nosso, mas o do Homo erectus tinha cerca de dois terços.
Na África, os paleoantropólogos descobriam um registro fóssil ainda mais distante de hominídeos; o mais antigo data de mais de 6 milhões de anos.
Os primeiros hominídeos talvez andassem sobre duas pernas, mas eram baixos e tinham o cérebro do tamanho do dos chimpanzés. Há 1,9 milhão de anos, o Homo erectus, ou algum parente próximo, caminhava pela África Oriental.
Muitos paleoantropólogos chegaram a supor que o Homo erectus foi o primeiro migrante a deixar a África, mas dúvidas começaram a surgir na década de 1990, quando ossos de hominídeos mais antigos foram descobertos em outras partes da Ásia.
Em Dmanisi, Geórgia, os cientistas descobriram fósseis notavelmente antigos, alguns com até 1,7 milhão de anos. Ferramentas de pedra encontradas lá pareciam ser ainda mais velhas: 1,8 milhão de anos.
Os Dmanisi hominins não se pareciam muito com o Homo erectus: eram baixos e tinham cérebros minúsculos.
Na China, os pesquisadores também encontraram evidências da ocupação hominídea precoce. Em 1964, desenterraram um crânio de Homo erectus na região ocidental chamada Lantian, e cujas estimativas iniciais determinaram sua idade: 1,15 milhão de anos.
Mas, em 2001, Zhaoyu Zhu, geólogo da Academia Chinesa de Ciências em Guangzhou, e seus colegas iniciaram uma nova análise do local do fóssil, determinando que o crânio de Lantian era de fato muito mais velho: 1,6 milhão de anos.
Nas pesquisas na região em torno do fóssil, Zhu e seu grupo também se depararam com o que pareciam ser antigas ferramentas de pedra enterradas a 200 metros de profundidade, ao lado de uma ravina.
Os pesquisadores decidiram fazer uma busca minuciosa no local, escalando a encosta íngreme para procurar mais artefatos. "O sobe e desce lá às vezes dava medo", disse Robin Dennell, paleoantropólogo na Universidade de Exeter que se juntou à equipe de Zhu em 2010.
Mas o risco valeu a pena: os pesquisadores encontraram mais de cem ferramentas de pedra enterradas em 17 camadas geológicas da encosta.
O trabalho foi extremamente lento porque os pesquisadores queriam ter certeza de que escavavam ferramentas feitas por hominídeos, e que eram realmente antigas.
"Queríamos que não houvesse sombra de dúvida", disse Dennell.
No novo estudo, ele e seus colegas argumentam que as pedras não poderiam ter sido naturalmente moldadas. As rochas circundantes se formaram a partir do solo fofo, que não contém pedras do tamanho e da forma das ferramentas.
Em vez disso, argumentam que os hominídeos de Lantian devem ter viajado longas distâncias, buscando córregos de montanhas para encontrar as pedras certas para fazer ferramentas. Eles carregavam as ferramentas para usá-las na coleta de alimentos, talvez utilizando as mais afiadas para retirar a carne das carcaças.
Para determinar a idade das ferramentas, os pesquisadores se aproveitaram do campo magnético do planeta.
De vez em quando ele se inverte, transformando o norte em sul. Os minerais magnéticos no solo e no oceano se alinham com o campo, ou seja, mesmo quando estão presos em rochas, apontam na direção certa.
Os geofísicos determinaram com precisão os momentos dessas alterações, que ocorreram ao mesmo tempo em todo o planeta, pois é uma maneira útil de datar o material encontrado em camadas de rocha.
As camadas da encosta se formaram ao longo de centenas de milhares de anos, e as ferramentas mais antigas foram cuidadosamente prensadas entre as rochas formadas entre duas alterações do campo magnético – uma há 2,1 milhões de anos e a segunda há cerca de 1,8 milhão.
Dennell e seus colegas estimam que as ferramentas estejam próximas do limite dessa janela: 2,1 milhões de anos. Isso as transformaria na evidência mais antiga de hominídeos já encontrada fora da África.
E faz com que seja improvável que o primeiro hominídeo a deixar a África tenha sido o Homo erectus. Dennell especula que o fenômeno tenha ocorrido com um ramo muito antigo da árvore humana.
O que originou essa migração? Talvez a necessidade de descobrir como fazer ferramentas afiadas de pedra.
"De repente você tem um primata que conseguia retirar a carne de uma carcaça, e isso abriu um novo mundo para eles. Essa tecnologia simples foi suficiente para que saíssem da África e atravessassem a Ásia", disse Dennell.
Rick Potts, chefe do Programa de Origens Humanas do Instituto Smithsonian, achou o novo estudo convincente, oferecendo fortes evidências de que as pedras eram de fato ferramentas e que eram extremamente antigas. "Acho que eles conseguiram", afirmou.
Porém, Potts não acredita que os hominídeos de Lantian fossem baixos e com um cérebro pequeno, sugerindo que haja fósseis de Homo erectus com mais de 2,1 milhões de anos esperando para serem descobertos na África.
Mas John J. Shea, paleoantropólogo na Universidade Stony Brook, ainda não se convenceu de que alguém tenha trabalhado as pedras. "No mínimo, Dennell e seus colegas precisam fazer uma comparação estatística entre essas supostas ferramentas e rochas naturalmente danificadas", argumentou.
Ele prefere não depender apenas das ferramentas para ter evidências de que hominídeos chegaram à Ásia há mais de 2 milhões de anos.
"Basicamente, a ideia é a seguinte: se não há fósseis, não há hominídeos", disse.
Como os paleoantropólogos já encontraram um crânio de 1,6 milhão de anos na província de Lantian, Dennell disse que era possível que um fóssil muito mais antigo seja encontrado na área onde as ferramentas foram achadas.
"Sabemos que vai levar algum tempo, mas vale a pena procurar", disse ele.
FONTE: UOL notícias Ciência e Saúde
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