Foto: Lançamento do livro de Anita Prestes em Florianópolis, Dezembro de 2012 |
Foi mais de um ano de debate e reflexão baseados em análises feitas pela historiadora e diversos documentos históricos do PCB e textos complementares.
Durante o ano de 2012 até os dias 25, 26 e 27 de Janeiro de 2013 foi estudada a trajetória dos comunistas brasileiros de 1922 à 1990 em três módulos distintos: I - “Da fundação do PCB (1922) aos levantes antifascistas de novembro de 1935” (ver http://www.cclcp.org/index.php/inicio-cclcp/organizacao/10-eflcp-realiza-1-modulo-do-curso-os-comunistas-brasileiros-1922-1990); II - “Da derrota do movimento antifascista (novembro de 1935) à crise de 1956/58” (ver http://www.cclcp.org/index.php/inicio-cclcp/organizacao/132-eflcp-realiza-2-modulo-do-curso-os-comunistas-brasileiros-1922-1990); e III - “Luiz Carlos Prestes e os comunistas brasileiros (1958-1990)”. Foi mais de um ano de estudos que mobilizou a militância da Corrente Comunista Luiz Carlos Prestes, Juventude Comunista Avançando, Movimento Avançando Sindical e amigos dessas organizações.
O III e último Módulo, realizado recentemente, teve como leitura prévia o livro de Anita Leocádia PrestesLuiz Carlos Prestes: o combate por um partido revolucionário (1958-1990), lançado ao final de 2012. Para discussão foram preparados vários documentos do PCB e textos de Prestes, alguns pouco conhecidos.
Partiu-se de 1958 não por acaso, foi o marco escolhido devido à grande importância da Declaração de Março de 58. Esse foi um documento contraditório, aprovado no intuito de conciliar distintas tendências que estavam se formando dentro do partido, na busca pela unidade dos comunistas brasileiros e da própria sobrevivência do PCB, gravemente abalado pelos acontecimentos do XX Congresso do PC da União Soviética, realizado em 1956. Para Anita,
“o esforço para alcançar a unidade a qualquer preço marcou fortemente a história do movimento comunista internacional e não poderia, portanto, deixar de se fazer presente no PCB (...). Tal empenho, frequentemente, teria como consequência o abandono de posições de principio e, em particular, a renúncia aos objetivos revolucionários dos comunistas e a conciliação com as tendências reformistas” (PRESTES, A.L., 2012, p. 25).
Na Declaração, reforça-se a tese nacional-libertadora para a revolução brasileira, ou seja, mantém-se intacta a orientação estratégica anterior, que era equivocada em apostar na revolução em duas etapas onde a contradição principal estava na relação entre a nação e o imperialismo e só secundariamente entre proletariado e burguesia. Segundo essa orientação, seria necessário formar ampla frente única com a burguesia nacional supostamente interessada no caminho do desenvolvimento independente do país. Além disso, anunciava-se uma nova virada tática: o caminho pacífico e eleitoral para formar um “governo nacionalista e democrático”.
Os anos que seguem a Declaração são de significativo ascenso das lutas no país. As greves se intensificam. O movimento sindical, popular e estudantil realiza diversas atividades nacionais. Os comunistas participam dessas mobilizações e denunciam a conciliação de JK. Para a sucessão presidencial, defendem a candidatura do Marechal Lott contra a de Jânio Quadros, a qual classificavam como “entreguista”.
JQ vence as eleições, tendo como vice João Goulart (naquele tempo presidente e vice eram votados em chapas separadas), que assume a presidência pela intensa pressão popular realizada após a renúncia de JQ, o qual pretendia criar as condições para um golpe de estado.
Nos anos que seguiriam até o golpe a orientação principal do PCB era de luta contra a política de conciliação de Jango e pela realização das reformas de base. No entanto, para a historiadora, “o PCB continuava a não perceber a necessidade imperiosa do bloco histórico”, pois para que as reformas e mudanças almejadas fossem conquistadas era necessário “a sustentação material de forças organizadas e unidas em torno de propostas claras e bem definidas” (ibidem, p. 64) e não apenas em torno de “apelos radicais”.
A influência da Revolução Cubana era muito grande, e contribui para o crescimento do radicalismo de esquerda com apelo à luta armada, tanto dentro do PCB quando em organizações que passam a surgir (muitas de militantes oriundos do Partido). Essa será a marca de diversas organizações.
Com o crescimento das campanhas pelas reformas de base, crescem também as conspirações orquestradas pelo imperialismo norte-americano e as classes dominantes nacionais que tiveram como desfecho o golpe de 1° de Abril de 1964. Segundo Anita,
“As concepções nacional-libertadoras, presentes tanto na estratégia política do PCB quanto em grande parte do discurso das forças nacionalistas e de esquerda, sob a influência dominante da ideologia nacional-desenvolvimentista, alimentaram as ilusões num hipotético anti-imperialismo de uma suposta burguesia nacional” (ibidem, p. 101).
Essa mesma ilusão levou à excessiva confiança nas forças armadas e no “dispositivo militar” de Jango, bem como na pouca atenção dada a construção do bloco histórico capaz de impedir o golpe reacionário das forças internas e externas e realizar as reformas de base. Mesmo aqueles que recorreram à luta armada no período – muitos heroicos lutadores do povo brasileiro – não foram capazes de se desvencilhar de uma avaliação errônea da realidade brasileira. Apontando uma estratégia equivocada para a revolução brasileira, também os métodos de trabalho político acabaram equivocados:
“As esquerdas haviam subestimado tanto a necessidade de elaboração programática quanto o trabalho de organização e de conscientização das forças populares para levar adiante o processo revolucionário no país.” (ibidem, 2012, p. 104).
