quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Texto de Gramsci sobre o Controle Operário



Por Gramsci
Direitos de reprodução: Editora Civilização Brasileira.

Antes de examinar em seu conteúdo e em suas possibilidades o projeto de lei enviado à Câmara dos Deputados por Giolitti, é preciso esclarecer o ponto de vista adotado pelos comunistas para a discussão do problema[1].

Para os comunistas, pôr o problema do controle significa pôr o maior problema do atual período histórico, significa pôr o problema do poder operário sobre os meios de produção e, por conseguinte, o problema da conquista do Estado.

Deste ponto de vista, a apresentação de um projeto de lei, sua aprovação e sua execução no âmbito do Estado burguês são eventos de importância secundária: o poder operário tem e só pode ter sua razão de ser (e de se impor no interior da classe operária) na capacidade política da classe operária, na potência real que a classe operária possui como fator indispensável e ineliminável da produção e como organização de força política.

Toda lei sobre isso que emane do poder burguês tem um único significado e um único valor: significa que realmente, e não só verbalmente, o terreno da luta de classes mudou, na medida em que a burguesia é obrigada, neste novo terreno, a fazer concessões e a criar novos institutos jurídicos; e tem o valor demonstrativo real de uma debilidade orgânica de classe dominante.

Admitir que o poder de iniciativa possa sofrer limitações, que a autocracia industrial possa se tornar"democracia", ainda que formal, significa admitir que a burguesia está agora efetivamente alijada de sua posição histórica de classe dominante, que a burguesia é efetivamente incapaz de garantir às massas populares as condições de existência e de desenvolvimento.

Para se livrar de pelo menos uma parcela de suas responsabilidades, para criar um álibi para si mesma, a burguesia se deixa"controlar", finge deixar-se tutelar.

Certamente seria muito útil, para os objetivos da conservação burguesa, que um avalista como o proletariado assumisse diante das grandes massas populares a tarefa de testemunhar que ninguém deve ser culpabilizado pela atual ruína da economia burguesa, mas que é dever de todos sofrer pacientemente, trabalhar com tenacidade, esperando que as atuais fraturas sejam soldadas e que um novo edifício seja construído sobre as atuais ruínas.

O terreno do controle, portanto, aparece como o terreno no qual burguesia e proletariado lutam para conquistar para conquista a posição de classe dirigente das grandes classes populares.

O terreno do controle, portanto, aparece como o fundamento sobre o qual a classe operária - tendo conquistado a confiança e o consentimento das grandes massas populares - constrói o seu Estado, organiza as instituições do seu governo, chamado para integrá-lo todas as classes oprimidas e exploradas, e inicia o trabalho positivo de organização do novo sistema econômico e social.

Através da luta pelo controle - luta que não se trava no Parlamento, mas que é luta revolucionária de massas e atividade de propaganda e de organização do partido histórico da classe operária, o Partido Comunista -, a classe operária deve adquirir, nos planos espiritual e organizativo, consciência de sua autonomia e de sua personalidade histórica.

É por isso que a primeira fase da luta se apresentará como luta por uma determinada forma de organização.

Esta forma de organização só pode ser o conselho de fábrica, bem como a organização nacionalmente centralizada do conselho de fábrica.

Esta luta deve ter como resultado a constituição de um conselho nacional da classe operária, que será eleito - em todos só seus níveis, do conselho de fábrica ao conselho urbano e ao conselho nacional - mediante sistemas e procedimentos estabelecidos pela própria classe operária, e não pelo parlamento nacional, não pelo poder burguês.

Esta luta deve ser encaminhada no sentido de demonstrar às grandes massas da população que todos os problemas existenciais do atual período histórico, os problemas do pão, do teto, da luz, do vestuário, só podem ser resolvidos quando todo o poder econômico - e , portanto, todo o poder político - tiver sido transferido  para a classe operária.

Ou seja: esta luta deve ser encaminhada no sentido de organizar em torno da classe operária todas as forças populares em revolta contra o regime capitalista, com o objetivo de fazer com que a classe operária se torne efetivamente classe dirigente e guie todas as forças produtivas a se emanciparem através da realização do programa comunista.

Esta luta deve servir para pôr a classe operária em condições de escolher, em seu próprio seio, os elementos mais capazes e enérgicos, para fazer deles seus novos dirigentes industriais, seus novos guias no trabalho de reconstrução econômica.

Deste ponto de vista, o projeto de lei apresentado por Giolitti à Câmara dos Deputados representa apenas um instrumento de agitação e propaganda.

É assim que ele deve ser examinado pelos comunistas, para os quais tal projeto - além de não ser um ponto de chegada.
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[1] - quando da ocupação das fábricas em setembro de 1920, os dirigentes da Confederação Geral do Trabalho(CGL), a maior central sindical da época, ligada à ala reformista do PSI, propuseram que o objetivo do  movimento fosse o controle operário nas fábricas. 

Considerando que tal proposta não modificaria substancialmente as relações entre os sindicatos e os capitalistas e podia fazer cessar a ocupação das fábricas, Giliotti - então chefe de governo - apresentou-a à Câmara dos Deputados como projeto de lei. 
Na verdade, a proposta do controle operário restou letra morta e jamais se converteu em lei.



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