sexta-feira, 16 de outubro de 2015

Texto de Fernando Morais, autor do livro "Olga", sobre a biografia "Luiz Carlos Prestes: um comunista brasileiro"


Durante décadas muitos autores brasileiros de não ficção alimentaram a esperança de fazer uma biografia de Luiz Carlos Prestes. Eu mesmo, desde o dia em que o conheci, num ensolarado 1º de maio, em Havana, em 1977, tentei em várias ocasiões seduzir o Cavaleiro da Esperança para o projeto. Em todas as vezes, a resposta era a mesma: não. O privilégio de escrever a biografia de Prestes recaiu sobre sua filha, a respeitada historiadora Anita Leocadia Prestes. Além da circunstância familiar, Anita trabalhou como assistente do pai de 1958 até a morte dele, em 1990. Durante esses 32 anos ela teve a possibilidade de se aprofundar “no estudo de cada período da vida desse personagem singular da história do Brasil”. Com este livro, Anita supre uma lacuna acerca de uma existência que, a partir de 1930, se confunde com a do Partido Comunista Brasileiro. Pela narrativa, é possível acompanhar os bastidores de seis décadas de vida do PCB, com seus rachas internos, conferências clandestinas, purgas e autocríticas. Este, porém, não é apenas um livro sobre Prestes ou sobre o Partidão, mas sobre o Brasil. Para muitos biógrafos, um personagem só se torna importante se, por meio de sua trajetória, for possível contar uma história do Brasil que nos tenha sido sonegada nos bancos de escola. Se isso é verdade, este livro cumpre sua função. Pela mão de Prestes, Anita Leocadia realiza uma extensa, minuciosa e detalhada viagem pelo Brasil do século XX, do movimento tenentista à redemocratização pós-ditadura militar. A soma desses ingredientes torna Luiz Carlos Prestes: um comunista brasileiro uma obra indispensável. - Fernando Morais (texto de contracapa do livro)

Texto de orelha
 
Difícil, muito difícil a vida de um comunista no Brasil. Quando o brilhante jornalista Astrojildo Pereira – reunindo um grupo de companheiros – fundou o Partido Comunista em Niterói, em março de 1922, não podia imaginar que esse agrupamento político iria permanecer ilegal até 1985, com a exceção de apenas dois anos entre 1945 e 1947. Ou seja, 61 anos de clandestinidade, fato único em todo o planeta! Pertencer a esse partido significava exclusão social, perda de emprego, exílio, prisão, tortura e morte. Mesmo assim, muitos militantes afluíram a suas filas, convencidos de que era o melhor instrumento para conseguir um Brasil digno, independente e igualitário. Por mais de quatro décadas, Luiz Carlos Prestes foi para esses militantes o líder a ser admirado e seguido. Seu prestígio espraiou-se além das fronteiras, tornando-se conhecido em plagas distantes. Sua longa vida foi pontilhada por decisões complexas e mesmo dolorosas. Seguramente cometeu erros de análises e de ação, porém, jamais traiu, nem por um minuto, os ideais que abraçou nos anos 1930.
 
A autora deste livro teve a coragem e o desafio de enfrentar o trabalho gigantesco de fazer aflorar o pensamento e a prática política de Luiz Carlos Prestes. E isso com uma profundidade teórica e uma riqueza de fontes impressionante – a historiadora Anita Leocadia Prestes, além de filha, foi por anos secretária do Cavaleiro da Esperança. Inúmeros são os aspectos que merecem ser esmiuçados. Aceno a apenas um deles: o caráter da ditadura implantada em 1964. Esse é um assunto que divide os historiadores até os dias de hoje. Na direção e na militância do PCB desenvolveu-se um animado debate sobre o tema, definindo-o, de forma nebulosa, como regime fascistizante, de tipo fascista, fascismo dependente ou militar-fascismo. Pode parecer uma questão secundária, mas a correta definição do regime condicionava a política de alianças, a tática, o tipo de organização clandestina necessária e mesmo perspectivas estratégicas à época. São elementos que acabaram por contribuir com a ruptura do partido e condicionaram a transição democrática nos anos 1980.
 
Como diz Anita, esta é uma biografia política, com acenos ao pessoal. Permitam-me, então, dizer algo sobre este último aspecto. Frequentemente a figura do biografado é vista como autoritária, fechada, distante. Não foi a minha experiência nas muitas vezes que o encontrei. Recordo-me que em 1967, depois de uma áspera discussão no Comitê Estadual do PCB de São Paulo, tive de ficar de guarda à noite. Prestes procurou-me para discutir a questão da luta armada, que eu defendia. Falou-me da Coluna, de 1935, das dificuldades em trilhar o caminho armado. Eu era um jovem dirigente, que contava muito pouco, mas ele encontrou tempo para fornecer suas experiências, e vi em Prestes uma verdadeira angústia de que nós, jovens, entrássemos em uma linha que nos levaria à morte. Não me convenceu, mas fiquei grato, por toda a vida, por aquele gesto.
 
José Luiz Del Roio
 
Ficha técnica
 
Título: Luiz Carlos Prestes: um comunista brasileiro
Autor: Anita Leocdia Prestes
Orelha: José Luiz Del Roio
Quarta capa: Fernando Morais
Páginas: 608
Preço: R$ 48
ISBN: 978-85-7559-449-0
Editora: Boitempo

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