Com a derrota das forças nacionalistas e populares de Abril de 64, as divergências na esquerda brasileira e na direção do PCB se acirram, o que leva ao rompimento e à expulsão de vários destacados dirigentes do partido, muitos dos quais partiram para a organização da luta armada no país. O PCB, por sua vez, aponta a necessidade da luta de massas e unidade das forças antiditatoriais para derrotar a ditadura.
Mas o aparato repressivo da ditadura se profissionalizaria e passaria a desmantelar uma a uma as organizações armadas, especialmente após 68, com o AI-5, passando em seguida à perseguição aos militantes do PCB como principal alvo.
Diante a crescente repressão o PCB avança na caracterização do regime como fascista e decide pelo exílio de grande parte do Comitê Central (CC). Nas palavras de Schafik Handal, Secretário geral do PC de El Salvador da época, citado por Anita no seu livro, “o fascismo é acima de tudo uma contrarrevolução” e possui uma função histórica na America Latina que “consiste em salvar o capitalismo dependente, modernizando-o, promovendo-o a passar à fase do capitalismo monopolista dependente e, onde existam condições para isso, ao capitalismo monopolista de Estado dependente” (HANDAL, apud PRESTES, A.L. p. 162 e 163).
Mas a resistência do PCB à ditadura não impede que o partido tenha posições cada vez mais moderadas. Segunda Anita
“Na prática, a atividade do PCB ficaria limitada à tática, sendo deixados de lado os objetivos estratégicos do Partido. Com semelhante orientação, a organização e a conscientização dos trabalhadores, assim como a sua formação com vistas à revolução, foram abandonadas. O PCB deixava de se distinguir das demais forças antiditatoriais, perdia a oportunidade de afirmar-se como organização revolucionária, mantendo a independência ideológica. O PCB enveredava definitivamente pelo caminho do reformismo.” (PRESTES, A.L., p. 153).
Já no exílio, Prestes passa a conhecer melhor a situação do CC do PCB e percebia que uma orientação oportunista de direita ganhava força dentro do Partido. No entanto, seu isolamento era uma realidade, era muito difícil ter notícias do partido a partir de sua direção que residia no Brasil. Mesmo assim, Prestes se mantém atualizado sobre a situação política do país, desenvolve intensa atividade de solidariedade internacionalista e busca atualizar seu estudo do marxismo-leninismo e do que havia de mais atual sobre a realidade brasileira.
Nesse processo, amadurece suas análises sobre a orientação política do Partido que estava errada, o que havia resultado em uma concepção de organização igualmente inadequada. Dedica anos a uma disputa interna com uma direção que não se mostrava disposta a debater seriamente a realidade brasileira e a crise do PCB. Já em 1979, com a anistia prevista, Prestes considera importante debater com a militância do partido antes de se afastar da sua direção. Vale ressaltar, que enquanto esteve no Partido, mesmo assediado pela imprensa burguesa, Prestes evitava abordar a luta interna do PCB.
A crise do PCB e o conflito de Prestes com o CC adquirira grande publicidade. Era chegado o momento de expor os seus posicionamentos de modo claro para todos os comunistas. Prestes decide, então, pela divulgação da Carta aos Comunistas aos membros do Partido, que logo adquire grande repercussão e publicidade. Para Prestes, que sempre havia sido muito disciplinado com o Partido, não havia como expor suas posições se não rompesse com o Partido e sua direção. O momento político exigia que suas posições fossem colocadas às claras e elas eram incompatíveis com as do CC do PCB (ver ibidem, p. 248 e 249).
A orientação do PCB estava superada. Para Prestes, trata-se de criar as condições para construção de um bloco de forças sociais revolucionárias de caráter anti-imperialista, antimonopolista e antilatifundiário, dando solidez na aliança do proletariado com as camadas populares rumo à tomada do poder político. Esse poder, pelo seu caráter, seria capaz de abrir caminho para o socialismo. Desse modo, a análise de Prestes convergia no sentido de que a revolução democrática era parte integrante da revolução socialista.
As posições de Prestes levaram muitos a romper com o PCB, muitos deles jovens, que passaram a se intitular os “comunistas que se alinham às posições revolucionárias de Luiz Carlos Prestes”. A Voz Operária, antigo órgão do PCB – substituído naqueles anos pela Voz da Unidade – seria o órgão que durante os primeiros anos da década de 80 daria alguma orientação para esse grupo, que teve dificuldade de manter uma organicidade mais efetiva.
Prestes defendia que era necessário batalhar pela construção de um Partido de novo tipo, efetivamente revolucionário. No entanto, naqueles anos, desaconselhou atitudes eufóricas nesse sentido. Para ele, era necessário se inserir no movimento de massa, formular política revolucionária para os diversos campos de atuação, organizar os comunistas em núcleos de base, estudar o marxismo-leninismo, criando as condições para a formação de quadros políticos capazes de se tornarem dirigentes desse novo partido no futuro. Tratava-se de um trabalho de longo prazo.
Foi o que Prestes fez nos últimos dez anos de vida: se dedicou a levar suas posições a operários, estudantes e movimentos populares, intervindo na política nacional de forma decidida.
A riqueza que a história dos comunistas brasileiros trouxe a tona neste curso com a camarada Anita Prestes fortalece a convicção da luta por outra sociedade possível e viável. A CCLCP se vê como parte dessa história e identifica como fundamental compreender os erros do passado para construir um partido verdadeiramente revolucionário.
A Escola Luiz Carlos Prestes seguirá organizando cursos sobre assuntos candentes e de interesse das forças revolucionárias e populares em nosso país.
Viva os comunistas brasileiros!
FONTE: CCLCP
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