sábado, 5 de outubro de 2013

"O Capital", novo filme de Costa-Gavras

"Continuaremos roubando dos pobres para dar aos ricos" é a frase que estampa os cartazes de "O Capital", novo filme de Costa-Gavras, que estreia nesta sexta-feira (4) nos cinemas brasileiros.



Constantin Costa-Gavras descarta a bandeira de "cineasta político". "Faço filmes sobre o que vejo", diz. "Mas todos os filmes são políticos. Não há nada mais político do que um filme de super-herói."

Em 2012, Gavras adaptou o romance "Le Capital", do francês Stéphane Osmont. O resultado, "O Capital", retrata a sobreposição dos bancos à democracia pela perspectiva de um ambicioso executivo.

Assista abaixo o trailer do filme "O Capital":




Leia a seguir trechos da entrevista que ele concedeu por telefone à Folha de São Paulo (21/5/2013) 

Folha - De onde nasceu a ideia para filmar "O Capital"?

Costa-Gavras - O filme começou a ser produzido antes da crise de 2008, pois queria retratar os riscos de endividamento que a Europa enfrenta já há vários anos. Essa preocupação levou-me a ler muitos romances com viés econômico, entre eles o de Osmont, que era assessor financeiro de algumas das maiores empresas da Europa.


O que há de marxista no filme?

Nada muito além do título. Nos dois casos, fala-se do dinheiro e do perigo da sua acumulação, mas o filme não é uma condenação ao capitalismo, apenas ao modelo atual. O dinheiro é um instrumento extraordinário, permite a comunicação, as trocas. Mas também é um mecanismo de corrupção.

O sistema financeiro criou uma nova estrutura de poder?

Em parte, sim --e a obscenidade dessa nova forma de poder me causa indignação. A situação da Grécia, por exemplo, é realmente trágica.


Os países ricos da Europa estimularam o endividamento dos mais pobres, com o único objetivo de vender seus produtos. O capitalismo europeu não é tão agressivo quanto o americano, mas a Europa se tornou um grande supermercado.

A União Europeia está condenada se seguir assim. Os criadores do bloco queriam uma Europa política, social, cultural e econômica.

As maiores indústrias do continente hoje, porém, são as de produtos inacessíveis à maioria das pessoas. Quando eu era jovem, dizia-se que era preciso uma classe média forte para garantir a estabilidade, mas a classe média está cada vez menor e mais endividada.

Mas é possível enxergar uma solução para essa crise?

As soluções devem partir dos economistas e das pessoas em quem votamos. Um cineasta apenas faz as perguntas certas. Nem todo político é corrupto, ainda que eles costumem ter uma debilidade que resulta de pensar apenas em ser eleitos.


Suas obras costumam ser identificadas como filmes políticos. Isso o incomoda?

É um conceito estranho, pois todos os filmes são políticos. Não há nada mais político do que um filme de super-herói, com um carro potente e salvando mocinhas indefesas. O impacto que o cinema de puro entretenimento exerce sobre as gerações é incalculável. Faço filmes sobre o que me inquieta. E só.


Suas inquietações se enquadram em alguma ideologia?

Minha mãe sempre me dizia: "Nunca se meta com política!". Jamais pertenci a um partido ou defendi uma ideologia, mas é preciso se posicionar, deixar claro se você está do lado do mais forte ou do mais fraco. A indiferença é confortável, mas paga-se um preço muito alto por ela.


É possível fazer filmes sem financiamento do governo?

Não há cinema sem apoio público. Nem nos Estados Unidos. Vejo, porém, uma geração de cineastas se valendo das facilidades tecnológicas para criar vozes próprias. Alguns são tão competentes que o Estado vai buscá-los.


Seus filmes já falaram de ditaduras, do Holocausto e do capitalismo. O que resta filmar?

Políticos têm carreiras, cineastas têm paixões. É a dúvida que move um diretor, a vontade de dividir os dilemas que ele carrega sozinho. E sempre haverá uma história a ser contada. Tenho 80 anos e não consigo imaginar minha vida sem fazer filmes.

Costa-Gavras fotografado em hotel de Paris, no lançamento de seu filme mais recente, "O Capital"



RAIO-X
COSTA-GAVRAS

VIDA
Nasceu na península do Peloponeso, sul da Grécia, em 12 de fevereiro de 1933. Mudou-se para Paris em 1954, para estudar literatura na Sorbonne, curso que mais tarde trocou pelo de cinema. É casado e pai dos cineastas Julie e Romain Gavras. É naturalizado francês

CARREIRA
Dirigiu seu primeiro filme, o curta-metragem "Les Rates", em 1958. Presidiu a Cinemateca Francesa na década de 1980 e é presidente de honra da instituição desde 2007. Seus filmes tocam em temas de cunho histórico e social

PRÊMIOS
Ganhou o Oscar de melhor filme estrangeiro pelo longa "Z" (1969) e o de melhor roteiro adaptado por "Desaparecido - Um Grande Mistério" (1982), além da Palma de Ouro em Cannes. No mesmo festival, levou o prêmio de melhor diretor por "Sessão Especial de Justiça" (1975). Ganhou o Urso de Ouro do Festival de Berlim por "Muito Mais que um Crime" (1989)


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